Veronica

Categorias:Romance
Wyrm

Veronica


Deliberadamente irritado, Neil caminhava com passos de chumbo sem corresponder aos cumprimentos de boa tarde que recebia – sendo ele sempre tão educado e cortês. O Arquimago seguia para fora do castelo com um coração pesado e partido ao meio, sangrando a tristeza de um arrependimento endurecido. A sua relutância em cortejar e expressar os seus sentimentos puros pela princesa do castelo tinha se transformado em uma problemática mais grave, em sua opinião. Se conseguia se ver indigno de estar ao lado da bela Aisha Arnezeder, não encontrava sequer palavras para descrever a deplorável atitude de Acksul em envolver a frágil e carente princesa popstar.

Apesar do drama ter forte importância em seu íntimo, ele não estava distante de suas irritações. Neil sentiu a sua garganta quase se fechar, arrepiando-se com a manifestação energética distante. Ele resfolegou, entreabrindo os lábios. Problemas?! Soluções…? Mal teve tempo de refletir ao ouvir um helicóptero pousando, tendo a forte sensação de que estava no lugar certo e na hora certa. Franzindo o nariz e acabando a visão para enxergar através do Sol quente, Neil aguardou acompanhou a descida da aeronave.

Óculos escuros, joias que decoravam seu corpo moreno, e um leve vestido de cetim preto, curto, alcinhas finas e um longo e generoso decote em V. Longas sandálias de salto fino que laçavam seu tornozelo até o meio da perna. O batom vermelho forte, desenhando e preenchendo todo seu lábio oval, combinavam com a personalidade do loiro e curto que usava. Ela usava um peculiar lenço vermelho no pescoço, longo o suficiente para se abrir e cobrir todo seu braço esquerdo, que ela o sustentava dobrado e na altura do abdome. Havia se acostumado com a dor, mas não conseguia parar de pensar e se preocupar na possibilidade de amputá-lo e recoloca-lo em algum efeito absurdamente traumático. Os óculos escuro engava bem as caretas que fazia vez e outra.

Antes de pousar, seus olhos admiraram a extensa ilha; mas seu sorriso não durou muito para a beleza do paraíso ao ver Neil a aguardando no topo do telhado, perto ao heliporto.

– Droga… – Murmurou para si. Prendeu a respiração e massageou as têmporas. – O que você está fazendo aqui.

O helicóptero parou e o piloto desceu para abrir a porta para a celebridade. Ela retardou, mas desceu sem pressa. Pegou a própria bolsa e a pendurou no ombro com o braço saudável. Antes de se virar para o mago, tentou lembrar dos detalhes da vida que levou por anos ao lado do seu mentor. O melhor que já teve… E o único. A arrogância de Veronica no passado a tornou uma aprendiz difícil, mas Neil sempre foi muito paciente em  tentar abrir seus olhos. ‘A virtude de um mago é saber que não sabe o suficiente’. E essas palavras a levaram longe… Até hoje, em raras noites, pensava se deveria ter feito o que fez. Mas se todos decepcionavam em alguma altura da vida, talvez essa tivesse sido a sua. Com ele. Mas ainda… O quão suspeito era ela mesma para o inteligente mago? Será que era amada o quanto ele demonstrava? Por que eu fiz o que fiz?

Quando se virou e caminhou na direção dele, ela abriu o sorriso mais doce e espontâneo possível. Fazia alguns meses já. Ela parou alguns metros de distancia de Neil e manteve.

– Uau… – Riu sem graça – Que surpresa… – O sorriso morreu lentamente – Eu não imaginava que estaria por aqui…

– Eu duvido, queridinha…

A expressão não dita, vazia como o seu olhar, se manteve intacta como a sua postura altiva dentro do seu terno marrom claro e a sua camisa branca. Neil segurava as próprias mãos à frente do corpo, dedos tão frouxos como o seu credo em vê-la diante de si. A ilusão era a barganha para a sua surpresa. Cansara de vê-la em fotos públicas com Aisha e já contava com um possível reencontro. Contar e planejar como agir se provaram práticas inocentes. Por detrás da máscara de indiferença que caia aos poucos, existia o homem magoado, preocupado e hostil – nada calmo. Os olhos ganhavam a inconstância de um choque e as perguntas não respondidas estavam todas em seus lábios que se encrespavam…

– Estamos exatamente onde deveríamos estar agora. – Ele afirmou, respirando acelerado a menina que perdia paciência que lhe restava. – Você mudou o seu cabelo!  – Disse, com cinismo. – O que mais mudou, querida Nikki?

Veronica voltou a sorrir, escondendo o olhar que respondia ao cinismo por detrás do óculos preto.

– Espero que tenha gostado. Minha aparência é muito importante para mim, assim como opiniões. – Ela mordeu o canto do lábio vermelho e o soltou, pensando na resposta – Muita coisa. Eu sou jovem, as coisas tendem a mudar rápido. Eu acho que eu poderíamos tomar um suco mais tarde, mas não estou afim de conversar debaixo desse Sol. Nesse salto. Agora. – Ela mantinha a postura e a certa distância, muito diferente do jeito carinhoso que costumava o tratar  – Até mais tarde? – E simplesmente caminhou em direção à porta para as escadarias, lutando para não apertar o próprio passo e continuar a caminhada com elegância.

