The Bakery

Categorias:Romance
Wyrm

The Bakery


O hospital era luxuoso o bastante para parecer um hotel cinco estrelas, mas ainda era um hospital. O sofá macio endurecia qualquer humor e as palavras claras e impessoais, com alguns quadros que ninguém se importava em admirar, eram cenários vazios para mentes preocupadas. Havia dois cafés esfriando na mesinha de centro, desprezados e esquecidos.

Annik raramente presenciava Nathan daquela forma. Foram poucas as vezes em que o Galliard simplesmente não dizia nada, nem manifestava os seus pensamentos. Quando dispensaram a presença de Jullian, Nyra e Remi, acreditando que seria apenas um retorno, o casal não esperava que o pequenino fosse passar mal de novo. Quando foram atendidos assim que chegaram, Anthony começou a chorar desesperadamente quando foi examinado pelo médico. O pequenino foi posto novamente para dormir e Nathan e Annik aguardavam.

A Garou nem havia passado maquiagem nenhuma em seu rosto e os cabelos estavam ao seu natural, lisos. Vestira a primeira camisa que encontrou, com o logo da Nymph, calças jeans e sapatilhas pretas. Nathan também não estava tão diferente na área de não se importar com a sua aparência. Ele vestia uma camiseta preta lisa, calça jeans escura e um All Star verde-escuro. Os seus cabelos claramente não estavam penteados, mas Annik o acariciava, penteando os fios macios, enquanto ele se escorava em seu ombro.

– Sr. Blackwood? – Uma enfermeira franzina e simpática surgiu na sala de espera.

– Oi. – Nathan se endireitou, alarmado.

– Anthony será atendido pelo Dr. Suzuki. Ele é o nosso pediatra mais querido. Ele acabou de chegar. Assim que alguma mudança em seu estado acontecer, iremos comunicá-lo, tudo bem? Ele está dormindo. – A enfermeira disse, amavelmente.

– Tudo bem. – Nathan respondeu, inspirando profundamente ao se encostar de novo no sofá. – Obrigado.

Carinhosa, Annik o tocou no rosto. Sentia-se agoniada, mas evitava demonstrar a sua tensão. Sentiu nos olhos dele o quanto a preocupação o perturbava e, naquele momento, alguém precisava manter a calma.

– Você já os avisou? – Ele murmurou.

– Avisei. Nyra disse que estão indo para a reunião daqui a pouco. Eu não falei muita coisa para não deixá-la preocupada…

– Fez bem, meu amor. – Nathan se aproximou dela, beijando-a demoradamente no rosto. – O que você sente sobre isso? Você acha que foi alguém que fez isso com ele…?

– Eu não sei, Nate… – Ela tocou sua testa à dele. – É melhor não pensarmos sobre isso agora…
Mesmo que não houvessem esperado ninguém, a maçaneta virou e a porta ficou entreaberta. A voz de Judith foi escutada:

– Não se preocupe. Eu vou checar se está tudo bem. Não. – Ela dizia com um sorriso simpático na voz, enrolando um enfermeiro que a viu no corredor. – Obrigada.

E entrou rapidamente. A Loba Maga usava uma saia “A” pouco acima dos joelhos, azul marinha com listras brancas, e uma regata branca. Seus cabelos loiros tinham luzes mais escuras recentemente, e estavam um pouco abaixo dos ombros, soltos e ondulados. Havia um lenço amarrado ao seu pescoço, e nenhuma joia. As sapatilhas pretas estavam em bom estado, mas carregavam areia da praia de onde havia teleportado após escutar Nyra e Jullian falando sobre Anthony… O bebezinho que havia sido levado algumas vezes ao vilarejo e a Garou passado quase todo dia, alguns minutos, mimando-o como gostaria de ter feito com Athos na sua infância. Gostava muito de crianças. Anthony a lembrava muito ele. Somando aos problemas que recentemente tinha tomado ciência que os Versos estavam metidos… Apenas foi sem avisar Jill ou Summer. Havia algumas na sua mente e uma vontade educada de se intrometer.

– Desculpa. – Ela sorriu para os dois ao vê-los no sofá, fechando a porta atrás do seu corpo. – Tomei a liberdade de vir. Eu fiquei pensando no que houve no vilarejo, e achei que podiam ter algum apoio externo… Ah… – Ela os olhou preocupada em estar invadindo, mas se sentou antes de perguntar: – Posso ficar um pouco com vocês? Como ele está?
A presença dela surpreendeu os dois, mas estava distante de não ser bem-vinda. Annik e Nathan se ergueram para cumprimentá-la com beijos no rosto. Estavam tão perdidos que se demoraram a se recordar de se sentar. Nathan olhou para Judith com uma expressão pensativa e indicou o sofá, sentando-se logo depois de Annik.

