Saurgate

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Saurgate


Os olhos se abriram preguiçosamente antes de se fecharem pela falta de coragem. Lavinia respirou com discrição, tentando não chamar a atenção de nada antes que analisasse o que havia feito e pudesse tomar alguma atitude a respeito do grande acúmulo de merda que fizera no Solstício de Verão.

A respiração de Mylo estava arrepiando a sua nuca…

Uma faixa de luz quente se iluminava em sua coxa e ela não se admiraria se estivesse bronzeada naquela região. Era impossível que houvesse se mexido muito à noite, pois estava praticamente imobilizada. As suas pernas nuas se confundiam com as dele, enroladas, e os seus seios estavam nas mãos do Garou. Ela nunca souber dizer como ele conseguia dormir daquela forma sem se mexer, com os braços cruzados sobre o seu peito como um “X” e segurando-a sem que pudesse fugir. Ela costumava brincar dizendo que ele tinha medo de que alguém entrasse e visse os seus seios nus. Não pense no passado…!

Obviamente, que sentir as fortes mãos a segurando em regiões tão sensíveis foi uma “péssima” forma de começar o dia – como costumava a “ser”. Péssima, sim! Argh! Lavinia abriu os olhos e voltou a fechá-los. Sentia-se levemente dolorida em suas partes íntimas. De tanto dar! Franziu o cenho. Nem se lembrava quando havia sido a sua última transa com um homem e estava de parabéns em suas vontades. Nem Fúria havia sobrado. Dando para quem não te merece. Gostaria de se arrepender, mas seria uma grande hipocrisia. Mylo era um amante intenso e carinhoso. Ele beijou meu corpo inteiro, Gaia. Perdoe-me. “Sua safada. Você quem pediu!”, Gaia diria. Gostaria de mentir que estivera bêbada a noite inteira, mas a sua essência Garou não permitia. Eu preciso ir embora… Correndo. Como iria encarar Cassian e Tyler…? Horrorosa.

Os olhos azuis se abriram e ela fitou os próprios braços estendidos, correndo o olhar pela longa cicatriz branca que marcava um deles. Havia muitas outras em seu corpo. Nenhuma delas muito discreta. Lavinia nem devia ter o tipo de alguém tão preocupado com aparências e mesmo assim, existiram poucas pessoas que conseguiram fazê-la se sentir tão perfeita quanto ele fazia. Idiota. Vá embora.

Seus braços sempre a apertavam um pouco mais forte antes de despertar, como se quisesse ter certeza que ainda estava ali. E fez por reflexo, não por costume… Mylo não dormia daquela maneira depois que terminaram. Quando seus olhos se abriram, identificando-a antes pelo perfume, surpreendeu-se discretamente ao não lidar com os fios loiros. Eram os castanhos e úmidos de Lavinia. Ele afastou um dos braços e desceu a mão delicadamente pela cintura feminina, marcada pela cicatriz reconhecida, e relembrando da noite insana. Insana. As noites com Vinny como costumavam ser. Ele roçou seus lábios no pescoço dela e soltou-a um pouco do seu abraço. – Vinny… ? – Ele sussurrou e suspirou, mas percebeu que ela estava acordada pela respiração mais leve. – Ah… Boa tarde… – Fazia tanto tempo que não tinha uma noite assim, que seu corpo se aqueceu rápido somente em encarar os olhos da loba novamente… As recordações mais intensas, os lençóis amassados, os cabelos bagunçados, seu perfume dominando o ambiente. Seu coração discretamente se acelerou ao também lembrar que não estavam num passado… Daisy devia ter ligado a manhã inteira, mas não conseguiu se preocupar, pois seus olhos sequer conseguiam sair de Lavinia e tudo o que parecia relembrar em relação aos seus sentimentos. – Onde estamos…  – Ele não reconheceu o ambiente, mesmo após coçar um dos olhos. Casa de alguém, e uma das luxuosas.

Qual papel adotaria? “Minha Gaia, o que fizemos?!”, “Nem ligo” ou “Foi legal”? Vinny se virou, deitando as costas no colchão e o olhou. Os lábios cheios se destacaram um do outro, mas ela pareceu não se decidir bem sobre o que diria. Desviou-se brevemente para si, encontrando seios manchados por chupões. Minha nossa, você não faz nada pela metade, né. Nem merda. – Nós estamos… Na casa da Blair, no quarto que estou hospedada… Eu sou amiga dela. Bem, estou sendo… – Ela disse num sussurro incerto e parou de falar antes de se enrolar demais, apertando os lábios, ela ergueu o olhar até o dele, mirando-o com culpa. Culpa, culpa, culpa. Olhos claros e intensos, desviou-se para o teto, tamborilando o próprio abdome. – Pois é.

Blair Valerius… Tentou se lembrar se Daisy Blanc era amiga dela, mas logo recordou que não. A atriz não era de se relacionar com socialites. Isso o tranquilizou internamente… Mas ainda não sabia se Vinny gostaria de ter mais um tempo com ele ou se seria prontamente expulso. Aparentemente poderia ser a primeira opção… Se tivesse as palavras certas para a Garou explosiva? – Vinny… – Ele a tocou no rosto gentilmente. – Eu… – Fechou seus olhos e a beijou no rosto, inspirando seu cheiro. A mão de Mylo desceu até seu abdome, fazendo um carinho com seu polegar na pele clara. Como foi difícil se desprender de algo tão bom… Apenas conseguia se lembrar, e como seria difícil naquele instante. Sair daquela cama? Seu corpo até ficou mais pesado ao pensar na possibilidade. – Gaia… Eu… Não sabia que sentia tanta sua falta, Vinnie… Eu queria se sentisse como antes… – Encarava-a, perguntando-se como haviam ficado assim. – Que me visse… Eu fiz tudo errado…

– É, você fez… – Ela fechou os olhos quando sentiu o toque, mas não se deixou levar, não. Certas coisas não tinham mudado com o tempo e a cara de pau dele era uma delas. Lavinia acompanhava a mão forte do lobo percorrendo o seu corpo, sentindo-se quente de novo. Qualquer coisa que ele fazia, a deixava excitada? Era isso? Morreria sufocada, mas não suspiraria. A expressão séria dela se transformou para a descrença. A Lua Cheia estreitou os olhos e franziu o cenho. – Claro que sente… Eu sou boa. E você é um gostoso, infelizmente. – Ela respondeu com um cinismo de superioridade e fez um muxoxo por fim, sentando-se e apoiando a cabeça na mão, curvada. – Mas nós não vamos ter essa conversa, badboy… Só… Não.

Ela se afastou e ele se largou deitado, olhando para o teto e cheio de Fúria. – Vinnie. – Ele se apoiou nos braços e a olhou, fitando suas costas marcadas. – Não se faz de indiferente, você sabe que nós tínhamos. Nós temos algo. Eu me importo com você demais. Nós não podem-… – Ele suspirou e continuou a olhando. Talvez fosse cedo, um momento eufórico, mas não sabia ter conversas amenas com a Garou; e parecia que nem sentimentos. Ele inspirou paciente e disse: – Vi… Vamos… Tomar um banho, um café… ? Não  precisamos ter essa conversa. Mas eu não quero sair correndo daqui. – Ele se aproximou e tocou as costas da loba, acariciando-a devagar. Mylo a beijou entre os cabelos finos e a fitou. – Hein…?

Lavinia não conseguia se sentir entristecida com a situação. Sentia-se com raiva e suspirou com Fúria. Eu deveria era te meter uma garrada nessa sua cara linda e chamar a sua linda noiva aqui. Mordeu a língua, sentindo as próprias presas afiadas enquanto o ouvia. Ela fechou os olhos com força, buscando pela sua vontade de resistir. Eu não quero que você saia correndo. Suspirou. Fraca. – Café… – Ela repetiu, olhando para o teto, mas por impulso virando-se para ele. – ‘Tá… – Resista, resista, resista! Lavinia mordeu o lábio. – Um café. – Concordou, assentindo. Talvez não precisasse tê-lo olhado tanto. Poderia não sentir tanta saudade, por favor? Ela o empurrou contra a cama de novo, avançando sobre ele e sentando-se sobre o seu abdome. – A culpa é sua. – Ela sussurrou antes de se deitar e beijá-lo novamente.

Sempre explosiva, sempre com as reações inesperadas. Sabia que ela sentia raiva, mas ele não conseguiu não sorrir quando foi lançado às vontades de Lavinia de novo. – Um café… E o banho… – Mylo insistiu risonho, segurando-a firme em sua cintura fina. Os belos olhos sempre chamavam atenção do Garou, e foi para eles que olhou antes de mordê-la no beijo. Mylo se sentou e a abraçou ,ergueu-se na cama com ela no seu colo, agarrando-a pelas coxas e a levou para o banheiro e chuveiro, sem deixar seus doces lábios no caminho, revivendo memórias perfeitas e que tinham o mesmo gosto úmido e selvagem de suas noites longas. Aquilo ficaria perigoso… Seu coração até tentou avisar, mas foi muito fácil ignorar cada chamada que o celular desligado deveria estar coletando. Mylo tinha certeza que de alguma forma sempre a amaria…




A sua imagem de poder estava caída por terra, mas ela não estava se importando nem um pouco. Dada a meninices, a Dragonesa do Fogo estava deitada de bruços, com os braços estendidos pelo colchão macio e o tronco soerguido. As pernas elevadas se moviam, indo e vindo alternadamente, como uma garota arteira de lábio mordido e cabelos bagunçados – embora os longos fios ruivos não viessem precisamente a bagunçar. Ela o observava. Não havia nada naquele quarto impessoal do castelo que chamasse a sua atenção. E mesmo que houvesse, como se desviar? Os olhos caçadores como os de uma serpente estavam entretidos com o lobo ao seu lado. Ela cruzou os braços, deitando o rosto perfeito e sardento sobre eles… – Eu posso te fazer uma pergunta, Donald? – Ela disse com a voz suave e manhosa que possuía. Manhosa, mas firme e decidida de quem não aceitaria um não e só estava sendo gentil. – Eu posso visitar a sua cama sempre que eu quiser?

Se não soubesse que era uma Dragonesa, desconfiaria, e era possível! Não haviam sequer tirado uma soneca de meia hora, pois as chamas de Kraz eram como o próprio fogo da criação. Infinito. Ele encarava o teto com a mão no peito e ofegava profundamente, pensando, enquanto a outra mão livre levava o cigarro até os lábios, fazia poucos minutos que estavam descansando e havia pedido licença a ela educadamente antes de ascender… Ah! E o pior… Ainda era fofa! Cativante igual a uma serpente que encantava e se enroscava antes que você percebesse que já estava preso. Ele se sentia preso, e era uma das melhores sensações. Donald a encarava sem saber o que pensar a todo instante, mas igualmente derretido por tudo o que ela era. Seu corpo, sua desinibição, a voz manhosa… Extremamente selvagem, mas cheia de detalhes humanos em sua personalidade. Uma Dragonesa. Precisava relaxar…

O quarto estava inteiro revirado… E nem sabia de quem era aquele lugar, mas possivelmente um dos poucos inabitados àquela altura. O luxo estava até na maçaneta dourada, mas a bagunça era de qualquer outro lugar. Lençóis no chão, itens pelo piso, estofado arranhado… Não havia nem necessidade de conter suas presas e garras, embora tivesse evitado o máximo ferir aquele corpo de escultura. E transpirava… Se seu corpo Garou já era quente o suficiente, o de Kraz era febril, especialmente nos momentos em que o ápice tocava sua pele clara e bela.

A pergunta o fez se sentar e ajeitar as costas no travesseiro. Seus olhos vagaram por ela, um pouco preocupado… Ela sabia que ele era casado? E que Kyna estava por ali? Gaia… Tinha que pensar. Não queria dizer não, mas a ideia era selvagem além dos seus planos. Imagina só, Donald

– Ah… – Ele procurou mais um gole do whiskey do criado mudo e terminou o último gole. Preferia uma cerveja para se refrescar, mas aceitou o que tinha no minibar.  – Eu… – Ele começou devagar, apagando o cigarro dentro do copo e deixando de lado. Como diria?  – Eu sei que você notou… Mas… Eu tenho uma esposa… E ela… Dorme comigo às vezes… – Explicava devagar, acompanhando as reações do belo rosto – E… Ela ficaria furiosa com essa situação… Eu… Não é que eu não te queira, isso foi perfeito… E… Eu quero, mas… Poder é sempre complicado… Sabe? E… Isso foi bem rápido… Gaia. – Ele tocou a ponta do fio do cabelo dela – Eu realmente não quero te decepcionar…  Só que… O que fizemos foi bem proibido… – Deve ser por isso que foi tão bom. 

Ela mordeu o dedo indicador dobrado e riu, olhando-o. Os olhos se desviaram para os dedos que tocavam os seus cabelos pintados de fogo. Kraz inspirou. – Hmmm… E ela é egoísta? – A Dragonesa se ergueu, engatinhando até ficar com o tronco sobre o dele. – Não posso ter você também? Parece injusto… – Ela deitou a cabeça o peito do lobo, olhando-o. – Se eu estiver apaixonada…? – O sorriso cruel surgiu em seus lábios finos e ela o mordeu ao queixo. – Sabe, a sua esposa pode sumir… Você iria ficar triste? – Kraz arregalou os olhos. – Eu estou brincando… Ou não. Hmmm… – Ela pareceu pensar. – A sua voz me deixa queimando, sabia? Se você continuar falando, talvez eu não aguente… Eu poderia te raptar e te guardar como o meu tesouro… – Ela mordeu o sorriso e gracejou. – Você gostaria disso?

Nem sabia mais se deveria continuar falando. Cada palavra dela era uma brincadeira muito perigosa, e nem sabia dizer até onde a palavra brincadeira se encaixava. Já havia escutado rumores sobre Kraz pela Ilha. Donald moveu o braço para as costas dela e inspirou. Desviou seus olhos para as paredes e retornou a bela orbe da Dragonesa.

– Eu tenho certeza que a ideia de ficar guardado em alguma torre ou como tesouro funcionaria bem por um tempo. Mas melhor não. Minha Alcateia ia sentir saudades. Eles não vivem sem mim. – Disse com aquela seriedade cômica, a voz mansa e calma até demais. – Eu vou ficar surpreso se você estiver apaixonada. – Não sabia como, mas iria ser difícil se separar completamente de Kraz por Kyna. Kyna! A esposa mais negligente da história. Apenas atrás de dinheiro e uma boa vida, mas o ciúmes sempre afiado. Donald era usado pela mulher, conforme sua Alcateia inteira já havia apontado, mas tinha muita pena… Sabia que divórcio não era um objetivo dela, e ela precisava da proteção e o nome. E um bobo. – E ela é bem egoísta. Mas eu fico triste quando as pessoas morrem…  – Disse por fim, tentando responder todas as perguntas dela. – É uma droga viver de costumes e tradição, sabia? Meu sobrenome ajuda muito pouco em quase tudo. – Ele a trouxe para cima de si, puxando sua coxa feminina para se acomodar sobre seu abdome, porque era mais fácil que pensar. Eu tenho que ir. Mas desconsiderou. Como iria abandonar aquela ruiva? Por mais que tudo fosse exatamente estranho. – Eu já estou queimado, Kraz. Está pegando fogo nesse quarto todo, e eu estou aqui. ‘Está tudo bem’. – A reclamação era quase para si mesmo, porque não tinha nada que reclamar sobre ela… – Você… Acha que… Acha que estaria apaixonada? – Fitava-o um pouco surpreso ao prestar atenção na frase de novo, e o pior, não duvidava. A forma como era engolido pelos olhos dela, paixão era algo muito fácil de crescer da sua parte, se é que já não havia, levando em consideração todas as músicas e sonhos…

– Vocês são tão complicados… Por que não abraçar a liberdade? A felicidade… – A calma dele a entretinha, assim como a sua falta de receio de tocá-la. Um estágio novo. A Dragonesa prestava a atenção nos gestos. Não tinha muitos seres que ao seu redor que não receavam em tocá-la. Nyra e as crianças? Nathan, às vezes? Ele o observava com uma admiração pensativa enquanto o ouvia. O seu coração, órgão ardente, mas leve como fogo, batia suavemente. Tão calmo que ela mal o sentia… – Talvez eu esteja… Mas posso te contar quando eu tiver certeza. Eu não compreendendo muito bem os sentimentos e as emoções ainda. Alguns são óbvios, outros… – Ela piscou os olhos devagar. – Nem tanto. Hmmm… Sentimentos são perigosos… – A Dragonesa pareceu distante por um momento, reflexiva. – Eu estou sentindo você… Desejando-me. – Ela começou com maliciosamente. – Mas Nyra está perguntando por mim, então… Eu não posso demorar… Você pode falar o meu nome… E eu volto para você. – Ela de curvou, pousando um beijo aos lábios. Um beijo em chamas. – Eu ficava imaginando… Como seria te beijar… Se eu conseguiria fazer direto. – Ela pareceu pensar. – E o meu primeiro beijo foi com uma garota. Por esta eu não esperava. Annik e Nyra estão sempre se beijando… E é muito bonito. Delicado. Lavinia me beijou delicadamente também. Eu não sei o porquê eu nunca me imaginei e- – Ela franziu o cenho, rindo e cobrindo os lábios. – Eu estou falando demais. – Kraz riu, tímida. – Isso é estranho. É melhor eu ir… Eu não quero parecer uma menininha boba. – Ria.