Não houve uma resposta verbal. A ingratidão que ele enxergava fez os lábios finos se encresparem ainda mais. Neil a acompanhou caminhando, tão desgostoso que nem a ideia de Polaris estar se envolvendo com Aisha pareceu maior urgência. O seu sumiço foi um golpe de vários sentimentos e teores. Talvez tivesse muito a se explicar, mas culpava-a por simplesmente se distanciar. E sabe Gaia o que mais! As coincidências estavam presentes dolorosamente. “A minha mais habilidosa aprendiz, Veronica, está aqui na ilha, acabou de pousar…”, o Arquimago lançou a mensagem mental a Drawn, “Eu duvido que seja para visitar Aisha… Ela é metida com muita coisa, bem sei! Péssimo dia para se comemorar o Solstício…! Estou de tão mal humor!”. Neil se virou para caminhar na direção oposta e perdeu qualquer cor que a sua revolta houvesse trazido ao seu semblante.

Diante de si, no começo dos degraus que levavam para o heliporto, Hawky o mirava. Neil a reconheceu de pronto. A morena sorria seladamente com os seus lábios médios e retros. Os olhos contornados e ressaltos por delineador preto, sensuais e puxados aos cantos se divertiam com ares de travessura. Usava as sobrancelhas grossas e retas e os cabelos levemente ondulados e muito negros emolduravam o seu rosto jovem, cortados com uma franja reta, curta e curva aos cantos. Pescoço, pulsos e dedos eram forrados pelos mais diversos tipos de joias coloridas, em madeira e douradas traziam um ar egípcio em sua beleza argentina, assim como o vestido curto de mangas largas feito em linho branco que usava e as sandálias gradiadoras douradas sem salto.

À sua mão, uma pomba feita de névoa se debatia. Neil a encarou de volta, incomodado, e ouviu o próprio pensamento vir de dentro da criatura de ar. Ele adiantou um passo, mas Hawky negou com a cabeça, fingindo irritação antes de erguer a saia do vestido e sumiu em um redemoinho breve.




Com uma careta de descontentamento, Polaris ouviu o que lhe foi enviado, agarrando o invisível no ar e soltando-o quando a mensagem terminou. O suspiro cansado trouxe um desânimo breve aos olhos azuis. Rapidamente, reorganizou os seus irmãos e posicionou-os. Já devia ter convencido que paz seria um sentimento mais raro a medida que a ilha ganhava visibilidade. O cenho franziu, recobrando a firmeza ele se encheu de ar, inspirando profundamente, e se endireitou. Os probleminhas amavam o showbizz, ao que parecia? A ilha tinha portas abertas para grande parte das celebridades, até as que não deveria. Polaris acompanhava as aves coloridas de Jullian pulando felizes pelos galhos de árvore e retornando ao viveiro para se alimentarem das frutas. Veronica.

Ele sabia muito bem quem era Veronica. Convivera até demais com a moça enquanto se recuperava na casa de Neil. Inteligente e talentosa com a Mágika. Ou seja, um possível problema. Pelo que notava, Neil não estava tão inclinado a praticar o mínimo da segurança e questionar a sua presença na ilha. Umedecendo os lábios, o Dragão negou com a cabeça e desviou-se. Vinny chegava na Casa de Vidro e era recebida por um surto de emoções de Rhistel que já tratou de mostrar a ela o seu single. Polaris observou o Dragão de Gelo de longe. Ladirus estava próximo a ele, tentando não parecer preocupado. Enquanto aguardava por Nyra, o Dragão da Matéria enviou uma mensagem mental a Blair: “Precisarei de você daqui a pouco”.

– Você a viu…? – Ele perguntou.

Hawky surgiu com as mãos às costas. O lábio estava mordido e a sua mente parecia tão distante quanto as nuvens no céu.

– Não, eu não vi. – Ela respondeu. A sua voz possuía um forte sotaque argentino. – Mas vi um problema, irmão…

– O quê?

– Neil… – Ela franziu o cenho.

“Eu estou preocupada com o Rhistel… Ele está mais calmo do que eu vi antes, mas… Parece que pode acontecer qualquer segundo.” Blair disse de volta, antes de escutar sobre o que ele precisaria.

“Ele pode ir com você. Preciso que você cheque uma coisinha…”, o Dragão respondeu com humor enquanto a assistia seguindo Rhistel.

Nyra desceu as escadas da sala e trocou olhares com os presentes. Fez um beicinho ao desviar para qualquer canto, e continuou para os fundos e o viveiro, um dos lugares preferidos do Dragão da Matéria. A loba estava em uma saia rodada branca, na altura dos joelhos, e um tope fechado até o pescoço, e regatas que deixavam seus ombros e braços inteiros expostos. Toda a veste era muito leve e confortável, assim como o salto plataforma que usava. Os cabelos continuavam no negro e os lábios pintados de rosa nude, embora os olhos estivessem sempre carregados com o lápis e os longos cílios, e as unhas pintadas na cor do batom longas e bem cuidadas.

A atenção da Loba parou em Hawky antes de ir a Polaris. Nyra sorriu para a Dragonesa e se aproximou devagar.

– Olá, Hawky. Estou feliz que esteja aqui… Embora eu tenha certeza que nada é mais interessante que o céu…

O sorriso de Hawky era doce como o seu abraço. Ela se aproximou de Nyra com uma leveza que compelia ao seu elemento. Um abraço leve e aconchegante, tão carinhoso que fazia sentir não somente o seu corpo fresco, mas também a sua alma – envolvendo Nyra com um coração que se abria como nuvens que se afastavam para desnudar o Sol. Ela descansou o rosto no ombro da Garou e inspirou antes se afastar para olhá-la com os olhos vivos e animados, quiçá puros:

– Você é tão linda. – Ela tocou os cabelos escuros, entre sorrisos que iam e vinham. – Ah! Eu… Gosto muito de voar. Você deveria voar comigo. Tenho certeza que serei a melhor experiência que você já teve por aqui. – Ela pegou nas mãos da Theurge, admirando-a. – Obrigada por me acolher. Eu sou muito grata.