O cansaço se estampava nos semblantes dos dois. Cansaço mental e preocupação. Nathan franziu o cenho, tentando buscar por uma explicação para as dores que o seu filho andava sentindo, mas Annik se adiantou em responder:

– Colocaram-no para dormir… – Ela respondeu mansamente, entrelaçando os longos dedos das mãos. – Não sabemos o que ele tem. Ele… Somente sente dores terríveis. – Annik franziu o cenho. – E ele ainda não sabe explicar…

– Não é de hoje, mas ele nunca tinha tido uma crise assim. – Nathan comentou, fitando o tapete com um olhar parado. – Anthony raramente chora por alguma coisa, sabe… Ele é muito bonzinho.

Judith os escutou olhando os com atenção. Fitou ao redor, o luxuoso quarto e suspirou brevemente, sentindo o cansaço deles.

– Eu imagino… Eu conheço por cima a história do Thony. Ele é um anjo. Lembra meu filho. Eu tenho um… – Disse entre seus sorrisos, já que a informação não circulava tanto quanto o nível de fama que eles obtinham. – Thony é fácil com todo mundo e isso é tão adorável. Ele sempre ri quando o pego no colo. Você acha que… Não é necessário uma intervenção Mágika? Eu posso fazer algo sobre isso talvez… Se é que já não tentaram…

Fechando os lábios que haviam se entreaberto, Annik se voltou para Nathan, segurando-se de fazer perguntas.

– Já. – Nathan passou a mão pelo pescoço, massageando-se. – Mas talvez seja preciso algo mais focado, assim que entendermos o que ele tem. Vinny se propôs, ela… Manja de Vida, então… Mas qualquer ajuda seria bem-vinda… – O Galliard inspirou. – Anthony é… Filho de dois Garou, então… Não sabemos se isso o prejudicou também… – Ele confessou, observando-a.

Judith assentiu:

– De longe… Lavinia é a melhor opção para ver sobre isso. Mas saibam que posso dar assistência se precisarem. – Olhava-os.

– Eu não sabia que você era mãe.

Annik pestanejou. – Ele não está na ilha… Está? – Annik franziu o cenho. – Pelo menos, não ouvimos nada sobre isso…

A curiosidade deles fez o sorriso de Judith crescer:

– Sim, eu sou mamãe. – Riu – Infelizmente, não… Eu não consigo o ver sempre… E na verdade… Ando até um pouco preocupada. Ele está na Rússia, sim. Meu menino Athos. – Pegou o próprio celular para mostrar uma foto dele e dela abraçados em uma festinha de aniversário. Ela falava com certo orgulho – Ele vive com o pai Aparentado por lá… Por enquanto… Enquanto a Mágika ainda não desperta… Minha vontade era ter trazido logo que cheguei, mas… Parecia estranho pedir no começo.

Annik se curvou para frente, tentando ver melhor a tela, mas acabou pegando o celular de Judith na mão e mostrando-o igualmente para Nathan:

– Oh. Ele parece um lordezinho inglês… – A Ragabash gracejou com um sorriso. – Olhos grandes… Boca pequena. Você deveria trazê-lo! Nathan está planejando tantas coisas divertidas com a professora Beatrice… Oficinas com diversas atividades que tenho certeza que até os adultos vão querer ir…

– Mais os adultos, acho. – Nathan observava o menino e a mãe. A mãe principalmente. – Estou tentando trabalhar na nossa proximidade com a Seita. Nós andamos muito distantes nesses últimos tempos…

Judith tinha um sorriso de menina, embora se portasse como mulher. Havia uma mistura das duas imagens nela. Nathan a observou.

– Ele é muito apegado ao pai? – Annik perguntou ao devolver o celular. Feliz pelo assunto estar distraindo um pouco Nathan. Ela buscou pela mão do rockstar, segurando-a entre as suas enquanto fitava Judy.