E estava desejando mesmo, muito. Cada palavra que ela desenvolvia parecia um novo feitiço a caminho, rondando sua mente e fazendo tantas curvas que perdia o caminho de volta. Sorte que Nyra estava a procurando, ou não saberia soltá-los daquela situação. Apaixonada… Imagina se era verdade? Seu coração bateu mais forte, mas como sempre, ele se colocou censura e cautela. Segurou sua mão e a beijou com carinho. – Só chamar…? – A facilidade ia ser um crime. Só chamar! Piscou seus olhos devagar. – Está bem. Eu tenho que… Procurar minha Alcateia também… Eu nem sei que lugar do castelo estamos… – Tocou-a nos braços finos e delicados e a beijou em selinhos carinhosos. – Você nunca vai ser ou parecer uma menininha boba, acredite… – Negava, convencido disso – Nunca. E você falando é a melhor coisa… Queria ter tempo de te escutar mais…
Aquela noite incendiariam muitas coisas… Pensava, receoso. Era melhor começar a elaborar um plano de fuga para sua mente. Ia ser bem difícil não pensar em Kraz.

Sorrindo novamente, ela assentiu rapidamente. – Meu nome é antigo e mágico. Se você me chamar… Com a intenção de falar comigo, sim, eu posso te escutar. É assim que estou ouvindo Nyra agora. – Explicou, fechando os olhos para os beijos que apenas a deixavam desejando os próximos… – Estamos no último andar… Como num ninho de Dragão. – Brincou. – Iliya está aqui… E a sua esposa… E a noiva do Mylo… – Contava. – Mas… Só. Você vai ter que procurar em outro lugar, Don. Eu aposto que ele está muito ocupado com a Poetiza. – Ela riu com um humor maldoso. – Meus irmãos estão todos espalhadas… – Lentamente, ergueu-se e colocou-se de pé sobre a cama. – Foi uma noite bem louca. Você irá me chamar? Eu posso ser uma menininha boba para você… Eu não me importo… – Kraz desceu da cama.

“Posso ser sua menininha boba”... Aquilo ficaria registrado em sua mente. Até esqueceu de todo o resto. Kyna, Iliya, Mylo, quem? Donald a assistiu se afastar e ficou com as mãos sobre o colo, quase melancólico. Quando Kraz partiu, ele nem conseguiu se levantar… Nem gostava de mexer no celular, mas ficou nele por uns minutos, mandou mensagem para todos e se ergueu. Melhor ir atrás de Mylo primeiro, e aí pensaria no que dizer a Kyna… Ainda sem acreditar na sua situação, nem um pouco na do amigo. Era isso que o Solstício fazia? Poderoso. Pensava enquanto se trocava. Poderoso.

Esqueci a minha roupa. Kraz franziu o cenho ao retornar a forma hominídea, aterrissando em um leve salto no topo do iate de Jullian. Ao Espiar a Tellurian, simplesmente fez a passagem. Ouviu o som do mar, mas também a respiração pesada de Jullian e Annik dentro da cabine. Kraz sentiu os cabelos ao vento e caminhou até Nyra, sentando-se ao lado da Garou tão nua quando a Dragonesa.

– Olá. – Ela abriu um sorriso arteiro. – Eu vim à caráter…

E estava muito entretida no seu celular seja lá o que estivesse fazendo, e ele não parava um segundo de tocar em alertas de novas curtidas. Estava se sentindo tão bonita com aqueles cabelos negros, lábios róseos e longos cílios que foram muitos vídeos e fotos de uma vez. Inclusive uma live para dizer a seus fãs que o álbum estava pronto. Apenas desligou o aparelho para dar atenção a súbita presença de Kraz…Observou-a nua e adotou um semblante interessado.

– Finalmente… Você não costuma demorar quando te chamo… Vai me dizer que… Estava de companhia também? Seus irmãos… Desapareceram do mapa… – Desabafou – Acho que só vou ver a cara deles amanhã. Felizmente estou bem calma hoje. E você… – Tirou o óculos escuro para a fitar melhor – Me parece feliz.

Timidamente, ela concordou. Kraz era muito rápida para demorar. Os olhos claros, entre o azul e o verde, observaram o mar. – Eles estão espelhados, mas… Connor está pertinho da Árvore de Dagda. Ele com certeza voaria correndo se você o chamasse. – Ela esboçou um sorriso selado e malicioso. – Ladirus está longe… Rhistel também… E… – Ela franziu o cenho. – Acksul também não está na ilha. Isso sim é estranho. – Inspirou. – Bem. Eu estava… – Ela abraçou as próprias pernas. – … Com o Donald…

Nyra tinha certeza que Connor viria, e isso até a mexia por dentro; mas havia feito aquela promessa de não se envolver com nenhum deles… Embora Connor estivesse tornando tudo difícil. Ela assistiu o sorriso malicioso de Kraz e retribuiu achando graça.

– Acksul… Não? – Perguntou intrigada, mas mudando o foco da sua curiosidade ao vê-la se expressar inteira para informar… – Você estava? – Abriu os lábios surpresa. – E aí? Como foi? Ele finalmente resolveu falar?

A Dragonesa estreitou os olhos, pensando em como começar. Ela abriu um sorriso, abaixando a cabeça e começou descrevendo primeiramente o beijo com a Poetiza, não poupando a Theurge dos detalhes da sua surpresa e calor. Em seguida, descreveu o de Don. Tudo muito confuso! Atordoado! Quente! Um atrás do outro…

– Então, eu falei para Donald me levar para outro lugar… E nós fugimos para o castelo…

Beijou a Lavinia e terminou em Donald. Não ficaria surpresa se as duas acabassem juntas… Mas o interesse de Kraz parecia imenso sobre Donald ainda.

– Ele é tudo o que imaginou? Como foi? – Ela sorriu curiosa – Vocês se beijaram…? Ele me parece o tipo carinhoso e preocupado. – Mordeu o lábio – Eu disse a você que ele é casado. E isso é uma grande coisa para as tradições. Vocês se arriscaram bastante… Ela estava lá… – Torceu os lábios – Bem sem graça.

– Eu não estava preocupada com ela. Por mim, eu a comeria e acabava com este problema, mas… Eu sei que não pode. – A Dragonesa deu os ombros, indiferente. – Foi… Intenso. – Kraz arregalou brevemente os olhos. – Ele é… Carinhoso… Mas também é… Ávido. De repente, ele não tinha mais medo algum de mim. Tocava-me, sentia-me… E então acabamos sem roupas em um quarto. – Ela mordeu o lábio. – Aconteceu muitas vezes. Eu queria mais, mas… Eu acho que consegui cansar um lobo. Eu achei o sexo uma coisa fantástica. Como… Ver fogos no céu… Ou uma fogueira crepitando.

Os relatos dela eram de sensações bem conhecidas pela Garou, mas surpresas vinham junto. Cansou um lobo. Nyra ergueu as sobrancelhas e escutou com atenção.

– É uma coisa incrível mesmo. Mas só para quem é bom nisso ou é a pior coisa na terra eu tenho certeza… Embora nunca tenha tido uma noite realmente ruim. – Fez uma pausa pensando – Você era virgem, Kraz? Gaia… Donald deve ter sido muito bom para você. Que safadinho… – Sorriu risonha – Você teve o melhor do sexo, então…

– É, eu acho… Bem. – A Dragonesa também riu, mas tímida. – Eu não sei se eu era virgem ou não. Eu acho que sim. Eu não lembro de muitas coisas… Então… – Ela pensou, olhando para o céu. – Ele cantou para mim. Senti-me calma. A voz dele acalma. Fez-me carinhos… Contou-me sobre a vida dele. A parte mais estranha foi conversar, mas só no começo. Eu não costumo conversar com estranhos… Mas foi fácil depois também. Ele parece incomodado pelo fato de ser casado. Isso é um pouco ruim. Ele tem um coração bonito. Cheio de amor. Eu consegui sentir isso.

É verdade, Elara costumava os dar a primeira experiência. Nyra escutou o relato com grande atenção e curiosidade. Seu sorriso crescia conforme ela se abria… A Theurge riu e quis apertá-la de tão sincera que ela se demonstrou.

– Ele conversou e cantou…? Que gostoso de imaginar, Kraz. Eu estou feliz que tenha sido tão bom… E ele tenha conseguido te fazer conversar. – Riu – Não sabia que o Donald teria jeito com você no final. – Mordeu o lábio. – Ele tem um ótimo coração, e é bem controlado… Acho que ele deve ter jeito com mulheres difíceis. – Considerou a hipótese, já que ele havia lidado por muitos dias com a Theurge em condições estressantes. – Você acha que ele não vai te ver de novo? – Observou-a. – Eu sei que o relacionamento dele com a esposa não é nada legal. Talvez você possa mudar a mente dele sobre muitas coisas…

– Ele foi bem especial… – Krazugnis concordou, encolhendo-se brevemente ao sorrir. Um sorriso que não durou. – Eu não sei. – Ela sussurrou, incomodando-se. – Eu acho que vou me sentir bem triste se ele não vier… – Sorriu, mas novamente não manteve o gesto. – Eu espero que sim…

– Bem… Melhor o dar um tempo… A esposa dele não vai ficar perto, e ele vai ter que pensar, caso esteja tão incomodado. Mas tenho certeza que ele vai pensar em você com carinho… Com certeza vai te chamar… – Tocou-a na mão e a beijou no rosto – Eu odeio expectativas. Você me deixa atualizada, tá? – Respirou fundo e observou o mar brevemente – Vocês todos estão me deixando um pouco doida, sabe. Só vão atrás do mais difícil…

Apesar de não ter tanta certeza assim, sorriu e deitou-se na coxa da Theurge. – O Coração é complexo… – Ela sussurrou. – Bem… Mudando de assunto. Eu não quero te preocupar, Nay, mas… Nate está bem triste. Eu o senti triste em diversos momentos nessa noite.

Nyra mudou seu ar curioso para um preocupado. – Ele estava…? – Perguntou, pois não havia percebido e costumava reparar em tudo. – Deve ser por causa da família dele… – Tocou-a em seus cabelos ruivos e fez um breve carinho. – Aí, eu nem reparei… Odeio saber que ele está assim… E que ele não me disse… – Fitou a cabine brevemente. – Acho que vou voltar com você.

A Dragonesa concordou, endireitando-se. – Ele não quis ser percebido… Talvez. Não diga que eu te contei. – Ela aconselhou antes que oferecer a mão à Garou.




Camiseta sem mangas, preta, lisa e justa em tecido dry fit, short jeans até os joelhos e um tênis Puma preto de cano alto. Ladirus se encarou, em dúvida. Provavelmente, essa será a segunda decisão maluca hoje e o meu dia mal começou. Ele vestiu um boné preto com o brasão dourado da casa Targaryen da série Game Of Thrones e olhou-se de novo. Se eu fosse menos bonito, eu teria menos problemas? Provavelmente. Não tinha tempo sobrando para fazer a barba mal feita. Ladirus se coçou, refletindo. Elara havia pensado em tudo quando os criou, ao que parecida. Corpos exóticos, perfeitos e terrivelmente atraentes. Ladirus havia descoberto proporções com Fayre que nem imaginava que tinham sido pensadas em sua composição, o que era curioso de que pensar. O que Elara queria, afinal? Ele evitava pensar sobre as questões ainda sem resposta, mas às vezes, era impossível não se ver pensando.

Fayre. Ele gostava muito de Fayre. Esperava que o detalhe que discutiria com ela na relação que mantinham não os afastasse, pelo menos. O sentimento esquisito de pose permitiria? Esperava que sim. Não se sentia com dúvidas de que estava seguindo o coração que batia forte dentro do seu peito e a decisão lhe soava certa – ou quase. Tocou-se sobre ele, sentindo-se. Tinham combinado com Ártemis de se encontrarem fora da ilha, no ponto de ônibus que os levaria para a cidade da mixórdia. Ladirus melhorou na Penumbra e saiu do castelo para adotar a sua forma original. O imenso Dragão de Água bocejou, lançando-se no ar em um voo planar, já que não possuía asas. As suas patas ligadas por membranas e as suas escamas azuis muito lisas eram feitas para nadar e ele o fazia no ar, ondulando o seu corpo como um crocodilo.

Apesar quando se viu do outro lado, ele reassumiu a forma hominídea, espiando antes de sair para a Penumbra. Ainda era de manhã e poucos carros passavam pela estrada. Ele vestiu óculos escuros aviadores e começou a caminhar em direção ao ponto de ônibus.

Os lábios estavam pressionado até avermelharem, pois Alicia não sabia fazer outra cara naquele momento. Seguia Ártemis com os olhos curiosos e receosos também. Não sabia bem o que dizer. Chegara no quarto a tempo de ver o beijo. Deveria dar uma bronca? Nem conseguia. Ladirus era um homem lindo demais! Meu Deus! O homem parecia um Sidhe. Mas eu também beijei um homem lindo. Queria parabenizá-la, mas também não se permitia. Ele saiu ontem com a Fayre! Deus…

– Arty… Hm… – Ela franziu o cenho. – Você vai sair…?

– Eu pareço que vou ficar aqui, Alicia? Quer dizer… Até poderia… Precisa andar arrumada por aqui. – Ártemis a olhou por cima do ombro. – Mas… Eu vou sair com o Ladi, né. E… Eu sei… – Fitou-se no espelho, arrumando a roupa com um ar de confiança, mas de repente completamente insegura, murchando sozinha… – Mas foi você quem disse que eu deveria insistir… – Convenceu-se  e arrumou a postura de novo – Espero que… Ele me queira de verdade… Ele disse que me queria… E iria terminar com ela, se eu quisesse ficar com ele de verdade… – Virou-se para a amiga. – Você acha possível? Eu senti que sim…

Analisando-a, Alicia concordou após refletir brevemente. – Eu arriscaria no seu lugar… – Arriscaria mesmo. Ladirus era digno de um risco. Compreendia a amiga. – Eu achei que não iria dar em muita coisa. A Fayre não sai do pé dele, né… E ele de repente aqui. Se ele veio até você, melhor descobri. E… O beijo… Foi bom?

– Não fala o nome dela aqui. Eu sei lá como esses magos agem. – Reclamou, terminando a maquiagem para o dia. Ajeitou o tope branco, tocou os próprios seios e depois abaixou a mini saia jeans que vestiu. O salto alto branco foi colocado por último, e os cabelos começaram a ser penteados de novo. – Foi ótimo… – Fitou-a nervosa ao confessar. – Foi … Melhor que eu imaginava… E ficou tão insano, de repente ele estava em cima de mim, e eu toquei aquele corpo. – Fechou os olhos com força ao se recordar – Forte… Deu para ver todas as cores da tatuagem… Fiquei tão rendida que se ele me pedisse em casamento eu aceitava. Mas… O pior… É a voz… – Olhou-a com certa urgência para relembrar do detalhe, chacoalhando suas mãos: –Dizendo que queria ficar comigo. E ele não parava de falar, Alicia. Meu coração quase não aguentou. Mas! Não saiu impune… Completamente…  Acertei todos os travesseiros nele, juro. – Afirmava com veemência.

Conforme ela relatava, Alicia começou a rir de imaginar todo o sufoco e calor. Não tinha ouvido muito a voz do Dragão, mas o suficiente para guardar na memória  a voz bastante única. – Ele tem uma voz sexy mesmo… E fala com muita calma. Bem pornô. – Ela cobriu os lábios, rindo e negando com a cabeça. – Pelo menos, você se lembrou te tocar aquele corpão. Ah! Para onde vão…? E ela? Isso parece ótimo e bem confuso, Arty…

– Nós vamos no festival de verão de Saurgate… Não é nada… Tão sofisticado assim, mas é divertido e um pouco romântico. – Disse, dando de ombros – Aquelas fadas vão ficar tudo de olho no meu Dragão, mas pelo menos ele vai comigo, e eu vou poder exibir também. – Confessou com um sorriso enorme ao final – Ele ficou bem entusiasmado de conhecer um pouco sobre mim. E a nossa natureza. Eu achei um tanto legal! Mas… Vou ter que tomar cuidado para não assustá-lo. Nosso povo é meio fora da caixa. – Vagou o olhar pelo espaço brevemente e lembrou-se do perfume. – Ela quem…? – Perguntou impaciente – Bem, eu não sei… Acho que ele vai resolver isso no final do dia… Mas ele estava decidido… A ficar comigo. – Apertou os lábios grossos e bem desenhados – Isso não parece um teste drive.  – Suspirou um pouco nervosa e também confusa. – Eu espero que não. Mas… Eu podia confiar nele. Acho que estamos meio que juntos já… Sabe? Ele disse que pensou em mim a noite inteira… Que queria estar aqui e não lá. Parece muita coisa.

– Sim. – Alicia concordou. Bem confuso. – Ele veio até aqui, falar contigo e se declarar, vai sair com você… – A morena comentava, penteando os cabelos com as mãos. – Às vezes, ela foi uma coisa carnal. Eu tive uma coisa carnal ontem e… Não avancei muito, né… Embora, ele fosse um homem perfeito. Parecia um Sidhe! Mas eu acho que sei quem ele é. Fiquei esperta, mas tirei as teias de aranha da boca. Fazia tempo que eu não beijava tanto. Safado… Logo fugi. – Ela inspirou, negando. – Eu estava no vilarejo com a Nikki e as meninas. Foi engraçado. Ouvi tanta e tanta fofoca! Bebi… Eu vou te mandar umas mensagens te contando. Um monte de babados nesse Solstício, Arty… – Ela arregalou os olhos. – Eu acho que vou voltar pra lá, então. Se você ver a Leah, confirma que eu vou amanhã? Parece que geral vai para a Click.

Ártemis a escutava, mas se esforçava. Estava tão concentrada no próprio evento, que quase não deu bola para a amiga.

– Aliás. Você não me vem com essa história, porque você me traiu. – Apontou acusatória – Eu te trouxe para ficar comigo, me trocou por um safado qualquer. – Estreitou os olhos e assentiu devagar – Tudo bem… Vou espalhar a palavra da Click amanhã. Leah é outra que vai me agradecer para o resto da vida. Bem… Eu vou indo… Me deseje sorte. E antes… Me diga se estou bem… – Deu uma volta.