Calado, Polaris apenas olhava de uma para a outra. Desviou-se apenas quando ouviu a gargalhava de Rhistel na casa enquanto o Dragão chacoalhava Vinny.

“Cuidado com ele”, apertou Blair.

“Você não estava aqui, mas ele quase implodiu a casa, eu segurei o vidro todo e acho que ninguém percebeu como eu percebi.” Disse apressada, mantendo o sorriso enquanto tocava o braço de Rhistel para ele soltar Vinny gentilmente.

“Eu senti de longe…”, Polaris respondeu com ares pensativos.

Nyra piscou seus olhos devagar e abriu o maior sorriso que tinha à Dragonesa. Ainda tinha aquela sensação mágica em seus braços quando afastou-se do abraço. – Você é tão linda e etérea. É claro que eu quero voar com você. – Ela riu. – Me busque qualquer hora. Eu preciso muito, muito disso. Ando tão estressada ultimamente…  Estaria menos se as pessoas que me ajudassem estariam mesmo dispostas a ajudar.

Os dedos da Dragonesa acariciaram os dela. – Que tal… Amanhã, antes do nascer do Sol? Eu te levo para ver o raios surgindo em um lugar bem bonito. – Hawky abriu um sorriso e riu. – Estresse não é bom! Eu nunca me estresso com nada.

– É. – Polaris concordou pouco animado. – Hawky, querida, pode ajudar Blair com o nosso irmão de gelo? Receio que Ladirus esteja mais entretido com a princesa russa do que proteger a todos…

Mais séria, ela assentiu, mas virou-se novamente para Nyra, aguardando a sua resposta.

Nyra olhou para a casa brevemente, não viu Ladirus, mas percebeu Rhistel ainda agitado e Blair seguindo-o com seus olhos focados. Nyra teve certeza que Blair não esperava aquilo, e se perguntou se ela poderia estar com medo. Dificilmente. Mas que era preocupante era.
Quando se voltou para Hawky, tinha um novo sorriso:

– Eu aceito. Com certeza! Passar algum tempo com você será saudável. Obrigada, Hawky.

“O que você precisa…?”, Blair perguntou, “Aconteceu algo?”.

“Veronica, a popstar, está aqui. E ela é uma antiga aprendiz do Neil…”, Polaris disse calmamente, “Neil pareceu tenso ao falar dela. Eu quero saber o que ela quer aqui. Em pleno Solstício? Estranho…”.

– Certo! – A morena novamente abraçou Nyra, apertando-a com carinho antes de soltá-la. – Eu vou acalmar Rhistel… – Ela disse com certo humor antes de se afastar com pulinhos infantis, adentrando a casa.

Os olhos azuis de Polaris a seguiram até que ela entrasse na casa. Finalmente, pousava os olhos em Nyra, buscando por seu olhar. O Dragão franziu o cenho, inspirando profundamente antes de dizer. – Eu queria… Hm. Desculpe… – Ele molhou os lábios. – Eu não devia ter saído daqui e prometo que já jamais farei isso desse jeito novamente… – Apertou os lábios. – Desculpe pelo atraso hoje também, eu… Me compliquei. Desculpe por não ter vindo antes falar com você… Desculpe por… Ser difícil, às vezes, e não querer te ouvir… Eu esqueci você é a minha Rainha e acima de qualquer coisa, eu te devo respeito… Então… Eu decidi respeitar as suas decisões… Daqui por diante, sem contestá-las… Eu não quero que isso vire uma bagunça… Desculpe, desculpe, desculpe… – Aproximou-se em um passo.

“Veronica…? Curioso. Perigosa. Já fez tratos com a Mensageira… Melhor eu ir vê-la.” Blair sussurrou ao ouvido de Rhistel, chamando-o para ir ao Castelo. Mas adiou naquele instante ao ver Hawky se aproximando.

Nyra o escutou levemente desconfiada, mas foi quebrando sua barreira lentamente… Desfez os braços cruzados, sorriu e assentiu.

– Mas não te perdoo por ter me feito esperar. Eu não acredito que estava com a Aisha, Acksul… – Arqueou a sobrancelha – Vocês ainda precisam manter discrição… Lembra? A reunião foi um inferno. Não deixe ninguém os ver.

Com os olhos arregalados, ele cobriu os lábios com os dedos. Ele não iria negar. Já era óbvio demais desde a sua saída à francesa. O Dragão acabou rindo, negando com a cabeça. Por raridade, estava tímido. – Ah… Tenho certeza que você vai agradecê-la! – Ele riu novamente. – Eu estou me sentindo tão calmo… Bem calmo. Eu achei que teria uma noite selvagem pela forma que fui abordado e tive uma noite romântica e cheia de carinhos. – Ele a abraçou, carinhoso. – Ela me fez massagem, acredita? Mas ela sabe que não podemos posar como um casal… Conversamos sobre isso… Os russos a consideram uma Colladel…

Nyra esperou-o negar, mas ele não fez questão simplesmente porque deveria ter sido excepcionalmente bom. Um lado da Aisha que desconhecia.

– Aisha… – Nyra o olhava feliz e era absurdamente estranho – Até conversaram… Hmmm… Vocês… Estão sérios agora ou coisa assim? Eu estou perguntando porque tem muita coisa acontecendo debaixo do meu nariz. Olha só seus irmãos. – Franziu a testa – Eu nunca imaginei vocês dois. Ela é bem… Humana… Tenho certeza que nem queria estar no Solstício.

