Lie

Categorias:Romance
Wyrm

Lie


O seu coração era novo, mas o seu espírito e memórias antigos. A sensação a encontrou como um baque vindo de anos atrás. Hawky apertou os punhos e saiu da casa que Judith ocupava no vilarejo em tempo de ver Henry Chang passando. Tsuru. Não era somente os seus irmãos que estavam cheios de dúvidas, ela também alimentava uma porção delas. Kraz se aproximou às suas costas, de braços cruzados e um olhar hostil.

Envolver-se com uma vida humana ainda era um desafio para Hawky. A Dragonesa de Ar não tinha a fase tão conhecida quanto as de alguns dos seus irmãos e andar no vilarejo não era um problema para ela. As pessoas não tinham medo de falar consigo e o vilarejo era uma experiência útil para a sua vida. Amizades, inimizades, romances, intrigas, fofocas… Hawky ouvia de tudo e não se metia em nada. Havia descoberto que a imparcialidade era uma vantagem quando queria conhecer alguém. Ela apenas ouvia, tecia opiniões neutras e assim sobrevivia como uma simples cidadã. Afinal, ela queria ficar perto de Judith. Isso sim era importante.

A proximidade de Judith trazia um calor confortável ao seu coração e ela estava sempre ansiosa para conversar com a Garou quando podiam. Nyra também era uma ótima amiga! Fazer amizades era bem fácil para alguém que tanto ouvia pelo ar e tinha uma ideia do que uma pessoa gostaria de ouvir. Às vezes, um pouco solitário também.

Quando retornou da casa Mia, disposta a reproduzir a receita de um peixe que provara, estranhou ao encontrar a casa quase vazia. Somente Louis estava na sala, talhando velas brancas para algum ritual, possivelmente. Ele sorriu ao ver a Dragonesa. Sorriu, mas Hawky sabia que ninguém andava muito confortável com a sua presença e Louis sabia exatamente o que ela era.

– Judy saiu, é? – Hawky perguntou a ele.

– Saiu… Mas não demora, eu acho. – O Garou respondeu.

– Obrigada. – Hawky seguiu para a cozinha, retirando o peixe que havia caçado da sacola e começando o processo de limpá-lo. Bem, ninguém é obrigado a gostar de ninguém. Ela deu os ombros.

Quando retornou, passou o final da tarde tentando falar com Athos, mas o número apenas caia na caixa postal e ele não visualizava as mensagens. Deve ter saído e deixado o celular em casa. Ainda procurou outros locais da ilha onde o sinal pegava mais forte, mas nada. Então decidiu usar o lenço que guardava do filho, e tentou o localizar através de um efeito pré-preparado da sua esfera e confirmou… Tinha razão, saído com Gregory para o centro de Moscou. Ok. Deveria estar tudo bem – suspirou em alívio.

Retornou a casa onde tinha seu quarto, sorridente pois sentia o cheiro da comida de Hawky e lembrou-se que estava faminta.

–  Louis. – Judith acenou com um sorriso gentil a ele, e andou até a Dragonesa para a cozinha. – Hawkie. – Aproximou-se dela para a abraçar e apertar, cansada. – Eu nunca conseguiria fazer dieta com você por perto. Acho que você faz o vento ir até meu nariz com o cheirinho desse peixe. – Soltou-a e se abaixou diante do forno. – Acabou de colocar? O que é dessa vez? – Ergueu o rosto até ela, e continuava a fala: – Acho que seria interessante levar um pouco para o Nathan e Annik, isso anima qualquer um… Você precisava ver como eles estavam tensos… Ah! Eu não te avisei. Eu fui vê-los no hospital por causa do Anthony.

A Dragonesa riu com doçura. – Se ficar bom. Mia me ensinou e fazer esse peixe assado, mas eu costumo errar tudo das primeiras vezes… Apesar que… Esse está bem cheiroso. – Ela se curvou, observando o peixe dentro do forno e ergueu-se, encarando Judith com um olhar mais sentimental. – Polaris me disse que Anthony não estava bem… – Ela lamentou, apoiando-se na pia. – Se eu fosse mãe, eu acho que também seria bem preocupada. Esse mundo é muito hostil, ainda mais com esse cheiro de problema pelo ar. O dia não foi bom. Eles ficaram felizes com a sua visita?

Judith se ergueu, mas continuou de frente para o fogão. Ela assentiu rapidamente sobre o resultado da visita…

– Eu acho que consegui o que queria, que era pelo menos distraí-los. Mas é muito difícil mesmo tirar a preocupação de pais… – Sorriu sem graça – Eu estou preocupada com Athos. Annik teve a sensação que era melhor tirá-lo de lá urgente… – Mordeu o lábio – E agora eu ligo para ele e nada. Ele está na cidade… Mas o que está acontecendo? Deus sabe! Deixei-os mais calmos e sai nervosa.

– Oh… – A Dragonesa se virou de costas para o fogão e agarrou os dedos morenos na pedra da pia, parecendo refletir, distraída, desligando-se brevemente do ambiente antes de despertar. – É bom levar em consideração o que Annik diz. Ela não costuma errar… Infelizmente. – Hawky se balançou para frente e para trás. – Rhistel está nos perguntando da Princesa Audrey… Seria coincidência demais ela ter ido para a Rússia? Rhistel acha que ela foi… – Ela voltou os olhos para o teto.

– Audrey? – Judith perguntou em um sobressalto. Seus olhos se distraíram pelo chão, e a resposta pedida caiu do céu. Quando seu celular vibrou, era a ligação do filho. A Garou atendeu rapidamente a videochamada.

– Mãe! – Ele sussurrou. Estava no escuro, provavelmente embaixo das cobertas e no seu pijama. – Eu deveria estar dormindo. Mas eu vi que me ligou, aí eu pensei, “será que é urgente?”

– Tudo bem com você, filho? É urgente sim… – Ela sorriu aliviada e carinhosa.

– Quem está com você? – Ele estreitou os olhos.

– É a Hawkie. – Judith virou o celular para pegá-la melhor na câmera. Ele abriu um enorme sorriso para a Dragonesa e acenou com a ponta dos dedos.

– Ops. Espera!

Começou uma mistura de barulhos e uma escuridão total. Podia-se ouvir a porta se abrindo, e a voz do pai:
– Vai dormir, Athos. Amanhã é um grande dia.

Athos fingiu um ronco, pouco convincente, mas a porta voltou a ser fechada mesmo assim depois do aviso. O garoto logo voltou a primeira posição e sorriu para a câmera:

– Pode falar, mãe.

– Ok. Eu queria saber se está tudo bem… E quais as novidades, meu amorzinho? – Judith o olhava atenta, tentando se convencer de que não precisava de alarde.