– Leah é legal, Arty. Sabe. Dizem que ela canta bem mesmo, viu? Essa história de grupo de meninas, você devia pensar… – Em mim também. Erguendo-se, Alicia analisou a amiga com a frieza de uma estilista. Ela se tocou sobre os lábios. – Algo no pulso talvez. Você vai para chamar a atenção mesmo, garota. Cuidado com o seu Dragão… Você devia avisar… Eles vão sentir e talvez fiquem com medo… No começo. Vai qu-

– Eu já estou pensando! Vou passar essa noite ensaiando… – Ela disse, e se havia considerado alguém, não disse naquele momento. O foco mudou completamente com a cena a seguir.

A porta se abriu e Iliya entrou.

Alicia deixou o queixo cair e endireitou como um gato que levava um choque.

– Ah. – O Garou franziu o cenho, entreabriu os lábios por um instante e prosseguiu com a sua voz marcante e grave, sussurrando. – Vocês… Sabem onde Lavinia está? Eu estou com um problema… E eu acho que ela jogou alguma coisa Blackwood para ninguém seguir o seu rastro… E eu… Acho que ela está com o meu companheiro de Alcateia e isso está… – O Garou inspirou profundamente. – … Sendo um problema. Vocês são amigas dela, não sei? – Ele passou a mão pelo rosto, nervoso. – Aisha não está no castelo… Eu… – Ele se voltou para Alicia.

Um homem daquele tamanho fugindo como um rato foi até curioso! Ártemis ajeitou sua postura e o encarou intrigada um segundo, mas também não tinha tanto tempo embora gostasse de saber mais. Especialmente do caso de Alicia com aquele homem… Pois olhando-o de perto, confirmou que se tratava do Garou. E era até bonitinho mesmo…

– Sabe, eu podia estar me trocando. Nada educado, Iliya. – Cruzou os braços e negou maldosa – Mas… Talvez eu saiba dela e da Aisha. Por que um problema? Estava todo mundo se divertindo ontem a noite, até onde eu lembro…

Os altivos olhos do Garou se voltaram para Ártemis. Cautela com esta, lembrou-se. Convidada dos Versos da Magia. Eu não queria ter cautela alguma com essa. O olhar foi o mais polido que conseguiu. – A noiva do Mylo está se estressando e se alguém acabar falando o que não deve para ela, será um problema. Ela é uma Blanc.

– Blanc? – Alicia o olhou, tentando se mostrar indiferente.

– Parente importante. – Ele respondeu. – E a esposa do Don. Eu sei, é o Solstício de Verão e tudo acontece. Só que ninguém precisa ficar sabendo demais, da?

– Mylo saiu do vilarejo de mãos dadas com a Vinny. – Alicia se voltou para Ártemis. – Ninguém deve estar pensando nada mesmo.

– Que safados… ! É a Daisy e… Uma moça bem normal, né? – Disse sem censuras, estreitando seus olhos escuros com um meio sorriso. – E você está acobertando seus amigos… Hm.
A Changeling cruzou os braços às costas e caminhou para o outro lado, rondando como felina, e pensando se deveria dizer algo ou não.

– Talvez… – Enrolou para falar, olhou para Alicia e demorou-se, e fitou Iliya finalmente. – Se eu te disser que sei onde estão, isso salvaria o seu dia e principalmente o deles… Eu acho? Fico apenas com dó das meninas… – Murmurou – Não imaginava que eles tinham ido tão longe…

A expressão de Iliya se transformava para a descrença. Ela estava mesmo brincando com ele? Moreninha abusada! Ele avaliou a situação rapidamente e assumiu a sua desvantagem:

Da. Eu sei que eles tão estão certos, mas não é tão… – Ele moveu as mãos pelo ar, buscando as palavras certas e não encontrando-as. – Olhem. Kyna e Daisy são mulheres encantadoras… – Mentiu. – Mas Mylo e Vinnie têm uma história antiga. Meu companheiro de Alcateia nunca se animou com uma mulher como era com ela. Um casal até que irritava de tão bonitinho. – Lembrava-se. – Mas o Mylo cometeu um erro e eles se separaram… E o se o meu amigo se acertou com ela e quiser chutar o pau da Sociedade Garou, eu vou apoiá-lo.

– Mylo traiu Lavinia com a Aisha. – Alicia se voltou para Artemis com o ar superior de quem detinha a informação preciosa, cruzando os braços. – Deve ser um safado! Por que foi se meter com a Daisy Branc, então?

– A vida seguiu. – Iliya estendeu os braços. – Vinny não o quis mais e agora ele sofre muito mais pressão já que… É da família real. Ele não está apaixonado por Daisy, posso afirmar.

Escutou a história apenas pela informação, entreolhando-se com Alicia o tempo inteiro. “Mylo traiu Lavinia com a Aisha”, que mal gosto. Franziu a testa e riu, Alicia não perdia informações também.

– Bem… Eu vou usar meus poderes para te ajudar então… Porque você parece se importar muito com seus amigos e isso é legal. Mas… – Ártemis voltou a cruzar os braços – Vou apenas te informar que somos Kithain… Ou fadas… Como seu povo nos chama… E gostamos de presentes em troca de truques, tá? – Informou-o com seriedade – Algo como má sorte se esquecer disso. – Ártemis afastou um passo e fechou os olhos um segundo, moveu seu glamour rapidamente e fitou o Garou com atenção ao terminar:

– Mylo e Lavinia estão na casa da Blair Valerius. Don está no vilarejo que tem nessa Ilha. Para lá…

Iliya ainda processava a informação sigilosa nas mãos das fadas enquanto ouvia Ártemis abusar do poder que tinha em suas mãos mágicas. – Eu vou pensar em algo para retribuir… – Disse-lhe, assentindo. Casa da Blair Valerius. Não era muito longe da casa da fonte, então… – Alicia. Por favor… Vocês duas. Eu não sei onde ouviu isso, mas não espalhem…

A fada assentiu vagarosamente. – Ouvi da Vinny. – Disse com tom de quem não via como poderia ser tão grave assim que soubessem. – Mas tudo bem. É chato mesmo.

Da. Bem chato. – Iliya concordou. – Tudo que acontece no Solstício de Verão, fica por lá… Tudo bem?

Alicia franziu o cenho…

– Obriga-

Alguém batia na porta. O Garou quase sentiu o coração parar com o susto. Alicia se entreolhou com Ártemis, sem entender por um instante, mas franzindo o cenho ao sentir aquela energia poderosa.

– Dragão. – Sussurrou Alicia.

Ártemis franziu a testa para o comentário, mas logo aceitou, pois também queria esquecer do Solstício por outras razões. Checou se estava tudo bem pela amiga antes, mas não teve tempo, a porta bateu e seus celular começou a notificar com sons sem parar. Ela primeiro foi até o aparelho curiosa e apenas checou muito rápido… O que ele fez? Segurou o celular velho entre os dedos e o viu travar de vez, e nem conseguiu ler os comentários. Seus olhos se voltaram para porta enquanto tentava reiniciar o aparelho e a abriu sem nem pensar na informação, completamente distraída.

– É melhor você ir logo. – Disse a Iliya e virou seu rosto para encontrar Ross. Sua expressão foi de surpresa a tédio completo. Ela saiu e fechou a porta atrás de si como se estivesse escondendo algo no quarto. – Pois não? – Perguntou com o olhar pelo chão embora o rosto erguido.

Ele ainda estava de roupão. Uma peça de seda negra e longa e um chinelo confortável preto. Os grandes lábios corados estava entreabertos e as sobrancelhas escuras, arqueadas. Ele achou particularmente curiosa a tentativa de Kithain em simplesmente fingir que não tinha um lobo em seu quarto e o bom humor matinal de Rosstrider se dissolveu aos poucos.

– Tem um cara no seu quarto? – Ele sussurrou com uma voz indignada, estendendo os dedos diante da face dela. – Eu vim ate chamar para tomar café… – E olhou-a. – Você estava com um cara no seu quarto vestida assim?

Ela o mediu rapidamente e parou em seus olhos de novo.
– E você acha decente ficar andando assim pelo Castelo? – Retrucou irritada – Até onde eu lembro tinha uma loira no seu pé ontem, tá? E tem um no meu agora. – Ela deu de ombros e começou a caminhar devagar. – Não posso fazer nada, sou popular agora. – Ela sorriu e mostrou a tela do celular com milhares de notificações ainda subindo.

Rosstrider foi tão cínico que pareceu tentar se lembrar da tal loira. Ele estreitou os olhos escuros, desenhando um sorriso de escanteio, apertado e irritado. Homem que você vai largar aí dentro? Sei. Com o mesmo passo devagar, segui-a. – Eu estava sendo educado. – Comentou com um ar notório. – Eu acabei de sair do banho e vim aqui correndo te ver, mereço mais que uma amostragem da sua fama online ancorada nas celebridades a ilha. Né?

Ártemis reparou naquele cinismo e negou lentamente, enciumada, mas apenas demonstrando revolta do abandono. Parou de andar quando ele começou a falar de novo.

– Eu vou me apresentar para um empresário em breve, ouviu? Vou ser famosa por conta. Eu ganhei um violão e estou aprendendo a tocar. – Brigou – Merece o que mais? – Colocou as mãos na cintura – Você me deixou sozinha no Solstício, ‘tá? Podia ter sido educado comigo, mas isso é sempre muita coisa para pedir parece. E… Eu não vou tomar café com você.

– Sei… – Ártemis o olhou abaixando os braços das mãos pousadas na cintura. A morena até pareceu tentada em aceitar, mas recuou ao engolir o ar e negar: – Não posso. Eu vou sair agora, não me arrumei para tomar café. Estava mesmo de saída. – As palavras eram pouco educadas mas ela as pronunciava com calma, como se o vocabulário já fosse parte dela. – A gente toma amanhã e eu mostro como fiquei realmente talentosa. – Disse animada com o assunto – Foi o Jullian que me deu o violão, Ladi que está me ensinando a tocar.  Mas Aisha disse que eu não preciso saber nada tão bem para fazer parte de uma girlband, eles ajudam em tudo. – Franziu o nariz – Mas eu sou talentosa de qualquer forma.

– É, você não precisa ser igual a todas elas… – Ross comentou levemente aéreo, pensando nos indivíduos citados. Jullian quase havia assassinado Ártemis no passado, se não fosse por Nyra. Ladirus vivia entre os Versos da Magia e era talentoso demais com qualquer instrumento musical… – Se você está em tão boas mãos assim, tudo bem. Eu aguardo o seu retorno, então. – Inspirou. – É aquela… “coisa de fada”? O evento que você comentou comigo… – Ele estreitou os olhos. – Nenhum lugar perigoso?

Ártemis sorriu sem graças mas tentou, não esperando que ele lembrasse do evento.

– Sim… Festival de Verão, perto da minha Mixórdia… Vou ficar pela região só… No Sonhar um pouco, talvez. – Negou rapidamente e entrelaçou dedos das mãos uma na outra, ficava um pouco ansiosa quando pensava na companhia de Ladi e nem podia dizer – Você não precisa se preocupar. É só meu pessoal. Coletar glamour, rituais e essas coisas. Eu não podia perder a chance de ir com as roupas que ganhei da Nyra. – Apertou os lábios – Você avisa o Connor se ele perguntar, ‘tá? Tá nem aí para mim também mais.

– Você sabe que isso não é verdade. Connor morre se algo acontecer com você. E eu morro junto. Acredite ou não, Tay vai morrer também. – Rosstrider faz um beicinho com os lábios cheios. – Parece um evento interessante, mas… Eu sei que você não vai me chamar. – Ele estreitou os olhos, caminhando para ficar de frente para ela. – “Seu pessoal”… – Repetiu com humor. – Qualquer problema, pode me chamar. Eu vou voando até você. – Ele tomou o rosto dela em suas mãos e deu vários beijos seguidos e barulhentos na bochecha da Kithain. – Comporte-se, Arty.

– Tayrou? Vai morrer de felicidade só pode. Aposto que deve ter comemorado meus dias longe de casa. – Disse com birra, mas logo sorriu – Eu sei que vai. Mas vai ser tudo tranquilo. A loucura de sempre. – Com certeza não seria, mas a ideia ainda era positiva. Ela riu com os beijos e retribuiu outro em seu rosto. – Eu sou um anjo, você sabe, as outras pessoas que me irritam. – Abraçou-o apertado antes de o fitar por alguns instantes e então seguir com passos apressados, já estava atrasada.

Anjo. Rosstrider retribuiu o abraço. Um anjo mentiroso. Ele sorriu, mas estreitou os olhos enquanto a assistia se afastando. Espero que pelo menos não seja nada grave. O Dragão de Metal franziu o cenho e passou a caminhar em direção ao merecido café da manhã.




Apoiando no ponto de ônibus, Ladirus mexia distraidamente no celular. Estava entretido com as stories que algumas pessoas tinham feito no dia anterior enquanto pensava sobre como a Goetia encarava a exposição de felicidade. Aisha havia feito uma há pouco tempo filmando um gatinho à venda em alguma loja que Ladirus não conhecia. Ela obviamente não filmou Acksul, mas reconheceu o riso e a voz cheia de sotaque do irmão dizendo “Eu acho que ele quer ser seu amigo”. Annik havia filmado Nyra e Veronica dançando. Nyra chocava a internet com selfies e vídeos. O que a Goetia pensa disso? O Dragão franziu o cenho. Ártemis… Cadê você? O assunto mudou rápido em sua mente, como se fosse mais importante. Desistiu? Sentiu-se nervosamente perturbado de súbito e aliviou-se visivelmente ao vê-la.

Ártemis desceu do ônibus e o encontrou rapidamente com seus olhos. A Kithain abriu um enorme sorriso e andou apressada até o Dragão. Sem se conter, abraçou-o e o beijou no rosto, e depois de pensar um segundo, nos lábios.

– Aconteceram algumas coisas! Obrigada por esperar. – Ela disse educada e cheia de doçura, como nem era costume de se ver a Changeling. – Calma, vem. – Ela viu um ônibus melhor virando outra rua – Corre. Rápido! – Ela o agarrou pela mão e correu para a esquina comercial com velocidade, mesmo sobre os imensos saltos que usava. Ela o levava na mão, desviava de grupos de pessoas comuns, e conseguiram alcançar somente porque uma senhora havia dado o sinal por engano. Ártemis subiu rápido no intermunicipal e ajeitou os cabelos negros os prendendo alto em um rabo de cavalo. Calor. Mas ao menos tinha ar condicionado. Seus olhos iam até Ladirus o tempo inteiro com sorrisos, pagou para o motorista com um bilhete e andou até o último lugar do transporte quase sem ninguém. Os poucos que estavam, os olhavam com atenção pela beleza dos dois seres.

Nem houve tempo para Ladirus apreciar o beijo e admirar o sorriso dela. De repente, estavam correndo. O Dragão de Água a seguia sem entender o porquê da pressa. Quando entraram no ônibus, estranhou tudo. Puxou a carteira do bolso e folheou as notas altas. O motorista o olhava com descrença e hostilidade, fitando a carteira. Ladirus suspirou, encontrando uma nota menor e pagando a sua passagem.

Era estranho. Tudo estranho. As pessoas o encarando diretamente o fez se sentir exposto até demais e questionar se percebiam a sua natureza. Pessoas normais até demais. Ladirus caminhou devagar, sentando-se ao lado de Ártemis. Os olhos pequenos rondaram ao redor, reparando nos detalhes mais simples do ônibus. Duas meninas sentadas nos bancos postos aos dele encararam e soltaram risinhos entre si. Ladirus inspirou, voltando-se para Ártemis com um sorriso selado.

– Diferente. – Comentou, finalmente podendo reparar nela com mais calma. O Dragão de aproximou, buscando por um selinho vagaroso.

Ártemis percebeu a carteira dele quando andaram e pressionou os dentes aflita. Sentaram-se e notou que ele estranhou tudo… As pessoas só pararam de olhar quando entenderam que já haviam feito isso demais. “Diferente” não significava ser bom, mas o beijo logo a trouxe alívio. Seu corpo estava quente do Sol, e logo do beijo e da sua coxa que se encostava a dele enquanto sentados. Ele estava lindo… E reparou nisso ao fitar suas roupas. Até as dela estavam bem sofisticada, mas tinha certeza que ele nunca havia caminhado por aqueles lugares comuns. Péssima ideia?

– Eu não me toquei… Eu estou acostumada a pegar esse ônibus e você tem dinheiro para um táxi. – Explicou-se – Não é lugar para alguém que lançou um single ontem. Mas o festival é bem divertido.

O sorriso dele se alargou até se transformar em um riso. – Tudo bem. – Ele franziu o nariz, observando janela afora. – Eu não ligo. Só é diferente mesmo. Eu estou muito mal-acostumado. Eu tenho vontade de sair caminhando por aí, conhecendo o centro como alguns dos meus irmãos fizeram. Acksul, Nina e Rhistel conhecem tudo. Eu não conheço quase nada. – Ladirus mordeu o lábio e voltou a olhá-la. – Você está linda. – Ele inspirou, descendo o olhar até os lábios cheios e chamados. – Se eu te beijar agora como estou com vontade, será um atentado ao pudor? – Sussurrou.

A resposta a trouxe alívio, embora ainda não tivesse certeza se ele deveria estar ali. Mas foi fácil distraí-la, a Kithain sorriu e o tocou no braço… Se seria um atentado? Com certeza, dada a última vez que se encontraram no seu quarto. Ártemis o beijou em selinhos, e arriscou um beijo mais profundo antes de falar:

– Acho que podemos tentar não cruzar a linha até ser crime. – Brincou e beijou-o em novos selinhos, mas não conseguiu se manter na troca de carinhos quando as meninas olhavam para trás a todo tempo. Ártemis se agarrou ao braço do Dragão e resolveu falar sobre o caminho, roubando selinhos a todo instante.