– Sério…? Eu não sei… O que precisa para ser sério… – Ele estranhou, olhando-a com humor em seus lábios cheios. – Ela não entende o Solstício… Talvez se espante com as danças e a música. Com certeza está mais animada para o banquete natural que vocês organizaram. Capaz de não ficar muito para ver o que acontece. – Polaris ergueu os olhos para a casa. – Eu não me preocuparia com Rhistel. Ele está com alguém que se importa muito com ele. Eu não sei se eu diria o mesmo de Ladirus, pois a princesa parece que aprecia uma rebeldia como ninguém.

Nyra respirou fundo e insatisfeita. – Muito rebelde a princesa. Ladi era um anjo, estável e… Um pouco mal humorado, mas responsável. Agora? Perdi-o completamente. Roubado. Nunca mais será o mesmo. – Nyra fechou os olhos chorosos. – E você agora… Tive que terminar sozinha o Ritual, eu já estava tão cansada, Polaris.

– É só uma fase… Ladirus só está meio tonto. Vivenciando coisas novas. Você também não ficou meio tonta quando teve o seu primeiro amorzinho? Ele está meio idiota. A princesa é linda demais e tenta-o o tempo inteiro. – Polaris a olhou, despreocupado. – Eu… Ah. Desculpe! Eu queria ter vindo antes, mas… Nay… Eu tenho certeza que você fez algo incrível… Eu estou curioso para vê-lo!

Nyra o olhou entediada com o discurso. – Não fiquei boba não. Eles que ficavam. Eu nunca. – Negava – Só porque você tem um coração não te dá direito de ser irresponsável. Como se eu merecesse isso. – Afastou-se magoada – Quero só ver. Até agora só mancadas. Daqui a pouco não vou contar com vocês pra mais nada mesmo.

– Não daremos mancadas! Eu prometo que este ritual será o melhor de todas as vidas que estiverem envolvidas nele… Eu quero que se divirta! – Ele caminhou rapidamente, ficando frente a frente com ela. – Você e sua Alcateia, sei que deram duro… Então… Deixe que os pormenores nós tomamos conta… – Ele franziu o cenho, olhando-a. – Eu te prometo…

Nyra arqueou as sobrancelhas e apertou os lábios.

– Promete? Ok. Promessa é dívida, Polaris. Aí de vocês. – Ergueu o indicador – Coloco vocês todos de castigo. Não fique bobo, tá? E fale com o Ladi. A princesa só quer se divertir e daqui a pouco ele está apaixonado. Se eu falar, ele vai concluir que é ciúmes e não vai me ouvir.

“Meus irmãozinhos apaixonados… Ai, ai”, A voz se divertiu “Eu estou no Umbral…” Nina disse na mente de Polaris. “Pode trazê-la aqui?”.

– O que eu deveria dizer a ele, Nay? Não se apaixone demais? Eu não posso fazer isso! É pior… – Polaris gargalhou, negando com a cabeça. – Eu posso ordenar para que ele se comporte… Mas não posso fazer o mesmo com a princesa selvagem. – Ele lhe ofereceu a mão. – Largue as suas preocupações por um momento. Eu quero te mostrar alguém que está bem tímida para falar com você.

– Acksul… Você pode dizer que nem sempre as pessoas envolvem sentimentos em sexo. Escutou? – Olhou-o pouco animada. – Gaia. Se for algum problema, eu não vou conseguir ser simpática. Da última vez que você trouxe alguém para a Ilha era a Mensageira. – Segurou a mão dele para atravessarem, e o susto foi imediato. O último entre os nove Dragões. Imenso, indomável, com faíscas circulando como a própria tempestade por seu corpo. Se não estivesse tão acostumada com todos eles, seu coração teria saído pela boca. Mas ela, a Dragonesa, estava precisamente domesticada com seu corpo deitado no chão, aguardando… Dos olhos, Nyra apenas podia enxergar energia. Uma forte sensação elétrica percorria seu corpo e formigava a palma de suas mãos. Tinha certeza que ela poderia controlar seus impulsos se quisesse, mas ela apenas observava.

– Vocês querem que meu coração exploda… – Nyra murmurou e se aproximou devagar. – Qual o seu nome?

– Bellatrix… – O corpo imenso se ergueu e as garras perfuraram o chão umbral. Nyra sentiu a pressão estática na terra… – Ou Nina, como eu acho que você prefere…

– Nina!? – Nyra a viu assumir a forma humana, da querida Garou que a acompanhou em um momento difícil da sua vida, e sua boca não se abriu mais porque não conseguiu.

Polaris fechou brevemente os olhos, guardando a imagem da irmã em sua forma real ao se encontrar com uma memória. Dias dolorosos, mas formados por aprendizados. Ele inspirou, sentindo-se melancólico por um instante. Talvez o seu dia tivesse decaído se não encontrasse Nyra ao abrir os olhos. A saudade dolorosa chegou a tocá-lo, mas não ficou em seu coração por tempo suficiente para entristecê-lo…

– Nina… – Ele disse. – Você acha mesmo que eu deixaria a ilha sozinha? – O sorriso maldoso surgiu em seus lábios. – Seria… Melhor que a grande maioria pensasse que Nina é uma Garou. Dragão-surpresa.

– Então você é um espertinho que pensa em tudo, né? – Fitou-o apertando os lábios entre um sorriso e o empurrou de leve. Mas logo se focou em Nina e apressou-se para abraçar a irmã que sentia que ela era. – Eu senti tanta, tanta sua falta!

– Eu também! – Nina a abraçou de volta, forte, apertado, e se soltaram rindo.

– Eu não acredito! Eu estou muito surpresa! – Dizia nervosa – Por que não me disse na época!

– Você sabe o porque não. – Nina riu e negou – Eu estou aqui agora. Precisei de um tempo.