Mas a porta do quarto abriu de novo, e a bronca aconteceu:

– Eu te disse para ir dormir.

– Eu te ligo daqui a pouco, mãe! – A ligação caiu quando Athos escondeu o celular.

Judith respirou fundo e fechou os olhos.

– Eu acho que eles não podem saber que Athos está se comunicando comigo… Melhor não. – Fitou Hawky, aflita – Seria ruim. Você tem razão… Muita coincidência. É melhor eu falar com os Versos… Mas não sei se tenho permissão para pisar do outro lado.

Estranho. Hawky ainda sorria por ter visto Athos, mas os seus pensamentos eram nada felizes. A Dronesa se lembrava dos comentários de Nina em relação aos russos e só conseguia pensar em loucuras. Eram Garou de pensamentos bem esquisitos e pareciam sempre entediados o suficiente para pensar em besteiras para fazer…

– Bem, você não pode… – Hawky começou, entrelaçando os dedos das mãos. – Mas isso é uma emergência. Eu te levo.




Quando Rhistel lhe perguntou se sabia de Audrey, Jullian nem chegou a considerar um problema – embora devesse? Lembrava-se da moça doidinha e festeira. No mínimo, encontrara alguma balada para ir. Sem se atentar, distraiu-se com o relato de Nathan sobre Anthony. O bebê dormia no castelo e estava sensível demais para ficar na companhia deles, infelizmente, mas Thom, Stevie e Flora estavam fazendo esculturas de lego com o Lendário, Annik e Remi enquanto os demais assistiam sentados no sofá, confortáveis em suas vestes leves de dormir.

– Ele vai tomar o remédio por cinco dias e depois veremos como reagirá… – O Galliard comentava, desanimado. – O doutor disse que talvez ele tenha que fazer um tratamento…

Ele estava vestido com um short folgado de cor cinza escura somente, deitado com a cabeça no colo de Nyra, observando os olhos de tempestades.

– Só passei estresse hoje. – Ele reclamou. – Depois dessa premunição da Annie então…

– Ah… Nem fale… – Annik murmurou tristemente. A Ragabash estava trajando um baby-doll azul claro com nuvens brancas. – Até agora estou com dor de cabeça com isso…

– Premunição? – Remi ergueu os olhos para os dois. O italiano estava deitado de costas no tapete macio com as mãos sobre o peito nu. – Aconteceu alguma coisa?

– Sempre que a tia Annik tem uma premunição, acontece. – Thomás comentou.

Jullian franziu o cenho, olhando de Annik para Nathan.

A Theurge estava muito distante, pensando em todas as situações insanas do dia. A história de Elara havia revirado sua mente naquela tarde, e ainda estava preocupada com Anthony. Os olhos prestavam atenção nos imensos do Galliard, e tentava reunir o que poderia ter ocorrido:

– Ah! Eu esqueci de avisá-los… – Falou, erguendo os olhos a Remi – Annik enxergou que algo estava errado… Que algo estaria para acontecer da Rússia. Mas… Sinceramente, eles estão tão distantes… Mas eu sei que o silêncio é preocupante… – Nyra fez uma breve careta ao sentir um a agonia repentina, embora breve como uma pontada. – Eu não sei de onde eles poderiam aprontar conosco agora. Além do mais, temos seguidos as orientações da Rainha sobre as alianças e tudo mais. Ou quase.

Os olhos de Jullian se estreitaram e ele levou a mão a testa, massageando-a. Ah, não

– Sim. Foi muito forte… – Annik arregalou os seus grandes olhos e segurou na manga da camiseta branca do Lendário e agitou. – Você acha que pode ser alguma coisa? Judith estava conosco e também ficou muito preocupada…

– Judith? – Remi perguntou. – A loirinha?

– Sim! Ela foi tão gentil! Apareceu para nos fazer companhia… – Annik abriu um sorriso breve. – Conversamos bastante. Um amorzinho…

Os olhos de Nathan se distanciaram brevemente para o hospital e o sorriso gracioso de Judith. Realmente, não era comum tanta sensibilidade assim de alguém que enxergava que algumas simples palavras poderiam mudar o dia de uma pessoa. Ele franziu o cenho, dispersando a memória:

– Vocês acham que seria possível eles nos ferrarem depois de tudo que fizemos? – Nathan lamuriou. – Seria muita canalhice, porra.

– Cazzo, amore mio! Eles são russos!. – Remi respondeu. – Voces sentem alguma firmeza na amizade de Alana? Estava até doce demais para ser verdade. Aquela cara de frígida não me engana.

NYRA, A AUDREY SUMIU!”, Ladirus gritou na mente da Theurge, “EU NÃO A ENCONTRO EM NENHUM LUGAR!”.

O grito veio inesperado e Nyra teve um sobressalto em reação, por pouco não tirando Nathan de seu colo.

“Ladirus.” A mente rápida da Theurge juntou os pontos como um jogo infantil. “Ele está na Rússia. Só pode. Ártemis está com você, né?”.

“Está… Foi só a Audrey que sumiu”, o Dragão respondeu confuso com a pergunta.

– Ela é legal! – Flora disse, destruindo a própria torre de lego – Faz truques igual a tia Blair.

Nyra mal pode erguer o olhar para dizer algo, e surpreendeu-se com a imagem de Judith do outro lado do vidro da sala. Ela pressionava os lábios e batia na porta delicadamente, recuando o olhar com receio de ser indelicada naquele momento descontraído. Ao menos, as crianças estavam na sala. “Desculpem”, ela silabou, entrando muito devagar.

A atenção de Steven foi rápida em detectar Judith e mais ágil ainda em se desviar dela, desconfortável. Ele se levantou e seguiu para a cozinha com passos apressados:

– Vou pegar bolo… – Anunciou, esquivo.

Thomás o acompanhou com o olhar, erguendo-se igualmente.

– Vem, Flora… Vamos pegar uns doces, bolo, sei lá… – Ele chamou, estendendo a mão para a pequena.

Enquanto isso, Remi se levantava de qualquer jeito, sentando-se no sofá. O loiro acompanhou a moça com o cenho franzido. Assuntos se encontrando, visitas inesperadas. Nada que ele farejasse qualquer possibilidade de ser uma notícia positiva.

Neutro, Jullian acompanhou a entrada moça e indicou com a mão para que ficasse à vontade para se sentar. Ele acabou agachando novamente ao ver que Annik recolhia os brinquedos lego e prontamente se pôs a ajudá-la.

– Oi… – Nathan piscou os olhos confusos ao se sentar, largando os braços sobre joelhos.

Judith parecia muito sem graça de interrompê-los, visto que ainda não havia entrado na belíssima mansão. Embora recebesse o convite para se sentar, ela o fez, e logo se ergueu, agitada demais. Seus olhos passavam por eles, e ela quase esqueceu de como iniciar a conversa.