Saurgate era uma cidade muito menos movimentada e quase próxima do rural. Foi uma viagem longa, de mais de uma hora, mas a Changeling foi contando sobre sua Mixórdia Pedra do Lagarto e os integrantes que a compunham. Que ainda estavam imensamente felizes em ajudar os Versos depois da generosa doação recebida para revitalizar o parque local. Também explicou sobre a essência da sua natureza e as reencarnações, e como sua espécie era ligada aos sonhos e a necessidade do contato com os mortais. Ártemis falou bastante pois se sentiu confortável a falar até das fraquezas do seu povo… A banalidade e como, por conta disso, a Ilha a fazia bem e a deixava mais forte.

Quando desceram no centro de Saurgate, a cidade tinha uma arquitetura bem complexa e antiga, além de muitas estátuas curiosas de lagartos, que eram o símbolo local.

– É um tanto brega. Mas aqui tem lendas de homens lagartos. Eles amam isso. – Explicou, descendo no local movimentado. Haviam muitas barracas coloridas, pessoas indo e vindo com famílias, amigos, casais. Não estava lotado, podiam transitar livremente, e não pegar filas. Mas parecia que a quantidade de pessoas era o suficiente para uma boa energia ser gerada e deixar a Changeling até mais bonita. Como se seus cabelos estivessem mais brilhosos e seus olhos mais iluminados. Ártemis apresentou uma forte essência acumulada, o que não era necessariamente saudável, mas outros Changelings já estavam acostumados.

Enquanto adentraram, não foi difícil novamente chamarem atenção. E ela estava bem abraçada ao Dragão ao andarem em direção a uma barraca que vendia pipocas de tantas cores e tamanhos quanto possível. O queixo de Leah e outros Kithain caíram de imediato. Ártemis acenou e se aproximou.

Ele se animou mais assim que chegaram, observando ao redor com olhos desejosos do saber e conhecer. Ouvia-a calado e muito atento, fazendo perguntas inteligentes e observações curiosas. Sentia-se diferente no local. Talvez fosse a sua natureza mágica? Não soube dizer. Apreciava ter Ártemis perto de si, caminhando com ela e admirando a sua beleza única, unida à cativante simpatia.

Como não parecer hostil? Ele sentia os olhares e alguns o faziam se sentir caminhando sobre quatro patas fortes, meneando o a sua cauda longa e respirando com narinas imensas. Por Ártemis, parecia que estava tudo bem. Não está tudo tão bem assim, sentia. Ladirus encarou Leah e sorriu de escanteio. Estava curioso sobre eles e não queria que acabassem sentindo medo ou algo parecido.

Ártemis calculou que chamaria muita atenção, mas não tanta. Quando o Sonhar se demonstrou mais forte naquela área, e fitou Ladi, enxergou o que os outros Changelings enxergavam: o espectro de um imenso dragão com sua sombra projetada no chão. E era grande, muito grande. Leah conseguiu ver o rapaz sorrindo, e ela o fez de volta, mas com tanto medo que foi possível não notar seu receio.

– O que foi filha? – Perguntou seu pai enquanto servia um cliente, teve a impressão que Leah se esconderia atrás do balcão.

– Ártemis…

– O que tem? Ah! Veja só, ela veio. Que bonita ela está.

– O rapaz com ela, pai, é um Dragão…

– Nossa! – Ele se surpreendeu, mas não enxergava nada do que os Kithain viam. – É um rapaz bonito.

– Pai… – Leah tentou não se focar no espectro, e sim em Ladirus quando estavam finalmente ali.

– Oi, Arty.

– Oi, Leah. Esse é o Ladi… – A Pooka disse como se nada estivesse acontecendo.

– Oi, Ladi… – Leah disse, acenando de onde estava. – Que coisa… A última vez que recebemos um Dragão no festival… Faz tempo… Eu era uma criança… – A Changeling lembrou que também havia terminado em tragédia.

– Oi, Leah. Prazer em conhecê-la. Foi… Tudo de repente mesmo. Talvez eu devesse ter anunciado a minha chegada… – Ladirus comentou, timidamente.

– Faz. Mas, deixa de ser boba, o Ladi não é uma Quimera. – Explicou, e Leah achou que a situação só piorou. Real?! – Ele é como um… – Encostou-se no balcão para sussurrar para ela – …Metamorfo.

– Sério? – Fitou o Dragão, sem saber se ficava mais tranquila. – Desculpa… Dragões são… Sempre inesperados…   – Fitou Arty. – Eu acho melhor você avisar o Ícaro, ou vão achar que você veio devorar a todos.

– Ok… – Ártemis mordeu o lábio e fitou Ladirus. – Você pode esperar um minuto aqui com a Leah? – Pediu – Eu vou avisar nosso líder.

Leah não tirava os olhos de Ladirus… De onde Ártemis tirava essas coisas? Não tinha um evento que ela não aprontasse alguma.

– Eu acho que ele é o menino das fotos que você me mostrou, Leah. – O homem simpático estendeu a mão para cumprimentar Ladirus com um forte aperto – Pode me chamar de tio Chris.

– Vo-Você quer um refri, uma pipoca? – Leah perguntou apressada, convencida de que não queria irritar nenhum pouco o Dragão, e eles costumavam exigir boa recepção.

Deveras, não estava acostumado com tanta atenção assim. Os olhos pequenos e puxados do Dragão de Água rondavam o ambiente, encontrando a todo o momento olhos receosos, amedrontados e alguns poucos curiosos. Será que vão me expulsar? Ele se voltou para LeahNão terão coragem. Estou sendo mal-educado em vir? Ele piscou os olhos escuros vagarosamente, após assentir para Ártemis. Sentia-se meio perdido.

A amiga da fada era particularmente linda e ele a admirou despido de malícia. Parecia uma moradora do Luar do Oceano com os seus marcantes olhos claros, pele pálida e cabelo preto. Uma voz muito firme também, Ladirus observou. O Dragão apenas se desviou quando foi finalmente cumprimentado devidamente:

– Olá. – Ladirus respondeu, esboçando um simpático sorriso selado. – Foto? – Ele franziu o cenho, estranhando. – Ah, eu não tomo refrigerante, mas aceito a pipoca. Leah, né? – O Dragão de Água cruzou os braços, voltando a observar o ambiente. Se ficassem olhando para mim assim, será meio esquisito. – Eu vou tentar não fazer nenhum movimento brusco. – Brincou.

– Ok. Eu já volto! Fica aqui tá, Ladi? É rápido. – Ártemis disse e saiu correndo.

– Tudo bem. – Ele respondeu, observando-a ir.

Leah apenas teve a sorte de seu pai ser extremamente sociável, e isso pareceu tranquilizar um pouco o Dragão.

– Uma pipoca saindo então. E ah! Tem suco.  – Chris começou a encher um saquinho.

– É… Você tem algumas fotos no Instagram da Nyra Blackwood. Ela fez uma live ontem sobre a banda Heathens, você está nela, não é? Desculpa perguntar… Não tem muita informação na Internet. E desculpa o meu nervosismo também! Eu só estou… Pouco acostumada com… Dragões… – Mas esse parece até racional. Ao menos não tinha aquele sorriso insano que a trouxe muitos pesadelos quando ainda menina. – E… É que… Dá para ver sua forma original… E você é imenso. – Confessou.

Embora estivesse em um uniforme cafona, com o cabelo preso por detrás do fecho do boné rosa, camisa polo amarela clara com o logo em rosa, e um short jeans, era difícil apagar a imagem bela da Kithain. Ela estava bem maquiada, com delineador marcante, destacando seus olhos de pedra, e um nude nos lábios cheios. Leah tinha um piercing de argola na narina esquerda, o cabelo longo e de um negro completo. Seu corpo tinha curvas bem acentuadas, mesmo por detrás do uniforme antigo. Tudo o que ela vestia era bem simples, como seu all star velho, e de baixo custo. Mas era vaidosa como podia. Dinheiro era um grande problema na sua família, e mesmo assim estava ali, vendendo pipocas em um preço quase de graça, somente para ajudar as crianças de baixa renda a terem um pouquinho do gosto do Sonhar. Seu pai era um humano, mas consciente de tudo isso, e ajudava na causa.

A estranheza passou por seus olhos antes da compreensão chegar. A live da Nyra… Ele nem havia visto. Somente se lembrava de ter feito algumas caretas engraçadas e fazê-la rir. Não estava acompanhando a vivência do single. Somente sabia que quem breve gravariam um videoclipe com várias pessoas da ilha com os rostos pintados. Talvez devesse checar essas coisas. Não havia refletido melhor a respeito dos impactos. Sabia que Aisha também havia divulgado alguma coisa. E Aisha era muito famosa. – Sim. Eu sou o baterista da Heathens. – Estranhou-se em dizer. – Ainda não estou habituado a ser reconhecido por isso. – Ladirus coçou atrás do pescoço. – Eu nem sei como está a situação do meu single. O meu irmão controla essas coisas, eu acho. Você me deixou tímido agora. – Ele riu, abaixando a cabeça e fitando o pai de Leah ajeitar a sua pipoca.

– Tem várias fotos no Instagram dela… Mas nenhum photoshoot ainda. Você vão se lançar em algo promocional? – Perguntou empolgada – Ou algum show? Ia ser legal ver mais da banda. Parabéns. – Ela riu ao percebê-lo tímido, achando curioso o jeito do Dragão de Água. Todo aquele homem. Aquele Dragão. Com aquela voz. Tímido! Sem aqueles estilos de rockstar-fake-forçado, como conhecia alguns.

– Eu não sei responder nada disso. – Ladirus acabou rindo, desviando o seu olhar do dela e abrindo um sorriso. – Eu sei, é… Meio estranho. – Ele olhou para o chão antes de encará-la novamente. – Eu gosto de tocar e não me importo se tem alguém ouvindo ou não. Meu irmão gosta de compor músicas… E ele canta muito bem, então… Ele pediu para eu participar. Eu deixei acontecer e agora parece que está… Meio solto da minha parte. – Franziu o cenho. – Ah. Nós vamos gravar um videoclipe com uma galera da ilha. Vai ser uma grande divulgação, parece… – Suspirou. – Eu não me sinto preparado para nada disso. – Riu. – Enfim… Você… Canta, né? Eu… Sua voz é bem limpa e cara, como a de uma cantora…

– A minha filha c- – Ele entregou a pipoca a Ladirus.

– Eu canto. – Ela disse firme, para interromper o pai de começar o discurso e logo se voltou a Ladi. – Eu faço covers, inclusive da Nyra. Eu tenho uma página no Facebook, e faço shows em casas… Já viajei para vários e vários lugares.  – Ela sorriu animada por ser percebida como cantora, e apoiou os braços no balcão se inclinando para frente. – É a minha paixão. Amanhã irei estar na Click… É uma casa famosa em Fox Town… Eu convidei a Ártemis, mas ela não tinha decidido se ia ainda. Vocês consideraram ir…?

– Ah… Obrigado. – Ele pegou a pipoca, pensando na proposta de Leah. Os olhos no Dragão se admiraram. – Bem… – Ele mordeu o lábio, soltando-o devagar. – Eu acho que vai todo mundo para a Click amanhã. Eu não sei de quem foi a ideia, mas nós estamos com alguns visitantes que virão embora e nós vamos comemorar a saída deles. – Ele abriu um sorriso antes de rir. – Eu sei. Não é muito educado… – Ladirus puxou a carteira e tirou uma nota de cinquenta dólares.

De repente a Kithain ficou muda e uma estátua que parou com o corpo inclinado no balcão e um sorriso paralisado. Seus olhos ficaram o fitando e a mente pareceu abduzida.

– Sério…? – Perguntou quase um minuto inteiro depois. – Não sabia… – Ela sentiu um forte arrepio pelo corpo e se afastou. Buscou o suco de laranja natural da geladeira, separado em garrafinhas de plástico e entregou a Ladirus. Quando viu a nota de cinquenta dólares, pareceu se esquecer o que fazia com o dinheiro. – Ah, eu não tenho troco… Enfim…  É só um dólar a pipoca… – Recusou o dinheiro negando com a mão. – Meu deus… – Franziu a testa e voltou a se apoiar no balcão. – Todos… De quem você está falando? Se eu… Puder saber… Isso é muita informação. Clipe, vocês na Click… Eu…  – Esse lábio mordido, que foi aquilo? Apenas se desprendeu da cena quando viu Ártemis voltando com alguns Changelings – Ícaro, o líder, Mariah, a segunda mais velha da Pedra do Lagarto, Joseph, o Troll imenso e com certeza o mais forte da Mixórdia, e por fim Suzana, a Sidhe curiosa. A Pooka andava ao lado do líder explicando e explicando, enquanto eles vinham com pressa, mas depois cheios de cautela.

– Grande e poderoso Dragão das profundezas abissais. É um grande prazer recebê-lo. Eu sou Ícaro Jakande. Líder da Pedra do Lagarto. – Ícaro se curvou quando parou próximo em um cumprimento extremamente formal e medieval. Era um homem velho, negro e com seus cabelos brancos. Apesar da idade, parecia ainda muito atento e saudável. Quando ele fez aquele gesto, os que estavam atrás copiaram, saudando Ladirus. Ártemis apenas desviou o olhar para o céu brevemente… O que ela disse? Leah só conseguiu pensar na história que Ártemis inventou.

De repente a Kithain ficou muda e uma estátua que parou com o corpo inclinado no balcão e um sorriso paralisado. Seus olhos ficaram o fitando e a mente pareceu abduzida.

– Sério…? – Perguntou quase um minuto inteiro depois. – Não sabia… – Ela sentiu um forte arrepio pelo corpo e se afastou. Buscou o suco de laranja natural da geladeira, separado em garrafinhas de plástico e entregou a Ladirus.

– As pessoas da ilha andam num clima festeiro ultimamente. – Ele bebeu do suco. Estava quente e não havia notado a sua sede.

Quando Leah viu a nota de cinquenta dólares, pareceu se esquecer o que fazia com o dinheiro. – Ah, eu não tenho troco… Enfim…  É só um dólar a pipoca… – Recusou o dinheiro negando com a mão. – Meu deus… – Franziu a testa e voltou a se apoiar no balcão. – Todos… De quem você está falando? Se eu… Puder saber… Isso é muita informação. Clipe, vocês na Click… Eu…  – Esse lábio mordido, que foi aquilo?

Em dúvida, Ladirus olhou para o nota e acabou a deixando sobre o balcão. Não tinha muita noção de dinheiro, mas vender pipocas a um dólar parecia bem pouco… – Eu acho que todo mundo. Nós temos um grupo… Que fica mais junto. Andamos bem unidos, apesar de tudo. – Pensou em Fayre e suspirou. – Annik e Nathan vão antes… O restante vai mais tarde, assim que os russos forem embora. É isso.

Ela apenas se desprendeu da cena quando viu Ártemis voltando com alguns Changelings – Ícaro, o líder, Mariah, a segunda mais velha da Pedra do Lagarto, Joseph, o Troll imenso e com certeza o mais forte da Mixórdia, e por fim Suzana, a Sidhe curiosa. A Pooka andava ao lado do líder explicando e explicando, enquanto eles vinham com pressa, mas depois cheios de cautela.

– Grande e poderoso Dragão das profundezas abissais. É um grande prazer recebê-lo. Eu sou Ícaro Jakande. Líder da Pedra do Lagarto.  –  Ícaro se curvou quando parou próximo em um cumprimento extremamente formal e medieval. Era um homem velho, negro e com seus cabelos brancos. Apesar da idade, parecia ainda muito atento e saudável. Quando ele fez aquele gesto, os que estavam atrás copiaram, saudando Ladirus. Ártemis apenas desviou o olhar para o céu brevemente… O que ela disse? Leah só conseguiu pensar na história que Ártemis inventou.

Ladirus estava chocado. Ninguém nunca havia o referenciado. Nem mesmo na União Lupina. Os olhos muito surpresos se demoraram observando cada um dos presentes. Ladirus apertou os lábios e se voltou para Ártemis. É, ficou bem mais esquisito ainda.

– Obrigado… – Respondeu, ajeitando o boné. – Vocês podem me chamar de Ladirus… ou Ladi.

– Não achávamos que existiam mais de um. Queria dizer “bem-vindo”, mas eu estou um pouco preocupado com a sua existência.

Ladirus se voltou na direção de Leah. Ao lado dela, um rapaz alto e pálido, com olheiras marcadas e olhar distraído estava apoiando no balcão. Um sorriso incerto amolecia os lábios rígidos.

– Dan. – O rapaz esticou a mão, cumprimentando Ladirus com um aperto de mão. Considerava muito difícil acreditar em qualquer palavra de Ártemis.

– Ártemis nos contou que você é um grande protetor do oceano que banha a cidade. – Ícaro esclarecia com um calmo sorriso. – Obrigado. Respeitamos grandemente quem tem cuidado com a natureza. E também que é um grande aliado dos lobos que estão auxiliando monetariamente com a revitalização do parque de Saurgate. Novamente obrigado.

Ártemis tocava os próprios lábios, dedilhando-os enquanto aguardava as manifestações.
– Você tem mesmo a idade que ela disse? – Perguntou a Sidhe atrás, olhando-o sem piscar. – Mil anos?

– Eu disse quase cem. – Ártemis a corrigiu.

– Você disse mil…

– Tanto faz. – Ártemis sacudiu a mão. – Devo ter me confundido.

– Parece um rapaz… – Mariah ainda o observava entre um misto de surpresa e decepção. – Novo… Mas sinto grande poder. Seja bem vindo… Ladi.

Joseph se aproximou, abrindo caminho e também o cumprimentou com um aperto de mão forte.

– Dragões quando amigos são bem vindos. – Disse, sério, mas abrindo o sorriso mais doce depois. – Merece uma festa na Mixórdia. – E deu dois tapas no braço de Ladi.

– Não trate Ladirus com tanta informalidade, Joseph, ele é um Dragão!