– Eu imaginava… Tantos anos presa… – Tocava-a nos ombros e braços, checando sua realidade. – Eu estou muito feliz!

– Eu também!

E se abraçaram de novo.

– Mas e agora?! Ninguém pode saber… ? – Nyra fez um beicinho – Você não está magoada?

– Não! Eu prefiro assim, na verdade…

Nyra se virou para Polaris, checando se era verdade.

– Nós faremos uma reunião entre os nós. É uma opção a mais de segurança, Nay. Nina não quer dar as caras e eu acho que isso pode vir a ser útil… – Acksul passou a língua pelos lábios. – Ainda mais com o showbizz ficando aqui. Sinto que esse meio é infestado de criaturas de índole duvidosa. – Ele cruzou os braços, olhando de uma para a outra. –  Cada dia que passa, eu sinto que precisamos de mais segurança.

Nyra parou ao lado de Nina e a agarrou pelo braço. As frases de Acksul trouxeram dúvida para a Theurge:

– De quem você está falando? Bem… Eu tenho certeza que dominado por criaturas sobrenaturais. É muito fácil quando se tem Dons e modos de dominação sobre os humanos… Qualquer um pode ficar famoso…

– Não dá para confiar em ninguém com mais de cinco milhões de seguidores no IG? – Nina riu.

– Cinquenta mil e já é suspeito. Eu concordo sobre segurança… Eu sei que vocês são fortes e são mais que uma Alcateia… Mas… O que me preocupada são as peças pequenas… – Nyra desabafava – Que conhecem vocês… Os lugares onde não prestamos atenção… Sempre vai haver uma fresta…

– É e não somos os melhores em nos ocultar. Com exceção de Nina e Hawky, furtividade não é muito o nosso forte. Qualquer criatura minimamente poderosa e atenta consegue nos detectar… – Polaris tocou o lábio inferior. – Eu estou falando da Veronica. Nikki. Amiguinha da Aisha. Morena, cara de boneca, fatal… Hawky interceptou uma mensagem de Neil para Drawn sobre ela. – O Dragão da Matéria se voltou para Nyra. – Nay. – Ele franziu o cenho. – Depois do Ritual do Solstício, eu acho que seria adequado que algumas decisões fossem tomadas. Principalmente, sobre o grupo do Sebastian…

– Oh, Gaia. – Nyra fez uma expressão agoniada – Se está falando da cantora… – Nyra arqueou a sobrancelha – Eu sei que ela é muito amiga da Aisha. Vivem se apresentando juntas. Mas não sei nada. Qual o problema? O que ela está fazendo aqui em pleno Solstício? E por que Neil teria algo para falar sobre ela para o Drawn?

– Calma, Nay. – Nina a envolveu pelos ombros e esfregou sua mão no braço da Theurge carinhosamente – Acksul já colocou alguém para investigar isso, tenho certeza.

– Como Sebastian está? Recuperado?

– Quase. As Dançarinas do Crepúsculo estão finalizando o tratamento deles. – Polaris disse, mas não demonstrava ter certeza do que dizia. – Eu acho. – Completou. – Eu tenho certeza que eles estão aqui pela Marisa Esmeralda. Sobre Veronica… Blair a conhece e irá investigá-la. E, sim, eu estou falando da cantora.

Nyra respirou fundo e desejou ter algum lugar para se sentar. – Às vezes eu acho que a Aisha é um ponto vulnerável demais. Ela tem que parar de encher a Ilha de amigas que acha que conhece. – Nyra abaixou o olhar pensando – Se a Blair conhece de algum tempo passado… Dificilmente é coisa boa. Espero que seja aliada no mínimo. Temos que começar a restringir acesso… Não só à Árvore… – Sua mente rápida a deixava falando quase sozinha – E pensar melhor em tanta companhia de Magos. Eu não ligo para a Mágika que eles tem, mas eles não pensam como Lobos. Exceto por Drawn e Blair… Eu acho…

Nina a olhou com leve preocupação, sempre achava que a Garou pensava demais à frente. Antes, se pensava que era por causa da gravidez, agora não tinha tanta certeza.

– Guarde isso para amanhã, Nyra. Se preocupe com as coisas que você planejou para hoje. Eu e meus irmãos vamos terminar os detalhes e cuidar da segurança. Ok?

– Ah! – Nyra a olhou – Você pode ler minha sorte antes?

– Hmmm… Um chá gelado antes?

Nyra concordou.




Apenas quando se distanciaram da Casa de Vidro e Blair os transportou direto para o castelo, Rhistel pareceu começar a encontrar o próprio cerne sem se aprofundar somente nele. Ele pareceu estranhar ao olhar para as paredes de quadros pintados com os rostos de muitos conhecidos, franzindo o cenho com hesitação. Questionava até o seu trajeto até ali e pareceu ainda mais confuso ao fitar de Blair, Vinny e, por fim, Hawky.

A irmã de Ar se divertiu, rindo baixinho. Ela se voltou para as duas garotas e depois novamente para o irmão:

– Ras… Você está com alguém que gosta muito de você. – Ela disse, rindo novamente. – Outra garota teria fugido, com certeza. Nunca mais voltaria.

Rhistel franziu o cenho, olhando-a incomodado e não encontrando a graça que até Lavinia achou e ria.

– Você está bem? – Vinny perguntou, tocando-o sobre o ombro. – Sente-se bem?

– Com um pouco de enxaqueca. – O Dragão de Gelo murmurou, receoso. – Já estão falando de mim, Vinny…? Você pode ver?

– Eu acho melhor você relaxar agora. – Ela sorriu para ele. – Eu vou buscar os meus companheiros de Alcateia. Nos vemos mais tarde?