– Me desculpem muito por isso… – Tocou o próprio lábio com a ponta dos dedos – É que eu acho que a Annik estava certa. Está acontecendo algo lá, e é uma festa de casamento. É loucura se eu considerar a princesa Audrey? Porque eu a vi ontem mesmo… – Riu sem jeito, um riso aflito – E eu soube por Hawky que ela desapareceu. Eu estava falando com meu filho pelo celular… Mas ele não conseguiu terminar de falar… Ele está no Palácio. Pelo jeito que ele estava… Eu não sei… Agora estou morrendo de medo.

Nyra acompanhou a fala dela, agitada e perdendo alguns passos da linha de raciocínio.

– Eu nem sabia que você tinha um filho… – Nyra divagou, quase distraída demais. – Ele tem quantos anos? Por que está lá?

– Porque ele mora com o pai Aparentado. Eu… – Suas mãos se entrelaçavam – Expliquei que ele ainda era muito novo para viajar comigo. Mas hoje ele tem nove anos… Eu pretendia pedir para trazê-lo… Gaia… – Fechou os olhos brevemente – Se algo acontecer com ele eu nunca vou me perdoar.

– Calma-se… Eles são idiotas, mas eu acho que não fariam nada contra crianças… – Remi disse, olhando-a.

– Ok… – Nyra inspirou nervosa – Levaram nossa Aparentada mesmo então? Ainda estou processando…

– Audrey fugindo para se casar seria uma grande novidade. – Nathan se endireitou, encostando as costas no sofá. – Seria… Bem inesperado. – O Galliard fitava o teto com um olhar parado. – Bem, os Presas de Prata adoram se casar, mas… A Audrey…

– Ela pode ter fugido apenas para ir a uma festa de casamento, não sei? Ártemis voltou para a ilha… – Annik arriscou, erguendo-se ao terminar de recolher as peças com Jullian. – Eu não sei se a minha premunição se referia a algo tão doce quanto um casamento… Eu acho que não.

– Normalmente, você consegue falar com o seu pequeno sem problemas? – Remi perguntou, tentando entender o alarde, pois não parecia realmente um.

Enquanto os olhava, Jullian procurou o seu celular sobre a mesa, selecionou o telefone do Palácio do Lobo Branco e começou a ligar. A ligação tocou diversas vezes antes de cair. O Lendário arqueou as sobrancelhas:

– Pode ser apenas uma grande coincidência infeliz tudo isso. Eu vou enviar Floco-de-Neve até o palácio, perguntando se Audrey está lá e se aconteceu alguma coisa. Tudo bem? Fiquem calmos, por favor. – Ele deu um passo em direção à Penumbra.

Judith os escutava a concordava, aliviada pela disposição de enviaram o espírito. O celular continuava em suas mãos, esperando a ligação do filho.

– Eu consigo… Eu poderia ligar para o pai dele e pedir para deixar Athos terminar a ligação. Mas se algo estiver acontecendo é bom que não lembrem que Athos conversa sempre comigo pelo celular. Foi o que pensei… E se realmente levaram, Audrey?

– Sim… – Nyra abaixou o olhar brevemente – Mas Remi tem razão. Não fariam nada com ele, Judith. Ele é novo.

– Ah… Eu… Queria ter essa certeza. Nenhuma criança deixou de morrer porque é criança quando se está na Sociedade. – Concluiu, insegura. – Eu ficarei esperando… A ligação dele.
– Você pode nos deixar a par? – Nyra perguntou, vendo a tensão na Garou e se simpatizando… Também tinha seus filhos adotivos, estaria igualmente nervosa.

– Sim… Claro…

– Se quiser ficar até Jullian obter uma resposta… – Nathan se levantou e caminhou até a porta da casa, observando floresta afora, erguendo um braço e coçando as costas nuas. – Floco-de-Neve é rápido. – Ele comentou, pousando as mãos na cintura. – Se raptaram a Audrey, o que acho improvável, isso seria… – Ele olhou os demais por cima do ombro. – … Traição, mas… Não. A Rainha Alana é mãe da Audrey. Eu apostaria em uma visita surpresa.

Incerteza, Annik se entreolhou com Remi e Nyra. A cruzou estava com os braços fortemente cruzados e batia o pé no chão, ansiosa.

– Porque Audrey é filiada a nós. – Remi passou a mão pelo pescoço.

– É. E ela é importante. Alana não faria isso. Não é nenhuma vantagem para ela nos trair…

– A não ser que a recompensa fosse enorme. – Remi arriscou. – Não somos os aliados preferidos dela…

A Garou havia vivido muitos anos na Rússia para ter suspeitas de casamentos forçados.

– Bem… Audrey é filha da Alana, e não se casou. Tecnicamente Parentes não podem se afiliar a nada. Ao menos na Rússia… O Aparentado pertence à família, ou ao cônjuge. Alana pode se pautar no argumento que a filha é dela. – Judith riu desgostosa – Eles são apenas peças de tabuleiro. Princesa ou não.

– Mas ela ainda… Não é qualquer uma… – Nyra disse, escondendo em luta a agonia que sentia vinda de Ladirus. Judith negava: – Especialmente por isso não interessa o que ela pensa. Especialmente se Alana entrou em alguma negociação. – Judith dizia como se houvesse vivido a experiência ou tido muitas pessoas próximas – Vocês teriam muita dificuldade de alegar que é uma traição ainda. É útil saber de que família ele é… Se é que é essa a questão…

– Bem. Você está me convencendo que é, e eu estou ficando paranóica agora. – Nyra confessou, franzindo a testa e irritada – Seria bom dar uma espiada nas nossas outras Aparentadas importantes… Sua família não recebeu nenhuma proposta esses dias, Annie?

– Natalie sempre recebe convites, propostas e cartas, Nay… – Annik encolheu os ombros e os soltou, ainda refletindo com horror sobre o relato de Judith. Também não estava alheia àquelas práticas, infelizmente. Lembrava-se bem delas. – Eu não acho que é indício de alguma coisa. Ela os ignora, pois não está preparada…

Judith se sentou e observou Nathan.

– Eu acho que gostaria de ficar… Por um tempo, quem sabe Athos liga… Bem… Eu… Não quero atrapalhar nada também. Já atrapalhando… – Mordeu o canto do lábio.

– Judith. – O sorriso de Remi foi apertado, largo e forçado. – Indiferente de como a Rússia trata os seus Aparentados ou não, nós tratamos diferente aqui. Temos Aparentados em posições de valor e funcionamos perfeitamente assim. Graças a Gaia, nossa Seita está sendo muito bem-vista para receber Aparentados. – O Ahroun suspirou com Fúria. – E… Quem está aqui, está sujeito às nossas leis. Se a Rainha Alana quisesse “pegar como mercadoria” a sua filha, ela não pode simplesmente pegar… Porque nós não somos assim. Se eles são, não interessa para o Luar do Oceano. Ela teria que conversar conosco. Se ela o fez, é traição. Nós somos meros aliados da Rainha Alana. Não os seus servos.