– Você não precisa mesmo ser tão formal, senhor Jakande. – Ártemis andou para perto de Ladi e abraçou seu braço. – Ladi é um humano também. Não um espírito velho perdido.

– Ah… – Ícaro concordou, olhando-o – Mas merece ser bem recebido de qualquer modo. Aproveite o festival, é tudo por nossa conta.

Leah observou a nota de cinquenta dólares, fitou Dan e depois Ladi.

– Como Ártemis te conheceu? – Mariah fitou da Pooka para Ladi, ainda confiando pouco a história inteira nas mãos da Changeling.

O Dragão de Gelo sequer estava ciente da “ajuda monetária”, dirá que ele devia ser o protetor dos mares. Era verdadeiro que já havia punido muitas pessoas por não respeitarem as águas, mas o mar era muito grande para de proteger. Os seus Espíritos servos faziam a maior parte do trabalho.

Ele olhava de um para o outro, ouvindo as perguntas sem saber o que deveria respondê-las ou não. O passeio era tão complicado a ponto de Ártemis precisar inventar um conto todo? Como são diferentes entre si. Nada fazia sentido no grupo. Parecia que tinham juntado várias pessoas diferentes sem se atentar a nenhum padrão. A curiosidade brincava também nos olhos confusos do Dragão.

Forte. Ladirus sorriu para Joseph. Provavelmente, com este, poderia ter assuntos dos quais estava mais acostumado. – Obrigado. Eu gosto de festas, embora sempre me sinta perdido nelas. – Ele abriu um novo sorriso mais largo. – Não há necessidade de formalidades mesmo… – Ele acariciou Arty em seu braço. – Eu sei que intimido com… Essa aparência…

– Aparência. – Dan soltou um risinho. – Se você estivesse nos vendo mesmo, estaria presenciando um verdadeiro circo de horrores. Você por acaso já viu Arty como ela realmente é? Eu me certificaria antes de assumir qualquer coisa, Ladirus.

Ladirus o olhou. Circo de horrores? O Dragão de Água voltou a fitar cada um deles.

– Joseph é azul como você. – Dan acrescentou.

Azul. O Dragão mirou Joseph. – Duvido que sejam mais esquisitos que eu. – Ladi riu. – Duvido que Arty seja horrenda também.

– Você é ridículo, Dan. – Ártemis vociferou para o Kithain. – Eu sou linda de qualquer lado. E eu não tenho razões para ficar mostrando minha forma. – Embora amasse a própria aparência, estava insegura, mas nunca admitiria.

– Ninguém é esquisito. – Leah também reclamou. – Somos todos criaturas sobrenaturais.

– Não vamos causar tumulto. – Mariah brigou. – Conversamos melhor na Mixórdia mais tarde.

– É melhor. – Ícaro concordou – Há humanos por aqui e logo vai ficar mais cheio.

– Isso. Vamos conhecer o lugar. – Ártemis fitou Ladirus. – Tem várias coisas para ver hoje.

– Se precisar de qualquer coisa, Ladi, nos avise. – Joseph completou e apontou para ele enquanto se afastava para sua posição – Você parece um cara legal.

– Obrigado. Vocês são muito gentis. – Ladirus sorria de novo, claramente feliz.

– Eu não posso ir junto…? – Suzane perguntou.

– Não, é um encontro. Depois eu o levo para a Pedra do Lagarto. – Ártemis segurou a mão de Ladirus para seguir festival adentro. Leah apoiou o rosto na mão e suspirou.

Com simpatia, Ladirus acenou para Leah e Dan antes de irem. Muito diferentes. O Dragão refletia, imaginando formas em sua mente e imaginando que estavam bem distantes da realidade. Ele acariciou a mão de Ártemis, entrelaçando os seus dedos aos dela. Sorriu e ergueu as mãos unidas para beijar a dela enquanto a olhava.

– Vocês falam Pedra do Lagarto e eu acho que vou ouvir Pedra do Dragão. – Ele tocou o próprio boné, rindo. – Foi como conhecer parte da sua família, Arty… – Comentou, observando-a. – Eu espero que eu tenha me saído bem para uma primeira impressão. – Dizia, pensando… – Eu gosto de fazer amizades. Sei que é estranho para um Dragão dizer isso.

Observou o gesto carinhoso, segurando sua mão e beijando as costas. Ártemis sorriu e se inclinou para roubar um selinho enquanto andavam, rindo do comentário em seguida e também mexendo no boné dele.

– Aqui a gente não evoluiu para Dragão, ficamos em Lagarto mesmo. – Olhou-o risonha  – Foi quase isso. Acho que foi loucura eu ter te trazido aqui de primeira. – Confessou, olhando brevemente para trás e ver o restante se distanciando – Mas estou bem feliz que está se entretendo pelo menos. – Abraçou-o pela cintura e andou agarrada – Eles são meio que a minha família mesmo. Por isso foi loucura te trazer aqui, extremamente brega e suicida da minha parte. – Roubou uma pipoca e se apressou em se entusiasmar com o parque.

Havia muitas coisas em exposição. Pinturas, quadrinhos, malabarismo, mímicos, teatro, esculturas em diversos materiais. Seja onde parassem, alguém tinha algo interessante para mostrar. Tecidos costurados, tapetes desenhados, objetos colecionáveis – e alguns até ganhou de presente do Dragão, ou sugeria para levar para alguém de lembrança. A feira era única, pois haviam muitos talentos artísticos que não paravam em capas de revistas. E ainda haviam os jogos, que particularmente a Changeling amava e se demonstrava muito competitiva; tiro ao alvo, lançamento de argolas, jogo do copo, e até um mini cassino de apostas. Era a primeira vez que Ladirus sentia tão perfeitamente sensível a Esfera de Nyra correr por sua essência, jogando a favor de sua sorte diversas vezes como se fosse natural existir. A seriedade havia lhe fugido, relaxando da postura inquebrável que costuma sustentar. Ele sorria e ria o tempo todo, divertindo-se. E fazia amizades com uma velocidade cômica, conversando aleatoriamente com qualquer um que lhe dirigisse a palavra.

Foi muito fácil para os dois recolher vários prêmios e precisar de uma sacola para guardar. Alguns itens menos interessantes, Ártemis deu para algumas crianças que ficaram bem satisfeitas. Havia ainda os espaços de doações, roupas, brinquedos, dinheiro, que a Kithain deixou alguns itens, e explicou o compromisso deles, os Changelings da Pedra do Lagarto com a solidariedade em relação a cidade. A Pooka, por sua vez, explicava tudo com certa animação; o tempo inteiro se preocupava se ele estava se divertindo, e não era difícil se pegar o admirando e fazia isso cada vez mais conforme as horas corriam rápidas… O Sol procurava sua cama, mas o lugar só ganhava novas atrações, palco, música ao vivo, seguindo até por volta das oito horas da noite com um encerramento de muitos agradecimentos – embora ainda fosse somente o primeiro dia. A festa durava a semana inteira. Conforme Leah cantava a última música da noite no palco de madeira, Ártemis beijava-o na última música, assim como outros casais espalhados… Estavam embaixo de uma árvore, também mais isolados, e seus selinhos viraram abraços, e beijos mais profundos.

A escuridão permitia privacidade distante dos olhos curiosos que os acompanharam o dia inteiro. Era essa a sensação de se divertir ao lado da pessoa querida, então? A alegria dele também a isso. Apreciava estar ao lado de Ártemis e descobria-se enamorado por sua companhia divertida ainda mais. Os fáceis sorrisos radiantes dela aqueciam o seu coração. Ele notava o quanto eram diferentes, mas não se importava nem um pouco com isso. Desejou mais dos seus beijos o dia inteiro, mas conteve-se para as outras experiências. A música bela e o escuro trouxeram com intensidade as vontades caladas. Ladirus a tocava ao rosto, acariciando-o. Provava dos lábios cheios, intenso em cada massagem de sua língua à dela. Os dedos deslizaram vagarosos pelo pescoço feminino, descendo. As expectativas na ponta dos seus dedos, avançando a medida que o coração acelerava, excitado.

Se havia alguém olhando, não perceberia. A sensação química da diversão ao longo do dia e, em seguida, os beijos quentes, pareciam a combinação perfeita para resumir um dia. Ártemis beijava-o tentando não pensar em nada menos do que comportado… Mas sabia que aqueles beijos apenas instigavam seus corpos e geravam rapidamente um calor que dava até agonia. Agonia e felicidade, o espaço entre os beijos, apenas havia breves sorrisos e o claro desejo de seus olhos escuros de ser tocada, abraçada, repousada em algum lugar onde pudessem encontrar um novo limite. Ela suspirou sem ar quando acompanhava a mão descendo por sua pele quente, e afastou seus lábios minimamente.
– Você quer… Ir para a Mixórdia? – Sussurrou, erguendo seus olhos até os puxados do Dragão de Água. – Vai ter… Bebida, conversa, fogueira… Podemos ficar um pouco… – Perguntou como se fosse uma proposta inocente, mas sua mente fugia para as cabanas que tinham pelo ambiente, embora seu lado racional não tinha essa intenção, o emocional se traduzia no desejo de ficar perto dele. – À vontade também…  Se você não estiver com pressa de voltar…

Os olhos dele se abriram vagarosamente, observando-a. Sentia a sua respiração em seu rosto, mista na sua própria, envolvida em calor e profundidade. A proposta era avaliada por cima, pois se deteve um momento apenas para olhá-la. Eu te amaria aqui mesmo, os seus olhos diziam. Ladirus beijou demoradamente os lábios úmidos e retomou a distância curta, mordendo o lábio inferior. – Hm. – Os dedos dele desceram pelo vale entre os seios que queria tanto tocar… – Eu não estou com nenhuma pressa, Arty… – Ele sussurrou entre profundos suspiros. – Eu vou para onde você quiser… Contando que eu esteja com você…

Aquelas palavras deveriam dizer o que ele queria dizer, exatamente. O toque entre os seus seios a fez perder o ar um minuto todo,  e o timbre ainda ficou na sua mente. Seu corpo até ficou um pouco menos relaxado com o beijo úmido, e a visão dele mordendo o próprio lábio. Estava muito apaixonada, e excitada… E descobria que isso era capaz até de arrancar seu fôlego sem muito esforço.

– Vamos… Então… – Ela sorriu um pouco ansiosa, e o beijou de volta, demorado, antes de pegar sua sacola com os prêmios e entregar a outra a ele para carregar. Alguns Changelings já iam para as caminhonetes que haviam o trazido até o centro da cidade, e assobiaram para chamar atenção do casal, perguntando se ele eles queriam carona para a Pedra do Lagarto. Ártemis assentiu e segurou a mão para Ladi para subirem na caçamba do automóvel com sua ajuda, e estar com os outros Kithain e se encostar nele para seguirem até a Mixórdia no meio da floresta.




“And a wicked gale came howling up through… Sheffield City Centre”, Nathan cantava de olhos fechados, diante do microfone profissional no estúdio que Aisha havia montado no castelo. “There was palm tree debris everywhere and… a roman colosseum. Isn’t it awful when I talk about my dreams?”, ele abriu os olhos lânguidos, piscando-os vagarosamente, “It must be torture when I talk about my dreams…”.

Ele suspirou, pondo-se a ouvir a voz por completo. Depois, acionou também os instrumentos gravados. A música nostálgica trazia um incômodo emocional ao seu peito, mas ele estava particularmente orgulhoso dessa. Lembrava-se da Inglaterra e das primeiras fugas para a casa de Jullian. Dias de incerteza e lenta aproximação. De conversas longas e esclarecimentos. Tinha tudo em suas mãos. Por que se sentia tão entristecido? Por que os seus pais importavam tanto, afinal?

Nada acrescentavam em sua vida. Nunca tiveram a intenção de adicionar qualquer elo que fosse. Chamara Neil para o Solstício de Verão e ganhou olhares distantes e nenhuma palavra. Nathan tirou os fones de ouvido e ficou observá-los, sentindo-se a salvo mais uma vez pela música. Observando-se através do vidro, Nathan tocou os cabelos. Preciso cortar. Ele estava sem camisa e vestia um short confortável preto. Uma porção de garrafas de cerveja circulava o banco em que estava sentado, assim como um maço de cigarros vazio e os seus restos mortais apagados em um cinzeiro de pedra. Nathan suspirou, erguendo-se e caminhando até um dos sofás, largando-se nele de bruços e nem notando quando acabou cochilando.

Quando entrou no cômodo depois de procurar sua localização na Árvore, Nyra esperou-o encontrar gravando, ou pelo menos com alguma companhia. Ele não costumava estar sozinho e a visão a deixou um pouco entristecida. “Ele está tentando não pensar” confirmou ao ver as garrafas… Nyra se sentou ao lado dele e o tocou nas costas de leve, não querendo acordá-lo. Como o sofá era grande, deitou-se ao lado dele e continuou o carinho bem leve em seus cabelos longos. Nem havia reparado que estavam cumpridos, e acabava bem no rosto do Galliard. A Theurge havia passado em casa apenas para vestir-se em um vestido de verão, vermelho, alças grossas e a saia curta, como sempre. Suas sandálias ficaram no chão quando se deitou e o aguardou acordar… Revisitando as lembranças dos primeiros dias com ele, e como era facilmente enfeitiçada por aquele rosto inglês.

Um sorriso selado surgiu aos belos lábios bem desenhados dele, assim que notou a presença dela, distanciando-se do sono. Um sorriso preguiçoso como todo ele costumava a ver. Seus dedos deslizaram por ela até se encontrarem com o seu rosto perfeito, acarinhando-o suavemente. – Babe… – Sussurrou, bocejando demoradamente. – Eu preciso cortar o cabelo… – Ele abriu os olhos, mas voltou a fechá-los de novo. Ele se ajeitou melhor no sofá e relaxou novamente. – Não pare…

– Não… Eu gosto do seu cabelo assim… – Ela disse na sua voz mais manhosa e continuou o carinho, virando o rosto apenas para beijar a mão dele que tocou sua face e voltar a admirá-lo. – Por que você está aqui sozinho? – Ajeitou-se mais perto – Você não quis ir para o iate com a gente… Achei que ia cuidar de alguma coisa…

Ele assentiu vagarosamente. Ao que abriu os olhos, não a encarava. Parecia observar distante deles e do tempo, examinando um momento que não fazia parte do presente. Nathan se demorou a retornar ao presente, tragando-se para os olhos de tempestades dedicadas a ele. Os lábios do lobo se expressaram em um beicinho antes que ele começasse a falar, como de praxe, sem pressa alguma:

– Fiquei com Remi um tempo na Casa Azul. Ele tirou algumas fotos minhas e bebemos um vinho. Aquela casa costumava a ser mais calma… Eu senti Fúria e saí. Ele ficou. – Explicava, fazendo longas pausas, como se enamorasse a própria voz bela e grave. – Pensei em ir até vocês, mas acabei aqui, bebendo e fumando. Tentei não pensar, mas minha cabeça é teimosa. Terminei de gravar. ‘The Dream Synopsis’… – Ele a tocou em seu queixo. – Eu preciso tomar uma decisão. – Inspirou profundamente. – Preciso me conformar que certas coisas são como são. E minhas atitudes não necessariamente irão mudá-las. Eu posso mudar a mim mesmo e olhe lá. Eu não tenho poder sobre ninguém.

Nyra escutava cada palavra enquanto sua mão continuava o carinho nos cabelos escuros.
– Queria ter visto a gravação. – Sorriu brevemente, gostava muito daquela música – Você… Está falando do Neil e da Laura, eu imagino… Tudo isso tem mexido com você… – Piscou seus olhos devagar e se aproximou para beijá-lo na testa – Machuca a distância?

– Não. – Nathan respondeu de pronto. – O que me machuca é tudo o que eu cheguei a esperar deles. A expectativa. – Ele trouxe a mão dela para si, segurando-a e observando-a as longas unhas coloridas por um instante. – Há duas situações acontecendo: a real e a que eu cheguei a imaginar. Essa que eu imaginei volta e meia está me olhando, esperando uma atitude minha… Como se eu pudesse me ajudar. Quando eu começo a pensar nela, eu excluo certas coisas. A história fica menos imperfeita. – Suspirou. – Eu não estou infeliz, babe, eu só ando pensando demais sobre isso. Talvez vê-los esteja me atormentando.

Concordou movendo sua cabeça devagar. As intenções e respostas de Neil para tudo o que acontecia eram tóxicas para o Galliard e nem a Theurge estava isenta do incômodo. – Eu entendo a decepção… E eu sei que a escolha de continuarem em silêncio é horrível… Especialmente para você… – Fez uma pausa – Talvez… Esteja na hora de tomarmos uma decisão por ele.

– Tem uma parte que talvez seja relevante que você saiba. – Nathan disse, fechando os olhos e inspirando com desânimo. – Quando eu saí da Casa Azul, eu acabei me encontrando com o Drawn e nós conversamos sobre qualquer coisa. Aliás, motos. Combinamos o horário das nossas aulas pela manhã e conversamos bastante também sobre a minha Esfera mais alta. Ele teve que ir… Então, depois disso, eu peguei a nossa cachorrada que estava pelo castelo e fui caminhar com eles pelo jardim. Encontrei Neil lá. Claro que ele não falou nada além de me cumprimentar… – O Galliard a encarou. – Eu senti que Drawn quis dar um empurrão. Eu já os vi mais de uma vez juntos, conversando.

– Drawn estava com vocês? – Nyra perguntou, dando atenção aos grandes olhos negros do Galliard – Eles são próximos… Drawn disse uma vez. Ele deve estar tentando colocar algo na cabeça de Neil… Mas… Se formos fazer algo sobre isso, vou falar com Jullian antes, e o professor. Talvez ele compreenda… Ele se importa muito conosco, Nate. É quase um cuidado de pai… Principalmente com o Jullian… E nós fôssemos família de alguma forma. – Franziu o nariz – O que é estranho… Porque nem Blackwood ele é. Nossa família de sangue é a pior, sabia…

– Ele não estava junto na hora. É que eu estou cansado do mistério, babe. – Nathan se aproximou dela, diminuindo o tom de voz para um sussurro enquanto a observava… – Alex comentou comigo que a Nikki era aluna dele… Ele disse que ficaram anos sem se ver, mas foi só. Eu sei que é necessário que consultemos Drawn, mas… Eu também queria mais clareza no que realmente está acontecendo.