Blair também acabou rindo, mas negou em seguida. Estava andando do lado do Dragão de Gelo, mas não o tocava porque estavam no castelo. Mas no fundo ainda estava pensando nele e preocupada…

– Oba. – Blair sorriu para Vinny – Estou curiosa para conhecê-los. Todos virão? E… Bem… Se você e sua Alcateia não quiserem ficar para se preparar para o Solstício pelo castelo por causa dos humanos, podem ficar na Casa Azul. – Olhou Hawky – Eu acho que os Dragões vão se arrumar pela casa de vidro, eu imagino, eu vi a Nyra comprando mil roupas e acessórios. – Riu – Ela adora vestir todos vocês e isso é muito fofo e carinhoso.

– Os mais próximos sim, Cassian e Tyler. O restante… Eu não sei. Talvez passem em outro lugar, mas eu convidei. Espero que venham. – Vinny tocou as bochecha com os dedos indicadores. – Eu acho que eles vão se sentir mais à vontade na sua casa! Farei isso. Tyler principalmente vive com medo do ataque de fãs.

Curioso, Rhistel se voltou para Vinny pensando se um dia iria temer também ataques de fãs.

– Nyra é muito doce… – Hawky respondeu com um pulinho de alegria. – Exatamente como eu imaginava. Ela vai nos vestir, mas não temos muito o que vestir no ritual do Solstício né… É muito quente… – A Dragonesa riu com naturalidade. – Todas aquelas fogueiras, incensos e essências queimando…

– Deveríamos ir todos pelados.  – Vinny disse com seriedade, embora não estivesse falando sério.

– Eu concordo. – Hawky concordou, sincera.

Rhistel apenas riu.

– Eu vou ficar perto de você, Ras. – Ela o abraçou, carinhosa. – Nem pense em se afastar de mim, ouviu?

– Huh-hum… – Rhistel a tocou nos cabelos, sorrindo.

Vinny observou os dois antes de se voltar novamente para Blair. – Eu vou pra lá depois, então! – Lavinia acenou antes de sumir para o Umbral.

Blair acenou para Vinny e sorriu animada para si.

– Acho que a Nyra sabe que são roupas leves e poucas. – Riu – Ela quem me passou o vestido da festa do Salão, e era pouca roupa. Eu… – Mas se interrompeu ao ver um garoto na casa dos seus quinze anos andando cheio de sacolas nas mãos. Quando viu Blair, ele abriu a boca e correu até ela, a maga parou de andar.

– Senhorita Valerius?

– Sim… São para mim? – Adivinhou rápido, e o rapaz concordou.

– E essa aqui é para a senhorita Thorheim. Foi a rainha que deu. Eu vou deixar na sua casa.
A Maga o olhou brevemente.

– Deixa eu ver. – Blair folheou algumas das sacolas brancas e pretas, cheias de requintes e caixas de presentes. Perfumes, joias, vestidos, e até flores e cartas. – Hm. – Blair leu as etiquetas “Romanov”, “MorningKill” e “Thorheim”. – Eu sei que você precisa fazer seu trabalho e entregar em segurança. Então deixe-as conforme te orientaram.

Ele assentiu obediente e depois suspirou cansado:

– O ruim é que não me deram nem uns trocados para uma coca. Tá um calor danado, eu nessa camisa, e tive que decifrar esse sotaque russo horrível.

– Eu posso imaginar. – Blair riu e colocou algumas notas no bolso da roupa dele e o assistiu ir. Quando se voltou a eles, algumas portas antes do lugar onde Veronica e Aisha estavam, Blair os avisou: – Veronica é muito agradável, bonita e habilidosa. – Explicou aos dois antes de voltarem a andar – Ela tem uma habilidade aperfeiçoada com Entropia… Ou seja… Se há alguma chance de qualquer coisa sair errado contra nós, vai sair. E também consegue enrolar nossa mente com facilidade… Somente com Entropia.

“É fácil deixar verdades escaparem perto dela… E aura que ela carrega faz qualquer um confiar e achar que tudo vai continuar bem perto dela… Mas ela controla probabilidades de uma forma assustadora. Mas a melhor Esfera dela ainda é a Matéria… Então, perto desses magos é necessário ter atenção em relação a qualquer matéria, especialmente ferros, próximos… Podem se transformar em qualquer arma antes que se perceba… Inclusive matérias extremamente raras e perigosas.  – Falava em tom normal, mas cada palavra isolada por um campo de correspondência e força para que não fossem escutados – É bom manterem a mente fechada e as suspeitas até termos certeza absoluta do porque ela está aqui…  Mas desconfio que seja refugio. Ela sabe demais. E também… É algo que ela esconde muito bem… Alguns podem achar que ela controla Vida com excelência… Mas ela é uma Garou-Maga. Veronica se afastou da Sociedade Garou, é uma loba solitária… – Voltava a caminhar devagar – Quando ela precisa estar próxima de uma Seita para rotinas de rituais, mensais ou anuais, ela visita uma no centro do país. Bem longe daqui. Acredito que é a única Seita que ela visita… Corações Solares, o nome. E assim consegue viajar por aí sem levantar suspeitas além da fama humana. É excepcionalmente difícil identificar como uma Garou. – Falava devagar e com calma – Eu acho que o estilo de vida dela se deve ao fato de ela ter sido vendida quando era criança, essas fugas e vida sem rastros. Pais humanos pobres. Foi o que eu descobri na época que ela fez negócio com a Mensageira… Em troca de algumas coisas… Eu a enganei, e ao invés de dar um acessórios de invocação, que alguns dos meus subordinados tinham, eu a dei um Cristal de rastreamento. Eu achei que seria útil saber por onde ela andava e o que fazia… Eu escondi essa informação. – Fitou-os – Eu esqueci dela completamente…

Conforme Blair descia o seu relatório completo, Rhistel e Hawky se surpreendiam mais com a riqueza de detalhes. Com uma ansiedade curiosa, Hawky abria um sorriso ansioso e se entreolhava com o irmão. Como alguém sabia tanto sobre uma pessoa? Goetia. A Dragonesa do Ar arqueou as sobrancelhas, divertindo-se.