– É, seria uma merda. – Nathan caminhou novamente até eles, aéreo e sem parar, dando passos pela sala. – Uma grande merda…

Como previsto, Jullian retornou a Tellurian rapidamente. O rosto do Lendário carecia de qualquer cor. Ele os olhou com os lábios entreabertos e ergueu um dedo em riste quando falou:

– Não permitiram Floco-de-Neve de entrar.

– O quê? – Nathan caminhou até o Philodox.

– Não permitiram. Simplesmente o barraram.

– Ai, Gaia… – Judith respirou devagar para manter a calma. – Isso é grave, não é? Bem incomum… No mínimo!

Nyra se ergueu também, estava sem palavras. Ela cruzou os braços e apertou os lábios, nervosa:

– Que ousadia. – Reclamou – Não somos mais aliados? Quem eles pensam que somos? Qual a justificativa?

– Nenhuma. – Jullian passou a mão pelo queixo, coçando-o levemente. – Não consigo enxergar nenhum motivo plausível para não ouvirem a minha mensagem. – Eu vou até a União Lupina pedir a Glavius que realize uma conexão com eles.

Annik abriu a fechou a boca antes de falar. – Eu vou com você. – Ela negou com cabeça.

– É melhor irmos. – Remi enfatizou.

Jullian os olhou e assentiu. – Chame o seu Dragão, minha estrela.

Nyra os olhou atentamente, e pareceu despertar algo em si ao se agitar.

– Mas a gente não vai assim. Não quero nenhuma intimidade e nem essa aparência de “pegos desprevenidos”. – Ela declarou e se apressou para o quarto enquanto avisava Ladirus. “Se apronte e vem para a casa de vidro, nós vamos a Reserva ver isso, Ladi… E toma cuidado para não preocupar a Ártemis.” – Rhistel não deveria ir também? – Nyra perguntou do topo da escada.

– Ah… Eu posso ir? – Judith fitou Nyra e se voltou a Jullian. – É importante para mim.

– Pode, claro. – Jullian respondeu, fitando Nyra. – Minha estrela, nós não vamos para o pa-

O Lendário mirou Remi de soslaio e o italiano apenas negava discretamente com a cabeça antes de se virar igualmente para subir junto de Annik.

– Nós só vamos até a reserva… Ladirus é bem querido por lá. Eu espero que eu não precise do meu Dragão… – Jullian respondeu. – Judith. Vamos nos trocar…

– Caralho. – Nathan rosnou, igualmente sumindo.




Assim que Rhistel sentiu a Fúria de Ladirus subir, o Dragão trocou de sofá e se aproximou do irmão, olhando-o em seus olhos pequenos. Ladirus suava, segurando os joelhos com as mãos firmemente agarradas. Quando falou, o Dragão de Gelo franziu o cenho ao enxergar as suas presas afiadas:

– Nyra está me chamando… – Ele disse, com a voz controlada pela tensão. – Vamos para a reserva… Eu não sei o porquê. – O Dragão de Água meneou a cabeça.

– Ladi… O que eles falaram? – Rhistel pousou a mão sobre o ombro dele. – Por que a reserva?

– Rhistel. Eu também quero saber. – Ele respondeu, ríspido.

– Jullian não me chamou?

– Não.

Rhistel arqueou as sobrancelhas, surpreso.

Ártemis estava ao lado, sentada sobre os pés e fitando o Dragão com preocupação. A Changeling não sabia o que pensar sobre a história, mas sua preocupação também crescia. Já se sentia muito culpada por ter desejado não ver Fayre quando retornasse para a casa azul. Blair voltou de outro cômodo depois das diversas ligações… Acenou em negação a Rhistel, e se aproximou de Ladirus.

– Ladi. Eu acho que eles vão confirmar se Audrey passou por lá, deve ser. E você era o Dragão de lá. – Disse, apoiando as mãos nos próprios joelhos para o observar – Se ela está na Membrana, ela está segura. Alana a ama muito. Eu morei lá… Eu via. – Tentou o acalmar minimamente. – Você deveria ir de qualquer jeito, Rhistel… – Olhou o namorado pensando que as notícias poderiam não ser nada boas. – Eu não sei…

– Eu não deveria ir? – Ártemis perguntou preocupada.

– Eu acho que não. – Blair a disse – Eles vão falar com Garou. Eu vou ficar com você, ok?

– Mas se Jullian não me chamou… – Rhistel respondeu, manhoso. O Garou costumava adorar dar patadas quando Rhistel parecia não adivinhar a sua mente. – … É melhor eu ficar. Nyra disse que vocês irão até a reserva apenas…?

– Ao que parece, sim… – Ladirus disse, visivelmente bem longe de estar próximo do seu equilíbrio. – Fiquem. Eu vou. Eu espero que só estejam querendo confirmar que está tudo bem. Eu fiz muito alarde… Nyra é muito preocupada comigo.

“Ou não…”, Rhistel disse a Blair sem olhar para a namorada.

– Tudo bem, Ladi. Eu vou contigo. Provavelmente, eu vou levar uma bronca, mas… Ahm… Vamos, vai. – O Dragão de Gelo deu os ombros.

Ladirus não assentiu e a rapidez com que o fez deixou Rhistel certo de que ele deveria estar ao lado do irmão com certeza. O Dragão de Água se aproximou de Ártemis e a beijou num selinho demorado, acariciando o seu rosto como se pudesse dizer com o gesto que estava tudo bem, mesmo que claramente não estivesse.

– Eu volto o mais rápido que puder… – Ladirus disse a namorada, beijando-a mais uma vez antes de se levantar.

Ártemis se ergueu com ele, mas ficando em pé sobre o sofá:

– Cariño… – Ele choramingou preocupada. – Volta logo mesmo. Não vai sumir, por favor. Eu vou ficar esperando.

– Eu não vou, gatinha… Nós só vamos até a reserva… – Ladirus buscou as mãos dela e as beijou uma de cada vez. – Não saia daqui. Fique com Blair…

“Vai conversando com ele… “ Blair disse a Rhistel, beijando-o em um selinho de despedida “Ladi só não pode surtar. Eu tenho certeza que essa história não é simples.”

“Espero que você esteja errado, Bee…”, Rhistel respondeu abraçando-a fortemente antes de se afastar, “Espero que eu esteja muito criativo nos meus palpites também…”.