Ela aceitou o celular e observou uma última vez antes de guardar o aparelho. Estava risonha por falar do menino, olhava-os e falava com vivacidade e seus sorrisos:

– Ele é, mas… É mais apegado ao tio. Athos já tem postura de um lobinho, e o tio é Garou. O pai Gregory é aparentado. Nós casamos muito jovens por uma negociação de família e… – Ela pareceu pensar, e ficou um pouco sem jeito de prosseguir, mas acabou dizendo – Gregory é apenas pai no papel. Por isso foi as pressas. Eu já estava esperando. – Ela sorriu e acabou rindo. – O casamento é na documentação agora. Para eu manter meu sobrenome russo, embora eu não faça questão, é mais por meu filho. Mas… embora ele viva com o pai… Ele é muito apegado a mim… Terrivelmente. – Apertou as mãos – Toda vez é uma tortura deixá-lo…! Ele sempre me faz prometer que vou voltar…E pergunta quando vou levá-lo. – Ela demonstrou breve angustia – Mas parece que pode até estar próximo. Ele já está grandinho. Eu queria trazê-lo de vez! – Afirmou – Mas é complicado…

Uma história digna de uma Blackwood. Annik observou Nathan de soslaio, fitando o Galliard com as sobrancelhas muito arqueadas. Para a Ragabash, o costume russo e aquele tipo de termo eram comuns e elas já havia presenciado diversos. Os russos lidavam com casamentos de uma forma tão formal que sempre a incomodou, sendo ela tão sentimental, e até fria. Os dias atuais não tinham lavados essas tradições antiquadas embora e Annik até podia imaginar o peso que a Rainha Alana estava carregando com as suas novas ideias libertadoras.

De repente, a Lua Nova sentiu um estalo. Um aviso incômodo.

– Talvez fosse devesse trazê-lo logo, Judith… – Ela disse com uma súbita firmeza.

Estranhando, Nathan se voltou para a Garou com uma expressão desconfiada.

– Tive uma sensação ruim ao pensar na Rússia… – Annik explicou.

– Bom. Ele é mais do que bem-vindo… – Nathan disse. – Dá para sentir a falta que ele te faz… O seu coração está em suas palavras, sabe? Eu consigo imaginar como é ruim viver longe do filhote… Estamos sempre perto dos nossos… Nossa… Família de retalhos. – Nathan sorriu para Annik.

Annik sorriu, mas não deixou pendurar o sorriso…

– Eu acho que vou lidar para a Nay… – Ela se ergueu.

Judith acabou se levantando por reflexo, sentindo a aflição que Annik passava.

– Eu… Queria muito trazê-lo… – Sorriu ansiosa e voltou a se sentar – Eu senti que o clima com a Rússia anda nublado… Há uns meses eu fiz uma visite… A política anda intensa por lá. Alana tem revirado muitas coisas… Tive até medo de uma guerra interna. Mas eu não pude trazê-lo. Acho que vou pedir para alguém o trazer… Né? – Confirmou com Nathan e fitou Annik em seguida – Eu não consigo pensar em nada mais seguro que a Ilha… Sério… Os Dragões tem sido jóias. – Encarou a Lupina por um tempo – Você é muito sensitiva, não é? Eu posso sentir…

O sorriso de Annik se esboçou acanhado por seus lábios bem desenhados. A russa entrelaçou os dedos das mãos, dizendo com suavidade. – Coisinhas de lobo… Eu… – Ela desfez do gesto doce e pegou o celular do bolso da calça. – É melhor eu ligar…

– Tudo bem, amor. – Nathan assentiu.

Mas… Não pôde trazê-lo? Nathan guardou a pergunta, embora os olhos escuros a fizessem quando retornou os olhos para Judith. Ele se levantou vagarosamente, olhando-as. De repente, também preocupado. Duas preocupações. – Diamantes brutos complexos, mas, sim… São joias. Eu me sinto seguro com eles por perto, apesar dos seus temperamentos…  – Ele apertou os lábios. – Guerra interna?

– É verdade… São diamantes fervilhando. – Riu breve, cruzando os braços na altura da cintura. Ela fitava os olhos escuros do Galliard e pensava… Também havia muitas perguntas nos seus. Além de… Serem belos olhos para serem admirados. “Meu amor”… Judith se encantava sempre com a forma que se tratavam. Viveu no meio de tantas aparências, e eles tão puros!

– Sim… Guerra interna. Política. Famílias em busca de posições e renomes. Aquele ciclo vicioso e sem sentido. Alana está propondo mudanças no mundo Garou de homens, velhos, Presas, confortáveis. – Apertou os lábios e negou – Ela está sendo pressionada. Auric, o filho da Rainha, está sendo disputado a tapas pelas famílias que tem Aparentadas moças. É até trágico! Parece que algo vai irromper a qualquer instante… Acho que… Vou agilizar o retorno do Athos… Gaia! – Tocou a própria nuca e riu sem graça – Fiquei nervosa! E vim acalmá-los.