– Ela não deve estar muito feliz, né… – Rhistel abriu um sorriso insosso. – Ahm, Blair… Nós… Não podemos ser mentalmente controlados ou… Ludibriados com ilusões. As nossas mentes são muito poderosas, embora não pareçam, às vezes… Nós temos um laço de conexão mental e ele parte do Polaris.

Em dúvida se era adequada a revelação para Blair, Hawky se entreolhou com Rhistel. Rhistel assentiu uma única fez, tranquilizando-a. Com a mesma expressão ansiosa, a Dragonesa concordou negando com a cabeça, chacoalhando os longos cabelos no processo.

– É por isso que a Goetia nos trancafiou quando pôde ao invés de tentar controlar as nossas mentes… – Rhistel explicava, olhando-a. – Você sabe se ela fez o Ritual ou… – O Dragão de Gelo franziu o cenho. – … Nasceu assim?

Blair só percebeu a surpresa deles quando terminou. Por um instante quis se justificar, mas imaginou que eles já tinham feitos suposições. Ela apertou os lábios um pouco constrangida e enrolou os dedos no laço de enfeite do vestido curto de verão que usava.

– Eu já tinha escutado que não podem ser controlados… – Olhou-os – Apenas não tinha certeza sobre um truque entrópico. Mas não deve os atingir mesmo. Bem… Ela é Verdadeira. Ela não se afeta magikamente se eu me manifestar, eu tentei. Eu não sei quem é o pai ou a mãe dela. Mas provavelmente foi um pai que nem sabe que ela existe… – Sorriu sem jeito – Eu parei por aí. A origem exata dela não me interessou na época.

– Ora… – Hawky entrelaçou os dedos das mãos, observando Blair com atenção. – Que grande ritual os Blackwoods devem ter feito para alcançar um poder assim, não é? Lobos-Magos… Tanto poder. Isso não é natural… – Ela comentou com uma franqueza. – Será que ela é a minha loba? – A Dragonesa pareceu se animar, mas franziu o cenho. – Ou de Nina…

– Ou de Tayrou… – Rhistel arriscou, pensando ainda nas palavras de Blair.

Ele se aproximou dela e quase se esqueceu que não podia beijá-la. A sua mão roçou aos dedos pálidos, sentindo o calor que havia neles o chamar. Os olhos escuros se ergueram até os lábios rosados, cobiçando-os. De repente, nem se lembrou que estavam prestes a se aproximar de um ser que iria exigir da sua atenção. Desejou o beijo… Desejou que o Ritual passasse logo e pudessem viajar como havia prometido.

– Elas estão ali. – Hawky apontou, cortando os pensamentos quentes do Dragão.

Blair entreabriu os lábios surpresa. Havia os enchido de alertas sobre os poderes e o magnetismo de Veronica, e ela nem havia aberto a boca direito e ele a abraçava.

– Rhis… – Blair murmurou preocupada, e depois não entendeu mais nada…

Veronica retribuiu o abraço com a apenas o braço livre, o outro, protegido pelo lenço vermelho, ficou imóvel. Quando se afastou, olhou-o admirada e com o mesmo sorriso deslumbrante.

– Que bom te ver aqui. Gostava muito, muito de você. Misturava água nas minhas bebidas antes de eu me perder completamente. – Riu com a memória. – Aliás, do nosso último encontro. Eu queria te pedir desculpas… Eu… – Mas cortou o assunto ao se lembrar da presença das duas meninas. – Olá. Blair! E…

– Hawky. – Blair disse pela Dragonesa, sorrindo brevemente. – Tudo bem com você?

– Na verdade, não… – Tirou o lenço vermelho e mostrou o braço em péssimo estado. – Eu não quis mostrar a Aisha. Mas eu sabia que aqui conseguiria ajuda… Está horrível. Recebi a Goetia em casa e uma moça fervorosa se matou para fazer isso… Ainda estou atormentada.
O braço estava preso em um bracelete de ouro, e o restante da sua pele estava em uma cor roxa de sangue pisado e coagulado. Se ela mesma não fosse uma criatura sobrenatural, teria amputado.

– Eu não posso retirar sozinha. A dor não me deixa me concentrar. A Mágika foi poderosa demais…

O ar polido de Blair soou como um aviso para Rhistel que até se privou de responder o pedido desculpas da popstar. O Dragão de Gelo parou de sorrir e até se endireitou, direcionando seu olhar atento ao membro ferido. As narinas do Dragão de Gelo dilataram quando ele inspirou, farejando o ar:

– Ahm… É um artefato poderoso. Talvez precise de mais de uma pessoa para quebrar, investindo algumas coisas.

Os olhos escuros de Hawky se voltaram para Blair, já que a Maga parecia mais prudente que o seu irmão.

Blair fitou Rhistel brevemente e descruzou os braços lentamente. Veronica os olhou e se sentou na cadeira que antes estava. Respirou fundo e deixou o ar escapar devagar entre os lábios cheios.