– Eu vou continuar tentando falar com ela… Ok? – Blair disse a Ladi. – Aviso em qualquer progresso. E qualquer coisa vocês me avisem também… – Mordiscou o polegar – Qualquer coisa eu já começo a pensar em outras alternativas.

– Tudo bem, Bee… – Rhistel massageou a mão dela antes se deixá-la.

Eles voaram em suas formas originais até a Casa de Vidro, pousando próximos da mansão pela Penumbra. A Fúria dos moradores os recepcionou quando desceram em suas formas hominídeas antes que os donos delas Percorrerem Atalhos e mostrassem os seus semblantes sérios.

Rhistel sentiu Ladirus mais tenso ao seu lado ao ver Jullian surgindo todo de preto de novo e, como se não fosse o bastante para concluir um problema, carregando a sua Grã-Klaive às costas assim como Nathan o fazia com Chama-da-Fênix. O Galliard igualmente estava vestido de preto: camiseta justa e sem mangas, calças jeans e tênis. Missão? Rhistel franziu o cenho ao ver Annik surgir trajando uma babylook preta de mangas cumpridas, short jeans preto decorado com um cinto onde as suas duas Klaives estavam presas. Missão. Ele concluiu ao passo que Remi também surgiu vestido com o seu traje de kevlar.

De soslaio, Jullian pareceu avaliar a presença de Rhistel, mas a impressão foi breve. O Lendário assentiu uma única vez em concordância. No mínimo, havia notado que Ladirus só havia piorado ao vê-los daquela forma.

Nyra surgiu com um short jeans preto, e meias finas. A roupa tinha um cós alto, e combinava com a cropped vermelha vivo que usava. Nos braços, seus braceletes de couro e cetim carregados de Gnose e nos cabelos negros e soltos, a presilha Fetishe que Ladirus havia a presenteado quando se uniram. Os pés tinha coturnos femininos pesados. A maquiagem não destacava os lábios famosos de vermelho, e estavam carregadas nos olhos com uma sombra negra em cima e embaixo.

Sobressaindo muito diferente do grupo, Judith se deslocou em um vestido amarelo tubinho de algodão, combinando com botas beges curtas, mas pode se salvar com uma jaqueta de couro preta que tinha sempre pronta. A peça se tornava uma armadura de tiras de couro quando em Crinos. Sua arma, um Chakram, ficava pendurado na roupa quando mudava de forma.

– Ladi. Nós vamos pacificamente tentar entrar em contato com a Rússia através da Reserva. – Nyra explicou, o olhando nos olhos. – Vamos fazer parecer que seja formal. Eles não querem conversar conosco informalmente. – Ela disse, ajeitando o cabelo preto atrás da orelha e revelando uma chamativa pedra de diamante. Judith percebeu que as pequenas joias nos dedos da Garou, na verdade, tinham um valor inestimável, e era bem chamativas. – Judith vai conosco porque o filho dela está no Palácio, e ele vai voltar com a Audrey. Eu tenho certeza que ela está lá… Pelo menos, vamos saber o que está acontecendo. Entender. Porque está estranho mesmo.

Judith os olhava cada vez um pouco mais aflita, mas se distraiu ao ponderar na importância urgente que eles deram à Aparentada e a situação da própria Galliard. Aquilo era no mínimo inusitado.

“Bee… Eu acho que ferrou…”, Rhistel enviou a mensagem mental a Blair ao ouvir o relato de Nyra.

Pacificamente. Ladirus analisou Nyra de cima a baixo, lançando breves olhares para os demais Versos da Magia. Ladirus sentia o seu corpo inteiro vibrando com o estresse que estava sentindo. Ele entreabriu os lábios, mas acabou os fechando quando as respostas não lhe chegaram a mente. Ao ver Jullian vestindo os óculos aviadores e distribuindo-os e Rhistel tomando distância do grupo, o Dragão de Água teve certeza que não estavam falando apenas de formalidades. Ladirus assentiu e se afastou igualmente para assumir a sua forma original, rugindo ao fazê-lo.

Jullian voou em Rhistel com Annik e Remi e Ladirus foi conduzido por Nyra, levando em suas costas Nathan e Judith. O voo foi breve, mas a aproximação dos Dragões da área da reserva causou um forte rebuliço Furioso. Garou e Espíritos observavam paralisados as imensas formas reptilianas e a notícia se espalhava com uivos e gritos. Jullian guiou Rhistel para perto do Coração onde Gui, o Mokolé T-Rex, fazia a sua guarda. Gui, meneando a sua cauda em curiosidade, observou Rhistel pousando suavemente ao fechar asas. Ladirus pousou um pouco mais afastado e se aproximou de Gui para tocar a sua pata com um toque comicamente humano e retribuído pelo Tiranossauro com um grunhido que lembrou um riso antes de, abrindo a sua enorme boca, anunciar com um grave rugido a presença da Alcateia Real.

“Não mude de forma…”, Rhistel disse a Ladirus. Mesmo quando os Garou desceram de suas costas, os dois Dragões permaneceram em suas formas originais ao lado de Gui.

Não demorou para que fossem recepcionados. O lobo branco se aproximou, mas manteve uma distância respeitosa e prudente. Quando assumiu a forma hominídea, Jullian anuviou a expressão de seriedade em seu semblante.

– Seth. – O Lendário franziu o cenho.

– Sr. Blackwood. – Seth esboçou um sorrisinho sagaz aos lábios. – Nyra.

O silêncio entre eles era de preocupação. Nyra sentia cada parte de Ladirus como se fosse seu próprio corpo, e ele estava tenso em todos os seus músculos. Ela sentia os próprios ombros pesados… “Ladirus… Acalme-se. Ainda nem sabemos se ela está lá por vontade própria…” .

“Nay… Eu vou ficar tranquilo quando… Eu puder falar com ela e ter certeza que está tudo bem… Eu não confio na Rainha…”, Ladirus respondeu com um rosnado. “Entenda…”.

Nyra também se surpreendeu com a presença de Seth e sorriu para o Garou:

– Olá, Seth. Quanto tempo… – Ela se aproximou e deixou um beijo delicado e breve no rosto dele em cumprimento. Já haviam sido da mesma Alcateia, e até se lembrava de ter doado um pedaço da própria energia espiritual para salvar sua vida antes dele precisar ir ao Norte. Havia passado por muita coisa juntos. – Sinto muito a urgência. Mas… Precisamos falar com o Rei. E agora.

Judith os olhou na interação e se desviou para os outros membros, por fim, Gui. Nunca havia visto um Mokolé na sua vida, e aquilo definitivamente havia a impressionado. Será que eles tinham ao menos uma anatomia semelhante aos Dragões, embora não voassem? Oh, não deveria ser frustrante ser tão imenso e preso ao chão. A loira pareceu se distrair fácil, mas estava atenta até demais.