Pensativo, Nathan a escutava e agradecia por não ter nascido russo. Em suas poucas visitas obrigatórias, nunca se sentiu confortável no Palácio do Lobo Branco. O Galliard franziu um cenho, recolhendo o lábio inferior para dentro da boca… – Difícil mudar esse quadro aí. É como os Garou vivem atualmente. Anciões poderosos sentados e Athros mandando nos postos inferiores de dentro de suas Seitas. Já cansei de ouvir que somos loucos em continuar com missões afora, pois lideramos… E deveríamos ficar na ilha e liderar. – O Galliard ergueu as mãos e os ombros, esboçando um sorriso malicioso de escanteio. – Com a Wyrm batendo em nossa porta… Nós deveríamos simplesmente ordenar nossos súditos? Ficaríamos gordos em um mês. – Ele negou com a cabeça. – Não, obrigado.

Os olhos escuros devolveram o olhar dela e ele se calou por um instante, apenas reparando em detalhes – o sorriso, a doçura e a curiosidade… – antes de Annik começar a falar no celular.

– Estrelinha, você já está na reunião? – Annik mordeu o lábio. – Eu estou um pouco aflita… Acabei de sentir uma coisa…

Judith desviou os olhos de Nathan com relutância para a conversa de Annik no celular. Mas retornou a ele, curiosa:
– Desculpe perguntar. – Falou baixo para não interromper a Lupina – Thony trata você como pai e a Nyra como mãe? Eu acho que nunca prestei atenção. Athos sabe que o pai dele e eu não namoramos mais… Mas é sempre complicado explicar qualquer coisa a ele. – Confessou.

– Eu estou me aprontando para ir… – Nyra disse do outro lado. – Sobre a reunião? Anthony está bem?

Os dedões do Garou se engancharam na calça jeans quando ele se esticou todo, esticando um sorriso selado por seus lábios. – Anthony não conheceu a mãe dele… – O Galliard dizia, intercalando os olhos entre ela e Annik. – Eve o rejeitou. Ela teve depressão pós-parto. Nós não estávamos juntos. Só aconteceu. Enquanto ela não me provar que está sã com algum laudo médico, eu não vou permitir que ela conviva com ele. Ela tentou matá-lo, então… – Ele arregalou brevemente os olhos.

– Eve ainda tenta contato? Ela quer voltar a ser mãe do Thony?

–– Eve quer… Mas ela está fazendo da pior forma. Já acionou a justiça, já foi na televisão em programa de fofoca… Quando ele nasceu, Nyra me deu muito apoio. Ela é a mãe dele, no fim…

Judith perguntou e manteve seu olhar nele. Parecia uma história que foi dolorida, mas superada.
– Ela parece… Nyra é uma ótima mãe. – Sorriu ao final: – Diga isso a ela quando puder. Eu não acho que ela saiba…

Um sorriso tranquilo quebrou a seriedade dos lábios ingleses. Nathan assentiu vagarosamente. – Sim. Direi a ela. – Ele se voltou para Annik.

– Anthony está dormindo… – Annik disse com uma voz entristecida. – Estamos aqui, esperando… – Ela fez uma pausa. – Senti que a Rússia está mexendo pauzinhos que não vamos gostar. Mantenha-se atenta sobre o que a envolve…

Nyra escutou e respirou fundo do outro lado. – Rússia? Achei que não ouviria esse nome tão cedo. Bem… Eles não entraram em contato ainda… Nem parece que estão interessados na gente… Por enquanto. O que você está sentindo?

– Eu acho que eles não vão mais entrar em contato. – Annik disse, fitando de Nathan para Judith. – Eu senti que nos trairão… E darão um sinal disso.

– Oi? – Nathan estreitou os olhos para Annik.

A Ragabash assentiu vagarosamente, preocupada.

– Mais essa. – Nathan suspirou com impaciência e virou-se para a porta quando bateram nela.

– Preciso ir, Nay. – Annik desligou.

Judith olhou Annik e suspirou mas em aflição.

– Eu acho que eu deveria estar aqui para escutar isso e ir atrás de Athos… O mais rápido. – A Garou disse e piscou os olhos devagar. – Vocês me avisem se Thony melhorar ou piorar?

– Sim. – Annik respondeu de pronto e aproximou-se para abraçá-la, simplesmente. – Obrigada por vir… Foi muito gentil da sua parte… – Disse, ao se afastar.

Concordando com a cabeça, Nathan sorriu, apesar de breve. A sua atenção estava naquela porta e, também, infelizmente na ligação que se pregava em sua cabeça.

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