Nyra concordou, mas pensou em seguida. – Às vezes, eu não sei até onde o conhecimento ajuda. Eu não gosto de saber certas coisas. Mas se essas pessoas ficam surgindo igual pipoca estourando… Melhor falarmos com essas pessoas. – Sorriu e o beijou em um selinho – Só… Podemos não resolver nada hoje? Acho que estão todos dormindo ou com seus pares… É dia pós Solstício… Deixa eu te mimar…

Uma simples olhadela na web foi o bastante para ter certeza de que ninguém estaria inclinado a conversar sobre algo sério. Nathan já estava convencido que o dia não estaria para resoluções. – É capaz que nem estejam aqui. Pelo menos, o Alex. Eu acho que ele saiu. Muita gente saiu. – Os olhos preguiçosos se fecharam antes que ele a beijasse num selinho demorado, roçando-se. – Eu quero te perguntar uma coisa, babe.

Até pensou em olhar a internet de novo, mas decidiu que deixaria as fofocas para o próximo dia. Estava tudo tão calmo e silencioso hoje, mesmo com a certeza que amanhã tudo explodiria. – Nossos Dragões andam impossíveis, sabia? – Nyra riu e retribuiu o selinho carinhosa. – Pode perguntar qualquer coisa.

Ele concordou vagarosamente, embora a sua mente se apegasse firme ao assunto que estava retorno o tempo todo e não o deixasse dar tanta atenção assim às novidades dos irmãos de escamas… – Sei que Kraz se deu bem. Ela me disse de uma forma bem bizarra… Mas tudo bem. – Ele acabou rindo. – Hm. Alex vai se casar com Mia, né…

Nyra concordou sobre a Kraz, indicando que sabia da história, e acabou rindo sozinha ao recordar de alguns detalhes. Mas logo perdeu o foco quando o assunto se voltou ao casamento.
– Sim… A festa está sendo organizada por uma empresa… Na praia. Eles querem muito isso. Pelo bebê especialmente… O que tem?

A profundidade dos olhos escuros já era uma premissa de que não viria uma pergunta qualquer e a sua demora em manifestá-la acordou até mesmo a própria Fúria do Galliard. Ele inspirou e umedeceu os lábios. – Isso nunca passou pela sua cabeça? – Sussurrou. – Casar-se…

Ela devolvia o olhar, que se aprofundava também, mas tornou-se distante depois. – Bem… – Pensava sobre a resposta – Eu não penso mais nisso… Eu sei que você tem vontade. – Olhou-o com um breve sorriso – E Jullian também… E eu tive também… Mas eu deixei de pensar e desejar… Primeiro porque eu não tenho certeza como seria. Depois que… Já é tudo tão perfeito. Não significa muita coisa se vestir de branco em uma cerimônia que pode trazer mais problemas do que bençãos… Especialmente se pessoas demais ficarem sabendo… – Voltou a olhá-lo com atenção – Só tenho vontade de ficar com vocês assim ultimamente. Quietinha.

Ela falava com a voz da razão e ele sabia. Eles viviam em uma linha até confortável demais, omitindo fatos e vivendo uma verdade por detrás deles. Confortável. Nathan franziu o nariz e abriu um sorriso malicioso. – Eu gosto da ideia da festa e da Lua de Mel. Não é como se não estivéssemos “casados”. Provavelmente, mais do que isso. – Ele fez uma pausa, pensando… – Eu não sei. Às vezes, eu penso sobre isso… Como tornar mais perfeito. Nós não poderíamos fazer nenhum “bem bolado” no momento… Né? Aurora definitivamente se afastou.

– Eu sei… – Ela riu sozinha, achando graça em algo que passou na sua mente ao pensar na sexta integrante. – Ficou um buraco. Tinha que ter mais uma noiva, né? – Nyra riu mais uma vez e brincou entre risos durante a fala: – Vamos lançar um anúncio no Tinder. Dois rockstars, uma pop singer, uma modelo e um fotografo procuram novo amor. Sexo feminino. Temos uma vida insana, quatro crianças, e vários animais. Moramos em ilha paradisíaca. Dragões em casa frequentemente, e muita pressão do dia a dia, mas oferecemos muito amor. Loucuras ocasionalmente. Você será mimada e incentivaremos seus sonhos artísticos se tiver. – Nyra ria, olhando-o e quase não conseguindo falar. – Ps. Aceitamos apenas criaturas sobrenaturais, Garou ou mago de preferência. Fada sujeita a aprovação.  – Nyra abanou-se brevemente após rir bastante. – Acho que intimidamos um pouco. Acha que teríamos candidatas?

Primeiro, Nathan dedicou a sua atenção com muita seriedade enquanto assentia. Conforme ela ria e a ideia se desenrolava muito estranha, o Galliard começou sorrir, rir e, por fim, gargalhar. – Caralho. – Ele escondeu o rosto no sofá, rindo. A mente foi longe o bastante para ele imaginar até mesmo o anúncio. – Babe. A gente tinha que pensar em critérios de entrevista nesse caso. – Falava com a voz abafada. Ainda rindo, olhou-a. – É bom sabermos quantas horas a pessoa dorme! Ah, precisamos saber se ela tem problemas com a família. Tem que ter, senão… Muito diferente! – Empolgava-se. – Babe. Estamos precisando de mais alguém que saiba cozinhar também.

Nyra caiu no mesmo riso com as especificações da possível entrevista. – Verdade! Tem que cozinhar. Pelo menos fazer algumas bebidas… Eu receio que a gente perca o Rhistel e a Blair de agora em diante. Eles estão até de aliança agora sabia? – Fofocou, ainda incrédula com a história – Mas tem que cozinhar, dormir pouco. Acho que ficou bem difícil agora. Gostar de animais, crianças, não ligar para cigarro… E… Tem que ser forte. É muita loucura o que vivemos. Muitas exigências. Mas acho que ainda teríamos algumas candidatas. Tem umas meninas no vilarejo que são tão bonitas… Mas acho que nem querem nada, medo. E nem podemos confiar na Nikki o que é pior. Mas ela é muito bonita, né… – Provocou com um sorriso, olhando-o.

A bobeira da conversa o fazia rir, sentindo os olhos úmidos das risadas descontroladas. Nathan mordeu o lábio, desviando-se das tempestades de Nyra brevemente. – Nikki. – Pensou. Ela é morena. – Ele sorriu, pensando. – Mas também acho que não dá para confiar, não, mas ela é sim. Bem bonita e bem doida. – Acrescentou. – A Arabella tem muita amiga bonita. Umas belezas diferentes… Os rostinhos novos por aqui: Arty, Vinny, a amiga da Arty e a princesa. Muita mulher bonita. – Ele fez uma pausa. – Mas… Eu nem ligo mais se é bonita ou não, babe. Para mim, você, a Annie e a Blair são as mais bonitas da ilha. Fim. Você, a suprema da beleza. Beleza já temos demais. – Riu, mas pensou por um instante. – Aliança. – Inspirou. – Eu já estava vendo isso acontecer. Era muita graça ali entre os dois. “Bee”. – Nathan sorriu de escanteio. – Eles estão em Veneza. Enviaram-me algumas fotos, mas eu não tinha reparado em aliança. – Ele pegou o celular para a Theurge checá-las.

Nyra o escutou responder e terminou com um riso, beijando-o nos lábios antes de mostrar a foto. – Não dá para ver direito. Acho que é ouro rosa. Mas você não viu onde ele comprou e o quanto pagou. – Mostrou a foto da fatura que tinha tirado do celular de Jullian. – Olha isso. Gastou uns milhares com ela, e ele disse que ia ser bem pouco para o Jullian. Acha que estamos nadando em grana. – Apertou os lábios e o fitou.

– Ele deve estar bem apaixonado por ela. Que bom ter alguém como o Jules para patrocinar, né. Nós sempre tiramos do nosso bolso mesmo. – Nathan riu, negando com a cabeça. Rhistel cara de pau… Isso é muito dinheiro. Gaia. – Espero que o single esteja indo bem.

– Vamos dar uma volta? A gente pode passear pelo vilarejo… Arabella está sempre recebendo gente nova… Até Cliaths temos agora… Podemos colar nosso anúncio por lá.  – Brincou.

– Sim. Você pode fazer uma arte bem sexy. É bom deixarmos claro que só aceitamos currículos com foto. – Ele a abraçou, agarrando-se a ela fortemente antes de roubar vários selinhos dos lábios cheios e macios. – Boba. – Sussurrou, tocando-a em seu rosto. – Obrigado, babe. Eu te amo tanto que nem sei expressar… Você é o remédio para qualquer dor minha…

Ela sorriu para ele e o beijou em selinhos carinhosos. – Você é a minha vida, Nate. Minha vida, meu rockstar. – Riu, ainda o acariciando por um tempo. – Depois a gente se esconde em algum lugar e faz amor na praia… – Riu da proposta e se ergueu, sentando-se e o fitando. – Porque você é muito sexy com esse cabelo. Eu não tinha reparado como tinha ficado bem em você… – Fitou-o melhor, descendo seus olhos pelo corpo do Galliard – Não… Eu quero agora… Eu te quero agora… – Murmurou e voltou a se deitar para beijá-lo em selinhos e depois profundamente, envolvendo-o com suas pernas que se entrelaçaram a dele e com seus lábios cheios em chamas, chamando-o para o amar.

Mas eu vou cortar… O pensamento foi solto e não se verbalizou. – Eu só reparei quando começou a cobrir a minha cara… – Fazia muito calor na ilha e cabelo mais cumprido era um trabalho que ele não queria ter. Mas ela gosta… Observava-a, tão perfeitamente bela e graciosa, como uma menina levada prestes a fazer arte. Os sorrisos e a voz perfeitamente macia, suave e afinada e dizendo frases que fizeram o corpo do lobo se incendiar de desejos. – Tanto tempo que já se passou e ainda parece que eu estou descendo com você para o porão… – Sussurrou antes beijá-la ardentemente, puxando-a para si com afiadas em garras.




Era como se tivesse passado muitos anos no escuro e de repente visse luz. Todas aquelas declarações de amor eram genuínas. A cada instante apenas sabia que estava cada vez mais dependente de Rhistel… Do seu cheiro, sua respiração, a voz manhosa quando queria dizer algo. Blair nunca havia se drogado, mas conhecia a sensação dos remédios e o prazer ao liberarem a química pela sua corrente sanguínea. A sensação de querer outra dose era muito similar, mas muito mais satisfatória e completa. Desejava aquelas doses dele o tempo inteiro. Um vício. Prazer. Simplesmente prazer em estar perto de quem amava, cuidando do seu corpo e mente, dos seus interesses e prestando atenção em cada desejo, mesmo que ela não dissesse. Bastava um gemido mais profundo, uma expressão mais desejosa, e ele estava ali… Querendo ouvir mais daquelas notas. Blair tentava ser tão atenciosa quanto, e oferecia o que sabia sem medo de tentar… De se doar. E como se doava… Toques, posições, frio e quente; e beijos, dos mais intensos, dos mais longos, daqueles que desciam por seu corpos e se encontravam nos lugares mais sensíveis. Mãos, abraços, risos apaixonados e sabores. Nem o café de madrugada passou menos interessante quando ela sujou o pescoço dele com o mel somente para tomá-lo de volta devagar, subindo em seu colo nas poltronas em torno da mesa para brincarem até terminar o amando. Rhistel não a negava nenhuma vez, e a maga não desgrudava, demonstrando que seu corpo tinham limitações bem acima das humanas. E toda a pausa parecia apenas um espaço para pedir um pouco mais dele, cercando-o manhosa, às vezes tímida, mas sempre pedinte. Por favor… Um pouquinho mais… Era o que seus olhos verdes expressavam vez e outra.

Nos espaços… Blair permanecia abraçada muitas vezes com ele na cama, admirando seus olhos, seu corpo ou os desenhos nele que gostava, desenhando com os seus dedos os traços, em silêncio ou rindo bastante sobre algo que recordavam nos filmes ou na música com frases “eu odeio” ou “eu amo”. O relógio criava o próprio tempo, avançando e parando em diversos momentos, e só notava-se que já era quase amanhecer quando o negro virou azul escuro e ganhou raios avermelhados na sua composição.

– Você está pensando em algo… – Ela o olhou contra a luz. – Me diz o que estava pensando aquela hora. – Perguntou curiosa, os lábios risonhos. A maga estava de costas para o nascer do Sol e de frente para Rhistel, com os quadris apoiados na sacada e as pernas entrelaçadas a dele. Ela usava o roupão de banho branco, mas ainda não haviam se banhado. – Diiz… – Ela riu e roubou selinhos dos lábios vermelhos dele, seus grandes olhos verdes o fitando a todo instante. – Você não falou aquela hora… Eu lembro!

Com os olhos iluminados pelo Sol, tornando-se claros, ele a fitava com eles quase fechados, tentando se proteger da sensibilidade de ter a luz cálida os banhando. O Dragão de Gelo estranhou a pergunta como se distante da Terra por um momento e puxado de volta para ela sem saber onde havia aterrissado. – Eu? – Perguntou por um impulso, abrindo um sorriso enquanto a mirava em seu bom humor incorrigível. – Ahm… Bee. Você se lembra, mas eu não… – Ele riu, franzindo o cenho. – Eu pensei algo sim… Mas deve ser bobeira… Ah. – Ele franziu o cenho, rindo. – É que… – Ele mordeu o lábio, desviando-se dos olhos verdes brevemente. – Eu achei muito fofa você estar… Tão… Hm. Eu não sei, sem palavras. Tudo o que eu te perguntava, você… – Ele assentiu com a cabeça. – … Ou… – Rhistel meneou negativamente, rindo. – … E, às vezes… – Ele fez um movimento completamente sem sentido, assentindo ou negando. – Esse último não aconteceu, mas os outros, sim! – Ele miou. – Você fazia umas carinhas que eu queria morder… Meio tímida, meio “Nossa!”… – Aproximando-se, ele a mordeu na bochecha.

Ela riu com a mordiscada em seu rosto e o olhou tentando não parecer tão tímida. – É difícil falar… Quando você está me fazendo sentir tantas coisas e coisas novas… – Justificou-se e encarando os olhos dele, que ganharam um tom mais claro com a luz do Sol. Blair se lembrou que viu aquela faixa de cor algumas vezes durante a noite, assim como a temperatura mais quente e ápices mais profundos. Ela tentou não pensar demais sobre isso, guardou a pergunta. – Ou… Mais ou menos novas. Porque você já me trouxe prazer outras vezes… – Beijou-o em um selinho demorado, mordiscando de leve os lábios frios em seguida. Seus braços descansavam nos ombros dele, e ela tentou colocar seu corpo na frente do Sol – Mas… Eu sinto que te usei um pouco… – Sorriu arteira após outros selinho – Eu queria poder te dar todo o prazer que me deu essa noite… – Olhava-o – Eu ainda estou muito sensível, mas eu sei que vamos para casa agora…

– Nãão… Você não me usou… – Rhistel murmurou lamurioso. – Não se subestime, Bee… Boba… Bee-Boba. – Ele apertou o pequeno nariz arrebitado que ela possuía. – Eu estou pleno. Não me faltou nada. Eu estou com você… – Ele a mirava com um nosso sorriso. – Minha princesa russa… Agradar você é um prazer para mim também. E eu gosto muito de agradar, Bee. Para eu estar no ponto, é assim. – Ele estalou o dedo e riu depois. – Eu nem te mostrei tudo o que eu sei fazer… – Rhistel se aproximou do ouvido dela, afastando uma mecha do cabelo loiro. – O quanto eu sei usar a minha língua gelada… – Beijou-a no rosto demoradamente. – Mas você já quer ir embora, então… Nós vamos embora, né… – Ele ergueu os olhos para o céu. – Vai ficar sem saber.

Tentou não ceder àquela expressão que ele havia dito de “Nossa!”, mas teve certeza que exatamente a cara que fez ao entreabrir seus lábios discretamente. – Não vou ficar sem saber. – Blair disse com seriedade, segurando a mão dele com o anel – Porque você é meu… – Sorriu de canto, simulando maldade no olhar e sorriso – Eu não quero ir. Eu quero ficar até alguém nos tirar daqui à força… E isso seria impossível… – Beijou-o o empurrando de leve de volta para dentro do quarto. – Me mostra? – Riu e o beijou no pescoço, segurando-no brevemente pela roupa – Eu amo seu corpo gelado, Rhis… Quando eu estou quente e você está dentro de mim… É a melhor sensação…

Ele cambaleou para trás. Os olhos escuros aos dela e o sorriso selado aos lábios. Ele também vestia um roupão, azul e aberto. Rhistel estava prestes a dizer: “Você sabe que não podemos”, mas o comentário erótico fez o seu corpo perder muito facilmente a paz… – Que comentário… – Murmurou entre um suspiro antes de avançar e buscar pelo beijo de Blair, juntando o seu corpo excitado ao dela. Ele roçou os seus lábios antes de aprofundar o toque. Os seus braços trouxeram-na mais para si, envolvendo-a pela cintura. – Você sabe que sou sensível com comentários… – Sussurrou entre suspiros. – Precisamos ir… Eu prometo que na próxima oportunidade… Você vai sentir toda… A minha língua dentro de você… Muito mais do que beijos… Mas chupões… Mordidas…

Ela o escutou fitando seus lábios e suspirou. A imaginação era muito cruel, mas guardou-a para si mordendo o próprio lábio e erguendo o pescoço para fitar o teto por um segundo. – Tortura… – Murmurou e o olhou fingindo revolta ao franzir a testa. – Rhistel. Só porque você é a pessoa que me faz feliz. – Brincou não contendo um sorriso depois – Você não precisa me mostrar nada novo agora, mas ainda vamos tomar banho antes de ir… ‘Tá? – Desfez o nó do roupão dele enquanto o guiava com as mãos em seu peito e beijos para dentro da suíte.