“Rhistel…” Blair disse um tempo depois, quando ainda sentiu a fina conexão que mantinham. “Se nada der certo. Eu posso ir até a Rússia como Aparentada e trazê-la. Talvez meu disfarce caia e descubram que sou Maga… Mas é melhor do que ferirem a Audrey… Se o caso for extremo como parece. Vocês podem tentar confirmar como anda a situação lá?”.

“Bee… Ninguém vai ferir a Audrey. Ela é… Muito preciosa para isso…”, ele falou com certa estranheza na voz. “Oh… Isso. Muito preciosa… Ahm. Eu acho que estamos falando desse tipo de problema…”

Pouco a pouco, olhares curiosos surgiam ao redor, embora não ousassem se aproximar demais. Proximidade do forte Coração do Caern os conectava a diversos pedaços da Seita, trazendo-lhes sensações e pensamentos. Remi se estreitou os olhos, sentindo a Fúria e a desconfiança.

– Quando precisam da gente, adoram nos ver voando por aí. – Nathan comentou num sussurro com o Andarilho.

… – Remi respondeu.

Jullian se voltou para Annik quando a lupina fechou os olhos e pareceu se concentrar, embora estivesse atento a conversa de Nyra e Seth.

– Verdade. Uma pena. Mal nos falamos na festa. – Seth respondeu a Nyra, sério e mantendo o sorriso selado. – Glavius está ocupado…

– Foda-se. – Nathan parou ao lado de Nyra. – É urgente. E o Nicholas?

– Ele não está… – Seth se voltou para o Galliard, perdendo o sorriso dos lábios.

– Dos Presas de Prata, apenas Glavius e Seth estão aqui… – Annik murmurou.

– Seth. – Jullian disse em a paciência de costume. – Chame Glavius, agora. – O Lendário moveu a sua forma espiritual, usando do Dom Maestria. – Corra. – Acrescentou.

Nyra apenas desviou o olhar de Seth. “Tentei ser legal pelos velhos tempos”, pensou, evitando a imagem da breve humilhação que foi vê-lo correr. A Garou se virou a Alcateia e percebeu o rosto surpreso de Judith, como se fosse a princesa andando pela primeira vez com os caras malvados.

– Se por acaso formos pegar a Ponte de Lua até a Rússia… – Judy disse após perceber que era observada por Nyra, ficando sem jeito. – E não nos deixarem entrar por qualquer razão… – Ela continuou mentalmente, em uma conexão com o grupo “… Talvez eu possa insistir para ficar lá dentro… Mesmo que me deixem sem comunicação… Já que fecharam tudo… Mas eu poderia observar de dentro e fazer algo com minha Mágika…”.

Nyra pensou um pouco, e negou “Acho que eles não te aceitariam…Você está muito tempo como Garou na nossa Seita. Talvez, Blair poderia, porque eles a querem. Mas é uma situação que eu não quero antecipar…”.

“Vocês estão mesmo pensando no pior…”, Rhistel rosnou com a sua voz gutural. “Mas agora… Se Nicholas não está aqui… Talvez esteja lá… Então, Blair poderia…”.

“Não me deixem nervoso…”, Ladirus rosnou em resposta.

“Não. Nós não estamos ainda pensando no pior. Não se precipitem. Tudo se resolverá com uma conversa com Audrey…”, Jullian disse, retomando alguma calma. Floco-de-Neve pousou em seu ombro e soltou um pio melancólico. O Lendário fitou a Coruja das Torres com uma expressão pensativa. Conhecem-na muito bem para não terem ciência de que era minha.

“Não quero desanimar ou irritar ninguém, mas eu acho que fodeu tudo”, Nathan disse enquanto observava Glavius se aproximando em sua forma lupina, “Eu estou sentindo cheiro de problemas…”.

O Galliard dividiu o sentimento com o Rei da União Lupina. A incompreensão que o semblante de Glavius demonstrava enquanto passeava os olhos por cada um dos presentes lavou a dúvida que Jullian tinha de que ele estava envolvido no incidente. Glavius pigarreou, franzindo o cenho. A atenção seguiu se agravando na confusão ao passar pelos Dragões em suas formas originais O Caern resplandecia energeticamente e tocava o corpo próximo de Rhistel, lançando raios de arco-íris no céu como gelo iluminado pela manhã.

Claramente pego de um momento de relaxamento, dado os restos de máscara facial que havia por seu pescoço e o robe preto que estava vestindo, Glavius não esperava por visitas.

– Boa noite. – Ele os cumprimentou. – Em que posso ajudá-los?

– Boa noite, Glavius. Precisamos de uma Ponte de Lua para a Membrana Prateada. – Jullian disse.

– Ah. – Glavius levou as mãos à cintura. – Por qual motivo, se posso saber? Porque… – Ele passou o olhar de Jullian para Nyra. – … Eu não acho que eles aceitarão a Ponte. Alertaram-me que aceitariam apenas até quatro horas atrás. Eles estão fechados para festividades…

– Festividades… – Nyra cruzou os braços e disse com mais calma, para si e pensando, havia aprendido a gostar de Glavius, especialmente mediante a outras Seitas que haviam lidado e seus líderes.

– Bem…– Judith sorria ligeiramente nervosa: – Saberia nos informar do que se tratam essas ‘festividades’? A Rússia costuma ser aberta em anunciá-las, mas dessa vez…

– E o mais importante… – Nyra o olhava – A princesa Audrey passou por aqui?

Quando a dúvida de Glavius se agravou em seu semblante, Jullian abaixou a cabeça e fitou os próprios tênis mergulhados na grama irregular. O Lendário umedeceu os lábios e virou-se por cima do ombro, observando os dois Dragões. Conformado com o problema, ele inspirou profundamente, levando a mão à cabeça e coçando-a.

– Vocês não foram convidados… – Glavius afirmou com estranheza e cautela na voz. – … Para o casamento.

– E você foi? – Remi perguntou, encarando-o.

– Fui… – Glavius respondeu com a Fúria a denunciar a sua tensão. – Mas eu gosto aprecio essas uniões por aliança… Ainda acredito no amor… – Ele mirou cada um dos Versos da Magia. – Amor fortalece… No fim.

– Que bonito. – Nathan disse e ergueu o olhar para o céu.

Tremendo o chão com um passo, Ladirus aproximou a cabeça do grupo. As suas presas imensas se desnudaram quando sua voz soou cheia de Furia:

 E a Audrey…?

Glavius encarou o Dragão, observando os seus olhos azuis e temendo dar uma resposta. Ele se desviou, observando cada um dos lobos presentes. Os Fetishes, as vestimentas e a hostilidade nos olhares…

– Eu não sei o que está acontecendo… Mas… – Glavius franziu o cenho e a sua voz quase sumiu totalmente enquanto falava. – A Princesa Audrey é a noiva.