– Eu estava em casa… Cuidando das minhas coisas… E não percebi que havia três magos da Goetia me aguardando na sala de estar. Eu imagino que já tenham ouvido falar desse Seita insana, não? Eles assassinaram a todos da minha casa e tinham ordens de me levar. Eles não tiveram muita chance, mas acho que os subestimei um pouco… – Indicou o próprio braço – Uma maga se matou para fazer isso. Muito jovem. Eles são religiosamente cegos… Qualquer outro servo da Wyrm teria tentado salvar a própria vida. – Negou, lamentando – Eu tinha algo que era da Mensageira. A líder do culto. Aparentemente ela queria de volta. Mas acho que eles foram enganados também… Porque isso não funciona. – Veronica abriu a própria bolsa e mostrou um cristal roxo dentro de um lenço – É lixo. – Jogou o objeto no ar, que desapareceu no trajeto e ressurgiu na mão de Blair.

– O que isso deveria fazer? – Blair perguntou, ainda séria.

– Me esconder… – Veronica disse prontamente, mas desviou os olhos para o chão – E não foi bem o que aconteceu. Eu fiquei assustada, fugi da mansão, capotei o carro, consegui passar em alguma loja e me vestir decentemente. Só consegui pensar na Ilha… E Aisha que é muito minha amiga… Aqui parecia seguro para tentar me reorganizar… Eu não estou com má intenções… Eu deveria estar em outra Seita a essa altura. – Pressionou os lábios – Eu juro. E ainda estou bem assustada…

Não parecia um assunto que poderiam resolver sozinhos e tomar decisões. Rhistel ouviu a história e se voltou para Blair, franzindo o cenho de questionamento já que ela conhecia Veronica muito melhor do que ele. O coração só sentia que não era um assunto que deveria ser tratado sem a liderança estar envolvida. A resistência da sua querida Bee o fazia se sentir com as mãos um pouco… Atadas?

Blair continuou com seus olhos em Veronica. Não havia motivações para tanta desconfiança, mas não se sentia confortável com a presença de alguém que poderia simplesmente ter algo nas mangas. Nikki sentiu o desconforto dos dois, e pensou um instante antes de prosseguir:

– É um pouco estranho, porque achei que éramos… Próximas ou coisa assim. – Veronica riu sem jeito – Eu imagino que de alguma forma minha reputação esteja bem ruim… – Desviou os olhos para a janela. – Eu mesma queria saber o que está acontecendo. Vocês estão mesmo juntos?

Blair voltou da dispersão e entreabriu os lábios sem esperar a pergunta. Fitou Rhistel, mas não conseguiu concluir. Hawky trazia Drawn do Umbral e o mago olhou a todos antes de se voltar a Veronica.

– Olá, senhor Drawn.

– Nikki. Faz anos, mas… Que bom te rever. – Ele cumprimentou com um aceno – Soube que não está bem…

Ela mordeu o lábio e concordou:

– Não estou bem quanto gostaria. Me sinto envergonhada pela visita em tempo de necessidade.

– Tudo bem. Estamos todos na mesma situação. Deixa eu ver seu braço. Blair, me ajude…
A Maga assentiu relutante, mas se ergueu e atendeu às instruções de Drawn. Demorou alguns minutos até o bracelete ser movido, mas não destruído. Joshua enrolou o amuleto em um lenço e manteve consigo.

– Ah! – Nikki suspirou de alívio. Parecia ter segurado seu ar até ali, e só então respirava. – Obrigada… Gaia… – Fechou seus olhos com força.

– Devemos levá-la até a Bella e as meninas. – Joshua analisava o braço – Não é um ferimento qualquer… Bem… E então, você me conta sua história…

Blair apenas os olhava em silêncio. Veronica foi aprendiz de Neil… lembrou-se.

– Sr. Drawn. – Hawky disse, erguendo os olhos e buscando pelo olhar de oceano do Mago. – Perdoe-me a intromissão, mas eu sinto que isso não é por acaso… – A Dragonesa observou a Loba-Maga de soslaio por um instante. – Eu sinto que a presença da Veronica aqui não é uma coincidência. – A morena apertou os lábios. – A atmosfera está diferente… Aqui. Você sente, Ras?

O Dragão de Gelo assentiu vagarosamente, incerto se fazia bem em admitir.

– Talvez algo a ver com conosco, os nossos elos e os Solstício? Ela não está mentindo. – Hawky observou Veronica mais uma vez. – Eu acho que estamos sendo preparados para algo… – Ela molhou os lábios. – Eu suspeito que estejam todos aqui… Hoje. Todo o ciclo.

Rhistel inspirou, cruzando os braços.

– Eu sugiro que ela possa ver o Solstício… Se os Reis permitirem. – Ela finalizou,  apertando os lábios.

Drawn escutou Hawky e Rhistel com atenção e concordou, assentindo uma vez com a cabeça. – Eu também acho, Hawky… – Ele disse na sua voz calma e rouca – Veronica é importante… Por isso ela precisa nos contextualizar do que houve, e assim nós podemos acolhê-la melhor. Começando por tratar seu braço…

Nikki os olhava em um misto de surpresa, tentando lidar com a ausência de palavras para se expressar. 

– Ah… Obrigada… – Riu sem jeito – Eu agradeço muito se me deixarem ser parte. Eu não esperava tudo isso… Mas estou agradecida demais.

Blair estreitou os olhos, mas não se prolongou em observá-la.

– Acho que ainda faltaria um… – Disse a loira.

– Sim. – Hawky concordou, olhando-a. – Mas é estranho o suficiente que tantos estejam aqui…

Calado, Rhistel apenas os observou. Sentia que a boa notícia também era acompanhada de um mal presságio. Goetia nunca atacou diretamente ou tentou capturar nenhum Lobo-Mago assim, independente da situação. Rhistel se voltou para Blair e mordeu o lábio, pensando…

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