Viagem na caçamba de uma caminhonete com as antigas irmãs o vigiando no manto escuro do céu infinito. Ladirus olhava para cima com as luzes das estrelas refletidas em seus orbes. Estava sentado com as pernas abertas e os joelhos dobrados e os seus braços envolviam Ártemis pela cintura, sentada de costas para ele. A aroma dos longos cabelos perfumados próximos ao seu nariz. Ladirus apoiou o queixo sobre os fios negros, inspirando profundamente. Ele já não sabia o que esperar do momento e nem queria criar muitas expectativas do dia que já estava sentado muito agradável, mas sentia o coração excitado bater forte, ansioso…

– Às vezes, eu queria me recordar como era viver lá em cima… – Sussurrou para ela e para si, meio distraído. – Parece que eu tive duas vidas… E uma delas eu simplesmente perdi. – Ele suspirou, fazendo um muxoxo. – Arty… – Ele se curvou para sussurrar mais próximo do seu ouvido. – … Desde… Quando você me notou…? Desse jeito…

O céu ficava mais limpo, o cheiro do verde mais forte; a caminhote adentrava uma estrada de terra e seguia por caminhos estreitos e cobertos por galhos das frondosas árvores quando ele falou em seu ouvido. Seu corpo se arrepiou e ela sorriu discretamente. Havia falado tanto o dia inteiro, que percebeu que não havia raciocinado o fato dele ser um Dragão. Irmão de Connor, Tayrou e Ross. E realmente um protetor, não dos mares, mas da Reserva Florestal.
– Você sente falta da parte que você perdeu…? – Perguntou, virando o rosto lentamente para o olhar, e mais uma vez se arrepiar quando ele resolveu falar mais perto ainda do seu ouvido. Ela pensou bem na resposta, pois não se lembrava bem quando o sentimento cresceu, mas tinha a sensação que foi desde sempre. – Na festa de recepção no jardim do castelo. Eu fiquei te olhando de longe. E depois de perto no final, quando ficamos todos juntos. Eu te achei… Bonito e parecia uma pessoa que eu gostaria de conversar… – Ela apoiou a mão no joelho dele fazendo uma caricia com a ponta dos dedos – E você realmente foi legal comigo no estúdio… Guardou minha música com você… Ninguém nunca levou a sério meu desejo de cantar. Nem que eu estava escrevendo. Você fez isso… Acho que foi aí… Daí eu tinha certeza que queria ficar com você. – Olhou-o por cima do ombro com um sorriso discreto – E você…?

– Sério…? – Ladirus abriu um sorriso largo. – Ninguém teria coragem de te olhar no jardim. Tayrou e Ross pareciam seguranças te olhando de longe. Nós, os demais irmãos, queríamos conhecer você. Eles sempre foram resistentes. – Ele enfatizou com um riso que não expressava uma gota sequer de remorso. – Eu reparei que você se aproximou do meu coração quando nos vimos no castelo… E você ficou sorrindo para mim e eu só conseguia pensar que eu gostaria de poder guardar o seu sorriso comigo. Eu acho que sorrisos também dizem muito sobre uma pessoa e o seu é… Muito cheio de vida. É apaixonante como a sua voz. Eu tenho certeza que você será muito querida quando se lançar em uma carreira… – Ele sussurrou com carinho e beijou-a em seus cabelos. – Ah. Você poderia me fazer um favor?

Ela escutou o relato com o sorriso que ele falava, fechou seus olhos a cada beijo e aproximação à sua pele. Estava tão inebriada pelo dragão e sua presença, que não se sentia tão nervosa ou pega por muita expectativa; embora essas ainda existissem. Era apenas muito agradável ficar com ele…
– Você gosta da minha voz… Então? – Sorriu, e sua mão tocou a dele que estava cruzada sobre seu abdome, abraçando-a contra seu peito.A pergunta a pegou de surpresa, e ela virou um pouco o corpo para o olhar nos olhos. – Claro que sim. O que é… ?

– Eu gosto. Você deveria escrever mais canções… – Ladirus a beijou no rosto, demorando-se. Os seus braços fecharam mais o cerco que faziam, fazendo-a para si. – Bem, hm. – Ele pareceu recear antes de falar, mas prosseguiu. – Eu não entendo muito de internet ainda… E eu gostaria de saber como está indo o single da Heathens. Leah me perguntou algumas coisas sobre a minha banda e eu não sabia responder. Foi um pouco vergonhoso.

Ártemis guardou um suspiro quando foi apertada em seus braços e aninhou-se melhor a eles, e tentou não perder o foco; ainda tinha que se acostumar muito com a presença tão carinhosa de Ladirus, sua voz, suas palavras, seu corpo…

– Achei que estava acompanhando… – Ela virou um pouco seu corpo para olhá-lo e pegou seu celular, que ainda recebia muitas notificações silenciosas da postagem do Tyler. Ártemis ainda nem havia as lido, mas já tinha visto o número e já alcançava os sete dígitos de comentários mais curtidas tranquilamente. Ainda não sabia, mas seu nome rodava em sites de fofoca de menor categoria “Quem é Ártemis Voy?”. – Olha… No youtube são cinquenta milhões… Só áudio. Uau. – Arregalou seus olhos – No streaming… Wow, wow… – Ela escondeu a tela do celular no peito e o fitou – Isso é muita coisa, Ladi! – Voltou a digitar rápido o nome da banda no Google. – Já tem tudo na internet. Vocês tem uma página na Wiki. – Riu animada. – Sua foto! – Mostrou a ele. – Tão dizendo que você nasceu em Fox Town e é filho de comerciantes. Eles inventaram sua história… Humana… Deve ter sido sua agência. Você precisa ser humano. Tem site falando sobre vocês já. Muitos!

– Mandaram muito bem. – Leah comentou, estava sentada do outro lado da caçamba e também acompanhava online. – É muita coisa para um começo… São dois dias e sem promo de vocês… Parabéns.

Os pequenos olhos do Dragão estavam estáticos, fitando a tela de celular sem compreender muito, mas atento às explicações de Ártemis – e feliz por tê-la ao lado para fazer isso, embora as informações não lhe dissessem muito por não ter um parâmetro de comparação. Ladirus imaginava que fosse bastante pela reação dela e não soube dizer se considerava bom ou não… – Até hoje eu não sei de onde veio esse ‘Kardigan’… – Referiu-se ao sobrenome. Se Elara era uma Blackwood… – É… Eu não sei o que dizer… – Suspirou. – Rhistel deve estar bem feliz…

– Mandaram muito bem. – Leah comentou, estava sentada do outro lado da caçamba e também acompanhava online. – É muita coisa para um começo… São dois dias e sem promo de vocês… Parabéns.

E soube menos ao ouvir a voz de Leah. Ladirus ergueu o rosto, procurando pela bela moça de olhos claros. Ele sorriu sem jeito. Muito vergonhoso. – Obrigado. – Ele disse, franzindo o cenho. – Ah… Leah. Parabéns a você também. Você esteve incrível hoje.

Ártemis abriu a boca surpresa ao ver que ele não estava tão animado, e recordou-se aos poucos que Rhistel ocultava essas informações. Ladi não cobiçava a fama.

Leah até ficou surpresa com a atitude “ok”, mas sorriu agradecida do elogio:

– Eram só uns covers. Obrigada! – Ela segurava um ursinho de pelúcia entre os braços. – Mas… Nada tão grande assim…

– Mas amanhã será. – Ladirus disse.

Leah sorriu agradecida e se encolheu animada.

– Você não está feliz? – Ártemis ficou de frente para ele, ajoelhada, e segurou-o nos ombros. – Sua música está sendo elogiada. Você quem criou. Você quem fez a percussão. Estão amando, Ladi! – Ela dizia agitada e empolgada.

A surpresa desenhou aos lábios dele um sorriso risonho. – Ah! Eu… Estou… É como se não parecesse verdade! – Ele mordeu o lábio, pensando e olhando-a. As suas mãos pousaram sobre as dela. – Eu sei, foi trabalhoso fazer esse álbum… E é legal ser reconhecido, mas eu não sei… Como será se ficarmos famosos mesmo. Eu fico um pouco perdido, sabem…?! Eu gosto da ideia de poder falar com várias pessoas. A canção é mais do que uma música. É uma conversa… Eu tenho certeza que pode tocar corações, mas… Fama… – Ele franziu o cenho e riu.

– Você sabe mais ou menos! – Ele riu também e ficou em pé, mesmo com a movimentação intensa do carro. – Você vai andar pela rua. – Caminhou até a outra ponta com uma destreza natural– As pessoas vão dizer, ’Olha lá, é o Ladi’. – Voltou até ele e apoiou suas mãos no ombro dele para se jogar sentada entre suas pernas, deitando suas costas no peito dele e fingindo mirar um celular para os dois para uma selfie: – E vão pedir sua foto e vão dizer como sua música a fez bem em momentos ruins. – Virou o rosto para olhá-lo – Sabe?

– Coisa assim. – Leah assistiu Ártemis rindo – E com certeza, muitas fotos. Você já anda bem vestido, faz a diferença.

– Sim. – Concordou com Leah – Depois é só fazer seu show.

– Eu acho que deve ser um pouco mais difícil que isso. Você vai trabalhar bastante. – Leah arqueou as sobrancelhas.

– Nah! – Ártemis discordou. – Mas nem deve ser trabalho direito.

Leah franziu o nariz, também tinha uma ideia romântica da fama, mas nem tanto.

– De qualquer forma, ser famoso é algo que você já está mais ou menos acostumado. – Ártemis completou e o beijou em um selinho demorado.

– Hmm… – Leah limpou a garganta quando estavam chegando. – Você não vai encantá-lo, Arty?

A Kithain fitou Leah como se tivesse recebida uma notícia nova.

– Ah… Sim! Eu vou só… Explicar como funciona antes… – Ártemis fitou a clareira brevemente e Leah saltou da caminhonete para se aproximar de um espaço que parecia apenas composto de uma fogueira e barracas remendadas, penduradas entre árvores.

Quando os demais foram saindo, Ladirus observou brevemente ao redor e esperou todos descerem para retribuir o selinho que recebera dela, tocando o seu rosto em um carinho. A ideia de que estava por tempo demais longe da ilha surgira tão breve quanto a brisa que levou o seu boné embora. Ladirus o virou para trás e fitou os olhos da fada.

– Você é tão linda… – Sussurrou, roubando mais um selinho dos lábios macios.

O sorriso dela cresceu selado para o elogio, e o selinho deixado foi prolongado para um beijo mais profundo, que ela não se preocupou com a brevidade do momento.

– É que…  Eu tenho uma outra forma, quer dizer, três. – Ela enumerou com os dedos, falando bem rápido – Quem você está vendo, eu sou um gato também, e uma mistura dos dois. – Explicou – Eu não sei se eu vou continuar assim tão bonita para você, – Riu sem jeito – mas… Só podem ver quando estão encantados ou eu permito. E eu vou te encantar agora ou você não ver nossa casa. – Ela o beijou de novo, mas em um selinho com um pouco de energia própria. Quando Ladirus olhou de novo, não só Ártemis teria mudado, mas tudo ao redor. A Kithain tinha os olhos mais escuros e brilhosos, levemente puxados. Entre os cabelos escuros, pequenas orelhas felinas negras, suas unhas longas como Nyra costumava usar. Suas roupas também mudaram drasticamente, para um vestido branco, com os ombros expostos pois as mangas permaneciam caídas nos braços. Ele tinha um corsete de tecido veludo preto na cintura, mas que não apertava sua silhueta, a saia curta e botas longas. Quando ela falou, era possível ver uma única presa felina na sua boca: – O encantamento é só por um tempo. Eu volto à minha forma já. – Explicou com timidez e a cauda felina negra maneando lentamente. Esperou ser vista na sua essência e apontou depois para a Mixórdia, onde todos os outros podiam ser vistos na sua forma, além de novos objetos, e algumas criaturas totalmente novas, como um cachorro São Bernardo imenso, bípede, que tomava um café perto da fogueira Mágika.

– Mani! – O cão acenou e gritou de longe e Ártemis fez uma careta breve ao ser chamada – Ouvi dizer que vai começar a cantar!

Apesar de se virar brevemente para o ver o cão e se surpreender com a sua forma, Ladirus não conseguiu se distanciar da novidade que foi ver Ártemis em sua forma feérica com um queixo que caia vagarosamente, entreabrindo os lábios. Os olhos surpresos do Dragão se voltaram a ela novamente, reparando em seus detalhes exóticos e precisamente, os olhos. Ele inspirou e se virou novamente em direção às vozes.

Barracas se transformavam em seis enormes tendas brancas em formato de cone e uma sétima ainda maior formando um semicírculo, decoradas com mastros que ostentavam bandeiras ondulantes verdes escuras com o brasão de um lagarto pintado de boca aberta em cor branca. As tendas eram decoradas por luzes que se moviam sem sincroniza como vagalumes ao redor da iluminação verde própria que as circulava. Cavalos – unicórnio? Pégaso? – relinchavam distantes e ele teve certeza que viu algo a mais nos céus, voando e pintando tiras de arco-íris no escuro. O caminho de flores fluorescentes que levava até o centro do semicírculo parecia refletir e oscilar com uma energia que mudava entre o azul e o verde, como se fosse possível se afogar nele mesmo que fosse sólido.

– Ela trouxe um Dragão com ela! – Suzane disse empolgada. O vestido da Sidhe parecia ter sido feito por um artesão extremamente sofisticado, pois diferente dos plebeus, haviam adornos e laços dignos de realeza.

– Dá para ver! – Ele falava arfando.

O Dragão observou Suzane – muito mais bonita do que já era de fato e inspirou. Finalmente, retornou o olhar para Ártemis. Piscou os olhos devagar, ele elevou o a sua atenção até as orelhas e, sem pestanejar, tocou-as com dedos gentis e carinhosos, sentindo a maciez sedosa dos pelos negros. Os olhos ganharam um aquecido ardor antes de beijá-la.

A Pooka observou com atenção ele tocando em sua orelha e sorriu contente com o gesto. Apenas se surpreendeu em ser beijada, pois não esperava o calor que sentiu do corpo dele ao mostrar sua alma. A Kithain o tocou em seus ombros e desceu suas mãos por seu corpo devagar, na tentativa de segurar tudo o que sentiu naquele segundo; retribuindo o beijo intenso que dividiram naquele minuto, roçando seus lábios, sentindo sua saliva e o sabor doce. Ártemis piscou seus olhos devagar e ofegou quando afastou sua boca um pouco.

– Nossa! Mani trouxe um Dragão mesmo!

Ártemis escutou de longe, fitou o grupo com o canto de olho, brava, mas não deu bola. Deitou-se na caçamba e puxou Ladi para deitar-se ao seu lado, escondendo-se da visão dos curiosos. Ártemis se ajeitou deitando sobre o braço dele e o fitou antes de retribuir selinhos em seus lábios úmidos, demorados e carentes.

– Eu sei, é muita coisa para processar… – Murmurou, olhando-o com perfeição na pouca luz. – O lugar é mais insano do que parece. Mas é um jardim do Éden também. – Sorriu, encarando os olhos puxados do Dragão de Água com admiração incurável.

Ladirus concordou sem concordar realmente. Para um ser vivido do Umbral, o diferente era rotina. A mão forte a tocou atrás do pescoço dela e ele a beijou novamente, fazendo-a para mais perto de si ao envolvê-la também pela cintura. Mani… Suspirava, apertando os olhos. Sentia presenças se aproximando e já imaginava que privacidade seria um bem muito caro naquela noite, então quis senti-la profundamente. Sua mão deslizou da cintura até os chamativos quadris. Ele apertou-a ardentemente, mordiscando o lábio cheio ao se afastar minimamente para suspirar…

– Mani. – Ele repetiu, ofegante. – Talvez, hm… Seja justo que eu te diga quem eu realmente sou também. – Ladirus a chupou levemente ao lábio, afastando-se. – Chamo-me Sirius… – Ele acabou rindo entre a respiração profunda.

– A Estrela do Cão! – Dan apoiou os braços na caçamba, olhando-os.

Ladirus soube de pronto que era ele. Os olhos preguiçosos com olheiras – agora vermelhas – a beirá-lo, mas estava com a tez branca como farinha, com círculos vermelhos nas bochechas, nariz e queixo, cabelos brancos ao invés de negros e longas orelhas élficas. O seu traje lembrou a Ladirus um mímico. Camisa preta e branca e calças pretas com suspensórios vermelhos.

– Eu estou atrapalhando o casalzinho, mas e daí? Não é todo o dia que vemos um Dragão! – Dan abriu um sorriso cínico. – Vamos lá. Todo mundo quer te conhecer, Ladirus.

Os olhos felinos se entediaram para Dan, mas depois pareceu surpresa. – Estrela do Cão? – Fitou Ladirus um minuto, esperando que ele não tivesse uma forma de cachorro. Gostava da de Dragão apenas. Mas se virou para Dan e terminou de reclamar:

– Vocês são um saco. Eu nem sei porque trouxe. – Franziu o cenho irritada. – Se o Ladi quiser fugir daqui, eu vou matar todos vocês.

Sentou-se e ficou em pé para saltar da caminhonete.

– Aí que mau humorada. – Mariah riu, sentada ao lado da fogueira e com uma bebida em mãos. – Você quem trouxe o Ladi.

– Senta aqui com a gente. – Disse a Quimera São Bernardo.