“Ladi… “, Nyra disse a mente dele, pedindo cuidado. A nova informação comprovava o que suspeitavam, mas a calma dele em afirmar era algo não imaginável.

“Sirius…”, Rhistel o chamou, “Deve haver algum engano…”.

– Acho que é importante sabermos… Pelo menos… Quem é o rapaz? – Judith perguntou o olhando atenta, nervosa pois sentia a vibração da tensão de Ladirus às suas costas. – O noivo?

– E se Audrey disse algo. – Nyra perguntou menos paciente àquela altura. – Ela ao menos parecia que queria casar?

– Eu não acredito que Audrey fez isso… – Annik levou as mãos à boca.

– Parecia… Estava feliz. – Glavius respondeu, cauteloso. – O Príncipe Auric veio buscá-la e ela estava bem alegre… – O Rei olhava de Nyra para Judith. – O noivo é… – Ele fez uma pausa. – Keith “Sentinela-Incansável”. O Rei do Reino da Pérola…

– QUÊ?! – A voz de Jullian perdeu a afinação com a surpresa. – Tem certeza?

– Sim, Jullian…

Cazzo… Ele não é primo de vocês? – Remi olhou de Jullian, para Nyra e Nathan.

– É… – Nathan assentiu vagarosamente. – Inclusive, estávamos em vias de firmar uma aliança…

– Nem o primo de vocês nos chamou para o casamento?! – Annik perguntou, alarmada.

Desde que ouvira sobre a noiva, Ladirus não escutava mais nada. Havia recolhido o pescoço e sequer piscava enquanto a compreensão dos fatos fluía vagarosamente, duvidando da informação conforme a ficha caía. A sua mente se enchia de perguntas e suposições intercaladas por diversos por quês. O coração forte causava uma vibração Umbral intensa na Penumbra. Sentia os olhos de Rhistel, mas ele mesmo não se sentia apto a observar ninguém além de si mesmo.

– Nossa… – Judith disse com os olhos bem abertos. Havia tantos comentários estranhos em uma só sentença que não sabia mais o que pensar; que estratégia adotar. – Ninguém foi convidado… Isso é bem estranho… Audrey é uma Aparentada do Luar… Ou… Era…

– Bem. – Nyra estava igualmente em choque. – Nós precisamos ir até a porta do Palácio para conversar com algum representante. Não vou aceitar essa “desfeita” sem explicação. – Disse irritada. – Eu quero passar, Glavius.

Glavius não era um ignorante às leis do Luar do Oceano. A sua compreensão envolvia diretamente a gravidade que uma manobra como aquela poderia envolver de fato. A Princesa da Sociedade Garou fugindo para se casar bem longe da Seita que estava, teoricamente, filiada. Uma das poucas Seitas que aceitavam Aparentados se afiliando.

– Vocês passarem ou não, não depende de mim. Depende deles… Eu posso tentar…

– Por favor… Então, tente. – Jullian se aproximou um passo do outro Rei. – Isso não está certo, Glavius.

– Eu sei. Não está. Só ainda não sabemos de quem é a culpa. – Glavius os olhou com demora. – É melhor não irem todos. Annik, Judith e você, Nyra.

Glavius tem razão… – Rhistel disse.

– Venham comigo. Eu vou junto.

Após uma breve reflexão, Jullian assentiu para a Theurge.

Com pressa, ele caminhou em direção ao Coração enquanto retirava do pescoço um cordão decorado com uma pequenina Pedra da Lua como pingente. Glavius desenhou o símbolo do seu portão no ar e tentou abri-lo. Tentou cinco vezes, enviando o pedido ao Membrana Prateada, antes que o portão destrancasse com o consentimento do Vigia do Portão do outro lado.

– Annik. – Jullian fitou a Ragabash. – Fique atenta e deixe que Nyra conduza.

A Ragabash fitou Jullian e concordou rapidamente, expressando a sua preocupação. A Garou observou o semblante de Ladirus, distante em seus pensamento, e sentiu o coração se apertar com a visão. A tristeza se transformará em ódio. A confirmação viera como uma certeza dentro de sua cabeça…

“Bee…”, Rhistel enviou à namorada, “Audrey foi para a Rússia se casar com Keith Albrecht…”.

Quando Nyra percebeu que ele apenas convidou as três mulheres, fez uma expressão em dúvida, mas concordou:

– Eu espero que eles não estejam com intenção de casar cada mulher naquele lugar.
Judith riu sem jeito: – Eu já sou casada, então…

– Você é? – Nyra franziu o cenho.

– No papel. – Judy confirmou. – Por isso meu filho está lá… E eu estou um tanto surpresa porque Gregory e Keith tem parentesco e se conversam… Essas informações chegam em Athos e ele me conta tudo… Athos é um grande fã de Keith. Que ele chama de tio. Como aconteceu tão rápido?

Nyra concordou, pensando, “No mínimo Audrey não sabia… Que tinham um casamento pra ela lá” E fechou a conexão para seguir para a entrada da Ponte de Lua do Palácio.

A mudança de temperatura foi drástica e incômoda como uma quebra abrupta de temperatura. Do clima tropical para o intenso inverno, que somente não castigavas mais pelo calor que o Coração do Caern mais importante para a Sociedade Garou emitia.

Aceitar a Ponte de Lua quis dizer “aceitar uma conversa”. As paredes prateadas e semitransparentes de proteção em torno do ponto de chegada dizia que não estavam sendo convidados para entrar na Seita e a atitude não agradou Glavius. O Rei Presa de Prata esperou as lobas também atravessarem a Ponte e se voltou para Vlada Romanov.

A ruiva imponente estava do outro lado do cubo prateado em que aterrissaram. Trajando com um decotado vestido vermelho de frente única em que uma joia prateada unia as alças frontais e também descia pelo decote, salto alto preto e fechado e com os cabelos de cobre enrolados em um coque afrouxado, ela estava devidamente pronta para uma festa requintada. Ao lado do Príncipe Auric, a ruiva manteve um sorriso selado e cortês até vislumbrar as companhias de Glavius. O sorriso morreu e selou, quase inexistente.