– As Quimeras da Ártemis são super mau humoradas também. – Suzana dizia acomodada a um puff no chão, haviam muitos coloridos desses largados sobre a grama perfeitamente aparada. – Melissa nunca sorri e Sopoespian nunca deixa ninguém chegar perto. Nem ela!

– O que você gosta de comer, Ladi? – Ícaro perguntou, olhando-o com atenção assim como todo mundo. Silêncio e muitos olhos.

Ártemis estreitou os seus, perdendo a paciência.

Contava com a compreensão de todos em relação aos seus olhares. Ladirus não conseguia controlá-los. O cão falante, as formas diferentes daqueles que estavam presentes e dos que começaram a chegar. Ele caminhava todo curioso, fitando cada rosto e ouvindo com atenção as vozes mágicas. Ele se sentou, deixando um espaço para Ártemis se acomodar ao seu lado e encarnado o fogo que não queimava em tons avermelhados, mas arroxeados. Krazugnis gostaria disso.

– Eu como carnes em geral, principalmente de animais marinos. – Disse, sem pensar, e quando mirou algumas expressões pensativas, completou. – Mas eu gosto muito de comida humana também! Digo… Eu sido uma dieta, mas hoje eu acho que não tem problema esquecê-la… – Ele ergueu os olhos para uma garota que se aproximava ao lado de um unicórnio de crina azul clara.

Era uma moça muito bonita. Cabelos longos e ondulados castanho claros com uma franja reta sobre os olhos e entre eles, orelhas élficas, mas mais delicadas que as de Dan. Os seus lábios eram cheios e altivos, sendo o inferior maior, formando um coração. Ela trajava um vestido longo e fechado preto com as costuras em cor-de-rosa e um corpete apertado no mesmo tom e trazia em mãos um violino. Ela mirou Ladirus com seriedade e se sentou próxima à Suzana. O Dragão devolveu o olhar, mas com um sorriso tranquilo.

– Ótimo! Vou cozinhar para você o especial da casa. – Ícaro disse, afastando-se para uma das cabanas.

– Quimeras? – Ladirus perguntou. – Oh, obrigado…

– São manifestações do Sonhar. – Leah disse, sentando-se em um puff próximo do casal. A Pooka tinha orelhas brancas contornadas de pretas, de um Husky. Usava um vestido de corte parecido com o de Ártemis, mas longo e bem mais decotado. Seus olhos iam atentos de um lado a outro, mas retornavam a Ladi sempre. O Dragão assentiu para ela em compreensão, abrindo um sorriso selado de agradecimento. As orelhas dela rapidamente lhe fizeram se lembrar do Nick, o cachorro do Nathan.
Ártemis não perdia a oportunidade de ficar agarrado ao Dragão e o fez ao compartilhar o estofado mágico que parecia feito de água por detrás do plástico macio. Ladirus retribuiu o abraço, mas assentiu o peso do olhar da moça que não havia se apresentado lhe atingir como um golpe.

– Elas são criaturas de sonhos, alguém sonhou e eles nasceram, pode ser por consciência ou não. – Arty terminou de explicar. – Eu tenho duas…

– E são muito poderosas. Não é comum falarem e se comportarem como humanos… Mas a Melissa… – Suzana disse. – Bem, a Mani não é igual a nós completamente.

– Não fala bobagem, Susie. – Disse Joseph, um imenso Troll azul, com mais de dois metros de altura na sua forma original. – Mani é exatamente como nós.

Ladirus o olhou, admirado. Ele era realmente azul, afinal. E maior ainda do que parecia. Não é igual?

A Pooka até ia reclamar, mas se distraiu com a presença de Mary Ann. A belíssima Sidhe, irmã mais velha de Suzana, e presença comum da Mixórdia.

– Que bom que veio! – Suzana sorriu para a irmã e então pareceu notar a seriedade. Seguiu os olhos de Ann até Ladi e pressionou os dentes. Leah também sentiu um certo clima e deslizou pelo assento. – Você vai tocar para a gente, Ann?

– Eu vou cantar. – Ártemis disse, desviando o olhar de Mary Ann. – Vocês vão me ouvir, já que estou treinando.

A Sidhe abriu os lábios para responder, mas calou-se. Sentada ereta, como um cisne arrogante, ela fitou Ártemis, mas retornou o seu olhar a Ladirus:

– Depois. – Ela respondeu com a voz suave que possuía.

– Nem sabia que você tocava… – Mariah estranhou.

O violão foi passando de mão em mão até chegar na Pooka gata. Ela se sentou direito, ajeitando-se e disse: – Ladi quem tem me ensinado.

– Ela aprende rápido qualquer coisa. – Ladirus disse, sentindo-se acanhado subitamente. Tantos olhos. O Dragão abaixou a cabeça, fitando as próprias mãos e distraindo-se. Ele ergueu o rosto e encontrou-se com Leah. – Eu gostei das suas orelhas. – Disse, com simpatia.

– Ladirus. – Ann o chamou e o sorriso que esboçou pareceu tudo menos natural. – Quer dizer que há uma Sidhe na Ilha de Vênus?

Ele precisou de um momento para entender sobre o que ela estava se referindo. – Ah. Sim! Flora. – Disse-lhe, esboçando um sorriso animado. – Princesa Flora. Ela é a filha do nosso Rei. Ártemis vai nos ajud-

– Se aceitar a minha ajuda, eu posso ser mais útil, ouso dizer. Eu também sou uma Sidhe. – Ela disse, encarando-o.

– Ah… – Ladirus se voltou para Ártemis. – Eu… Bom, obrigado. É que eu não estou tratando desse assunto, então… Eu não sei. Talvez você devesse falar com a Nyra ou o Jullian…

– A popstar? – Um sorriso mais sincero dela surgiu mais doce. – Eu e Leah somos fãs!

– Óbvio que sim, Sunna. Quantas Nyras em uma ilha você conhece? Não é um nome comum. – Dan disse com maldade.

Ártemis segurou-se para não dizer um sonoro Não! Mas se conteve, embora fosse o que seu olhar dizia. Onde ela queria chegar?!  A Pooka a olhava intrigada, e por dentro com medo do que ela diria também.

Leah arregalou seus olhos claros e se sentou direito também, por muito pouco não disse que podia ajudar também.

– Alicia já está me ajudando, já, Mary Ann… – Disse a Pooka, testando as cordas e pensando em alguma música. – Não tem nada que eu não possa ensinar para Flora. Aliás, já ensinei muita coisa.

Mary Ann se aprumou, endireitando-se ainda mais. Ladirus mirou a bela moça e estranhou. Os olhos seguiram até Leah, pedindo por alguma explicação. Claramente, havia uma tensão no ar…

– Eu posso ensinar corretamente. – Ann insistiu.

– Alicia está ensinando o quê? – Dan quis saber, franzindo o cenho. – Dicas de maquiagem? Como fazer uma escova no cabelo? Sunna tem razão, Mani. Sidhe sabe de Sidhe. Tem certas frescuras que a gente não entende. Se você não quiser um climão te acompanhando, você pode levar a Susie. – E encarou Ladirus. – Elas são ex-namoradas.

Tensão esclarecidaEx-namoradas! Ladirus apertou os lábios e coçou atrás do pescoço. O seu pensamento foi até Fayre, pensando que em breve teria que lidar com uma situação um pouco parecida. De repente, se sentiu num campo minado e silencioso. Os olhos do Dragão se voltaram para Arty, fitando-a.

Ártemis arregalou os olhos, e se estivesse bebendo algo, provavelmente já estaria fora da sua boca tamanho o susto da revelação.

– Dan, seu intrometido. Você cuida da sua vida, ok?

Leah mordeu a boca segurando um riso.

Mani voltou a fitar Ladi e se aproximou do ouvido dele para sussurrar: “Nós saímos por um tempo. Mas faz uns meses e não fomos namoradas, namoradas”.

– Você pode ir conosco na Click amanhã. – Leah convidou Mary Ann – Talvez conheçamos a Nyra.
– Mas que traição de alto nível. – Ártemis sussurrou brava.
Leah a olhou sem entender.
– Querem saber? Vou embora. – Ártemis devolveu o violão para Leah passar adiante. – Vocês vão ficar abrindo minha vida e eu só estou com ele recentemente. Vocês poderiam se comportar? Muito para se pedir?

– Calma, calma. Sentem-se. – Ícaros os tranquilizou trazendo uma bandeja cheia de petiscos e bebidas, servindo Ladi primeiro. – Vamos comer, beber… Depois vocês brigam.

– Sim… – Ann concordou com um suspiro entristecido. – Bem. Eu adoraria conhecer a Nyra, Leah, mas temo que a Click seja um lugar um pouco… Caro demais? Se bem que… – Ela pareceu pensar.

Choques o tempo inteiro: era isso mesmo? Ladirus observava cada rosto com leve humor em seus lábios selados. Não estava incomodado. Sentia-se conheceu outra cultura, embora acreditasse que não seria o caminho correto se começasse a entrar no clima de guerra com eles. Mary Ann o olhou com profundidade quando Ártemis começou a se irritar de verdade. “Olha o que você está levando”, o Dragão sentiu no olhar dela. Ladirus sorriu para a Sidhe e levou a mão até a da Pooka Gata, trazendo-a para si e mordendo o seu dedo indicador da fada, risonho:

– Arty… Está tudo bem. – Ele falou. – Eu quero te ouvir cantando ainda… – Pediu.

– Nunca está tudo bem com a Ártemis. – Dan comentou. – Parece que vive assim.

– Discordo. – Ladirus pegou um petisco.

Ladi a defendendo foi uma surpresa para alguns. Foi difícil continuar as provocações com a frase “Discordo”. Ela devia ter algo de muito bom, ou nem Ann, ou nem Ladi, estariam ali; disso Leah tinha certeza. E ele estava apaixonado, fazendo a Changeling sorrir e o beijar em um rápido selinho mesmo naquela situação e desafiar aos outros ao tomar o violão de Leah de volta.
– Casa de ferreiro espero de pau. – Ártemis falou ao fitar seus irmãos de espécie, pois acabavam a olhando com certa descrença e a deixando por um minuto menos corajosa. Leah também se sentiu um pouco mal, acabava entrando na onda do grupo e fazia o mesmo olhar pouco a levando menos a sério. Então se ajeitou no puff e aguardou a canção que ela tinha, internamente esperando por um desastre.

– Ai, lá vai ela com Uh na na de novo…

Alguém sussurrou causando alguns risinhos, e Ártemis procurou com o olhar, mas não encontrou.
– Uno, dos, tres… – Ela foi testando na contagem até encontrar o ritmo. E isso era uma novidade: a música tinha ritmo e harmonia. – Havana, ooh na-na. Half of my heart is in Havana, ooh-na-na. He took me back to East Atlanta, na-na-na. All of my heart is in Havana. There’s somethin’ ‘bout his manners. yeaah.. – A voz também estava mais firme. Leah sabia que faltava profissionalismo nas cordas vocais de Ártemis, mas para quem assistia sem saber era apenas uma voz bonita e potente que ela mostrava, acompanhada das notas do violão. E o mais surpreendente, a música não tinha mais só um refrão mal organizado: –  He didn’t walk up with that “how you doin’?”. He said there’s a lot of girls I can do with yeaah…  I’m doin’ forever in a minute.. And papa says he got malo in him  – A Pooka cantava expressiva com os olhos fechados – He got me feelin’ like Ooh-ooh-ooh, I knew it when I met him… I loved him when I left him Got me feelin’ like… Ooh-ooh-ooh, and then I had to tell him I had to go, oh na-na-na-na-na…

Ela sorriu, porque sabia que estava impressionando mesmo sem abrir seus olhos. Mas Ártemis não havia praticado além dali. Não tinha letra, um buraco que ela pensou em repetir o primeiro verso, mas então a acusariam de ter só um trecho de novo. E enquanto ela cantava novamente o refrão, sua mente rápida trabalhava em uma segunda parte. Não ia dar esse gosto a eles, não vou mesmo. Então improvisou: –  I knew I was there when I read the sign. – “O que mais?” – I knew it was him when he hugged from behind. Now he puts in work, but he’s in the streets.  Now this is the part that my daddy told me. He got me feelin’ like – Ela começou a segurar o riso no meio da canção, porque havia conseguido – He got me feelin’ like Ooh-ooh-ooh, I knew it when I met him… I loved him when I left him Got me feelin’ like… Ooh-ooh-ooh, and then I had to tell him I had to gooo… – Sorriso não morria, e ela finalmente abriu seus olhos e fitou Ladirus para saber o que ele achava, enquanto retornava ao refrão. Depois encarou aos outros, deixando o violão com Mariah como se fosse uma estrela do rock e terminando o último verso somente na sua voz poderosa, com seus ooh e na-na-na…

– Yeah! – Ela saltou e gritou no final antes que eles mesmos decidissem tocar palmas. Que Leah e Suzane acabaram puxando junto de Joseph e Ícaro.

– Você conseguiu Mani! – Disse Joseph – Sabia que você conseguiria.

– Ficou muito boa, Arty! Parabéns… – Leah falou impressionada, mas até fazia sentido se ela tinha começado a andar com músicos.

– Toma essa! Tá bom!? – Ela se aproximou de Dan e disse, e passou encarando Mary Ann como se tivesse ganho uma competição. Curvando-se entre os parabéns. Um ano depois e a canção estava praticamente terminada.

A Kithain voltou para Ladirus, sentando em seu colo e o abraçando. Ladirus esperava que os seu olhar brilhante como as estrelas vigiantes no céu e o sorriso que não saiu dos lábios um segundo sequer tivessem sido o bastante para que ela encontrasse forças para continuar se a timidez surgisse e suas próprias forcas precisassem de uma ajuda. Ele a abraçou fortemente e apertou-a contra si, esboçando um sorriso maior que quase fez sumir os olhos pequenos e puxados… – Que evolução! Você só errou duas notas, Arty! – Ele sussurrou para ela, beijando-a em seus cabelos e sentindo-se orgulhoso. Ela deve estar praticando bastante. Lembrava-se do violão da cama ao lado quando adentrou o quarto.

O Dragão quis saber o resultado e encontrou Mary Ann corada da sua admiração silenciosa e Dan ainda batia palmas.

– Temos uma música finalmente, pessoal?! É isso que ouvi? – Ele brincou e ergueu-se para pegar um petisco. – Beleza, bichana. Hoje eu não vou te zoar. Você foi bem.

Havia mais fadas próximas, atraídas pela música.

– Mariah, passa esse violão pra cá! Eu vou cantar agora!

Os olhos do Dragão acompanharam a menina atarracada dentro de uma roupa que não parecia adequada ao seu corpo roliço. Ela trajava uma blusinha cor-de-rosa e uma saia jeans muito curta – e o corpo parecia querer sair da veste insistentemente. O seu pescoço muito curto e grosso lhe fazia uma impressão de ter sido achatada. Os cabelos eram longos e alisados com chapina, movendo-se unidos um ao outro, em tons de loiro claro e escuro.

– Destiny! – Mary Ann bateu almas.

Ártemis nem percebeu ao redor quando se sentou no colo de Ladi, beijando-o no rosto e rindo de felicidade. Assentiu sobre precisar aperfeiçoar, mas era a primeira vez que a completava e a sensação a deixou realmente orgulhosa de si – especialmente porque a descrença geral era sempre muito forte.

Destiny… Leah a olhou com o maior sorriso que conseguiu, embora exatamente forçado. A Boggan era muito gentil, como todos, mas tinha uma aspiração para ir atrás do que não sabia fazer ou onde não sabia se encaixar que era até incrível.

– Oi, Destiny… – Leah acenou. – Cante aquela música da última vez…

Ártemis a olhou e permanecia abraçada a Ladi. Da forma que tinha aquele sorriso inteligente, o humor dela não se abalaria mais fácil ao decorrer da noite… Costumava apenas achar tudo o que Destiny fazia esquisito, mas estava calma a ponto de qualquer outro olhar de Mary Ann ou de qualquer que quisesse a irritar fosse um mero detalhe.

– Leah… Eu vou fazer um cover mesmo. Eu não sou muito boa em compor, já percebi. – Ela disse, rindo com a língua perdida e uma simpatia cativante. – Deixo a composição para essa exibida aí da Ártemis! – Brincou. – Mas eu prometo que vou agradar todos os meus fãs!

Ela se virou para Ladirus, piscou um dos olhos e enviou-lhe um beijo antes de começar o seu cover de ‘All I Ask’. E cantava até bem. Ladirus ria com as graças que ela fazia, sensual sem ser sexy. Havia palmas seguindo a música, principalmente as palmas de Mary Ann. Ao decorrer da noite, todo mundo parecia hábil a realizar algum tipo de arte e Ladirus se entretinha, com Ártemis em seu colo, acompanhando as apresentações com sorrisos cativados por aquele povo curioso. Ele nem acompanhou a passagem das horas ou sequer sentiu necessidade de vigiar a sua dieta.

Não teriam privacidade naquele lugar e Ártemis estava até bem com isso. As horas fluíram noite adentro, comida e bebida e conversa sobre histórias e batalhas. O clima não era tão intenso quanto no início, mas era nítida a vontade de também se pegar no pé de Mani o tempo inteiro. Embora a paz dela fosse quase inabalável ao lado dele. Quando o céu começou a clarear, pareceu certo que a maioria precisava correr para casa para vestir suas vidas normais. Ártemis se sentiu sortuda por sua vida não ser mais tão normal. Nyra havia enviado muitas mensagens perguntando de Ladirus, indagando quando ia retornar de onde ela nem sabia para onde tinha saído. Preocupada. Então era melhor não se distraírem mais por aí, embora Ártemis até tenha proposto uma volta por aquela floresta mágica.

E dali, voar de volta para a Ilha foi como ter tempo para guardar todos os risos e beijos divididos naquele noite. Estava feliz e se sentia muito leve, perguntando-se se era consequência de estar apaixonada.

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