Annik acompanhou gesto da ex-Rainha e atual Beta com o olhar incomodado e o coração apertado perante a confirmação da sua intuição. A loira inspirou e se voltou para Nyra. Os olhos cevados pousaram em Auric e ficaram. Ele quem havia buscado Audrey…

– Boa noite… – Vlada disse com a sua voz de menina doce, apesar da idade que quase alcançava os cinquenta e não lhe roubava a beleza. – Que surpresa… Vocês…

– Olá, Vlada… Alteza… – Glavius sorriu secamente. – Podemos entrar? Estamos com um assunto urgente…

Judith tocou a própria nuca quando o viu. O combinado era que o romance nunca tivesse abandonado as paredes em que se encontravam, mas ainda era estranho vê-lo. Auric, o filho primogênito, era uma grande promessa para a Sociedade. Havia recém casado com uma bela e maliciosa Aparentada, completamente ciente e emaranhada nos assuntos da Sociedade, assim que retornaram do Luar do Oceano. Judith abria e fechava seus sorrisos doces e nervosos e se silenciou. Nyra estava Furiosa.

– Não podem entrar. – Ele disse de pronto, arrogante como deveria ser. – Estamos fechados. – Ele falava firme – Apenas os convidados. E ninguém do Luar foi convidado.

– Audrey aparentemente foi. – Nyra retrucou. – E eu gostaria de falar com ela.

– Ela não é mais do Luar. Nunca foi, de fato. Aparentados não se afiliam. E ela aceitou o acordo com a minha mãe, a Rainha Alana. Audrey está se casando com Keith hoje. – Ele se colocou um pouco à frente de Vlada: – Retornem. Apenas os Valerius, e Glavius foram convidados de Fox Town.

– Alteza. – Glavius ergueu as mãos, pedindo calma a todos. – Tudo bem. Ah. A Seita do Luar do Oceano funciona diferente e temos que respeitar isso. Poderiam trazer Audrey aqui, para que esclareça o que está acontecendo?

– Não… – Vlada respondeu de pronto sem perder a doçura ensaiada em sua voz, olhando-os com os seus olhos arregalados. – Audrey está muito ocupada. É o dia mais importante da vida dela. Não pode ver ninguém agora. Era só isso?

Os olhos cevados de Annik transitavam de Vlada para Auric. A lupina entreabriu os lábios e inspirou com Fúria.

– Vlada. Auric. – Glavius abriu um sorriso nervoso. – Isso não está certo. Olhem… Para eles… Audrey tem um peso de um Garou… Então… Eles merecem ao menos uma explicação dela, entendem? É muito importante que isso seja dado e nenhum mal entendido seja interpretado. – Ele disse, lançando-lhes um olhar significativo.

– Sinto muito. Não podemos fazer nada quanto a isso. – Vlada sorriu e voltou os seus olhos para Nyra e Annik. – Audrey está ótima e feliz, não se preocupem.

Nyra os olhou e se viu de mãos atadas. A vontade era de invadir o local, mas aparentemente eles não mentiam também. Ainda, não conseguia acreditar na história. Audrey faria mesmo um acordo sem que eles soubessem? Havia se ferido com a história Ladi e Ártemis?

– Bem… Se ela não entrar em contato amanhã até a meia noite, nós iremos. E não vamos descansar até soubermos essa história. – Nyra ameaçou.

– Eu quero… Pelo menos pegar Athos. – Judith disse ao final. – Não posso ver meu filho?

Auric pareceu vacilar, antes de dizer não, na sua voz firme. E então negou.

– Não se preocupe, ele está bem. Está tudo normal por aqui. Voltem depois. – Ele disse – Estaremos prontos para recebê-los daqui há alguns dias. Vocês serão informados. – Ele se virou ao Rei – Sinto muito, Glavius. Respeito o costume deles, mas ainda, não é o nosso… Audrey veio por vontade. – Ele afirmou e continuou o olhando: – Já está pronto para entrar? Estamos aguardando-o, se ainda não estiver pronto.

– Argh! Vocês são… – Nyra não terminou, negou e olhou para Annik e Judith.

– Nyra… – Annik se virou para a Theurge. Os seus olhos completamente arregalados.

– Não. Eu não estou pronto. – Glavius respondeu, curvando a cabeça respeitosamente. – Perdoe-me, Auric. Não é desta forma que eu trato as minhas alianças… – Ele fitou o príncipe. – Vocês ouviram a Rainha Nyra. – Glavius lhes deu as costas. – Aguardaremos até meia noite por uma resposta da princesa. Estaremos na reserva florestal. Ela pode usar um celular, se desejar.

Ao que Glavius redesenhou a Ponte de Lua, Annik se desviou dele e se aproximou da parede que os dividia da Seita da Membrana Prateada, espalmando o vidro com as suas mãos pálidas. A loira olhou de Vlada para Auric com uma expressão que não se traduzia além da atenção:

– Sr. Glavius tem razão… – Ela disse, quase encostado os lábios na parede. – Nós damos muito valor a cada um dos afiliados que possuímos… Muito. – Annik assentiu, afastando-se e virando-se para entrar na Ponte de Lua.

– Eu acredito que esta noite ela estará bem ocupada para a festa. Mas tenho certeza que até amanhã ela entrará em contato. – Auric se entreolhou com Vlada, e os observou ir.

Judith o fitou desanimada e negou… Seguiu Nyra de volta à Reserva. A Presa de Prata Theurge apenas conseguia imaginar o que diria a Ladirus. Com certeza, o rápido retorno já entregava a má notícia. Em hominídea, Nyra negou para o restante dos Versos e os Dragões.

– Eles estão afiados e nada abertos. Acho que estão ganhando algum tempo. – Judith disse. – Não sei porque.

– Audrey vai nos ligar até amanhã à noite. – Nyra disse. – Eu espero que seja ela. É bom termos perguntas na manga para ter certeza que é a Audrey falando… E tentar descobrir o que houve… Se é que ela vai ligar. – Nyra disse e fitou Ladirus – Vamos voltar a Ilha.

– Estejam aqui. É melhor. Não sabemos que tipo de comunicação usarão… – Glavius disse a Jullian. – Eu sinto muito… Espero que isso se resolva o quanto antes.

Lentamente, Jullian concordou. O Lendário massageou a testa, observando Ladirus e Rhistel por um instante. Peças não se encaixavam. O Philodox coçou a testa. O que está acontecendo?

“Meu irmão está aqui, Polaris acabou de me avisar…” Blair disse depois de um longo silêncio. “Acho que veio me buscar para o casamento. E alguma outra proposta. Algum sucesso, Rhis…?”.

“Nenhum sucesso. Não conseguiram falar com Audrey, Bee… Eu não sei o que deveríamos fazer! Talvez… Fosse melhor você tentar ir… Mas não sei o quanto é perigoso. Não sei!”.

“Jule”, Annik disse à mente do Lendário ao pousar a mão em seu ombro. “Nay…”, ela incluiu a Theurge na conversa. “Eles são mentindo… Eu tenho certeza. Eles estão mentindo. Audrey não está casamento porque quer…”.

Entreabrindo os lábios, o Lendário fechou os olhos e respirou pela boca. O estado calado de Ladirus finalmente começou a preocupá-lo.

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